É do mister das universidades se ocuparem da universalidade do conhecimento, em todos os pontos cardeais. Portanto, nada do que é humano deve escapar da análise crítica desses centros do saber. Pelo menos é assim que deveria ser num mundo ideal. No caso das universidades brasileiras, o reconhecimento natural sobre a função de pensar a sociedade vem sendo atropelado por uma espécie de niilismo político que se imiscuiu entre nossos pensadores, turvando-lhes a visão e a mente.
Nos últimos anos, a ascendência exacerbada dos partidos políticos e seus credos sobre o funcionamento material e intelectual de nossa universidade vêm, aos poucos, subtraindo-lhes a primazia do saber, substituída por uma espécie de gosma inócua, que busca uniformizar uns e alijar outros, pespegando-lhes a tatuagem de golpistas ou coisa que o valha. Infelizmente a UnB, como as demais universidades públicas, não escapou desse vendaval, e vem sendo abduzida por esses cantos de sereia. O que, à primeira vista, parece tingido pelos matizes da pluralidade, esconde, no seu âmago, um ódio ao diferente.
O surrealismo da situação atual fez daquele professor que simplesmente quer ministrar suas aulas um corpo estranho nesse turbilhão. Cartas de funcionários da UnB recebidas por esta coluna - que, por motivos óbvios, pediram sigilo do missivista - ajudam a elucidar a situação vivida em nossas academias. Uma delas explica que o PT adotou a estratégia em outra década de controlar os sindicatos dos professores e daí, mediante eleição, controlar as reitorias. As greves eram 80% políticas. Foram bem-sucedidas. Hoje, controlam 90% ou mais das reitorias, diz nosso missivista. Aparelham as administrações e usam recursos e políticas para fortalecer seu partido. Trabalham para destruir possíveis adversários.
Com a mudança dos ventos, provocada pela Operação Lava-Jato e pelo processo de impeachment, houve sensível diminuição no apoio ao PT. O seu lugar foi imediatamente tomado por uma franja do mesmo naipe. O PSol tentou o mesmo caminho e hoje controla a Andes, vários sindicatos e algumas reitorias, com destaque para a UFRJ, a maior universidade federal. Dentro da universidade, quem se atreve a defender o impeachment vira uma espécie de barata kafkiana e tem de se esconder dos demais.
Nos países desenvolvidos, a liturgia é diferente. Conselhos de luminares (scholar) escolhem os dirigentes, com maioria de gente externa. Darcy Ribeiro vislumbrou o mesmo para a UnB. Pelo menos é o que está na Lei 3.998/61 e no Decreto 500, de fevereiro de 1962. Ele foi contra as eleições gerais. O governo FHC regulamentou o processo eleitoral, reservando 70% do peso aos votos dos docentes. A UnB vem ignorando a lei desde 2008, adotando a paridade de 1/3 do peso para docentes, técnicos e alunos. "Eleição geral para reitor é uma invenção da esquerda brasileira. Não acontece em nenhum país desenvolvido, nem em Cuba, nem na China. As esquerdas latino-americanas são únicas no mundo que vivem no passado, lutando contra a ditadura até hoje," descarrega o funcionário.
A rigor, no Brasil, não se tem uma direita, muito menos uma esquerda. O que existe, de fato, são aqueles grupos que estão acima (no poder) e o restante, situados abaixo. No meio desses grupos, fica uma grande maioria silenciosa, indiferente e descrente. Em outra carta, um dos professores descrentes desabafa: Tenho vários amigos que lecionam na UnB que desistiram de tudo e passaram a construir a vida ao largo da vida acadêmica. Agem como estrangeiros. Vão para as aulas, dão as aulas e voltam para casa. Se quiserem entrevistá-los, o último lugar em que vão encontrá-los é no Minhocão. Preferem andar quilômetros a encontrar com colegas.
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