domingo, julho 03, 2016

Metas para o pós-Dilma - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADÃO - 03/07

Toda aposta séria na retomada do crescimento econômico depende, hoje, de uma hipótese crucial: a transformação do governo provisório em definitivo. O impeachment da presidente Dilma Rousseff é parte do cenário básico, embora essa condição nem sempre seja explicitada pelos analistas do mercado ou mesmo por membros da nova equipe econômica. O quase tabu foi rompido pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, numa entrevista à Agência Estado e à Rádio Estadão. “Podemos dizer com certeza que haverá crescimento, a não ser que haja reversão política muito forte, mas aí será outro quadro”, afirmou. Foi uma declaração realista, mas o desafio, é preciso reconhecer, ainda será enorme. Removido o maior entrave político, restará muito trabalho para repor o Brasil entre as economias com potencial para se expandir e, além disso, para participar da reconstrução do sistema global.

O governo, lembrou o ministro, só cumprirá esse papel se as suas previsões forem levadas a sério. A rápida aprovação da proposta de um teto para o gasto público, exemplificou, facilitará a recuperação da credibilidade. Já há sinais de expectativas melhores, como lembrou o ministro Meirelles, mas falta consolidar a confiança na economia e, em primeiro lugar, na política oficial.

Nas avaliações mais otimistas, a atividade chegou ao fundo do poço ou está muito perto da estabilização. Por isso, a variação zero da produção industrial de abril para maio, divulgada na sexta-feira, foi recebida por analistas como um dado positivo, embora o indicador tenha caído pela 27.ª vez consecutiva na comparação com o dado de um ano antes.

Segundo um economista citado pela Agência Estado, os números deverão flutuar em torno da estabilidade nos próximos meses. A volta do crescimento, acrescentou, dependerá de estímulos ainda inexistentes. A aprovação da nova regra para o gasto público poderá abrir caminho para esses estímulos e até para a redução dos juros. Um pressuposto vital, esclareceu, é o afastamento definitivo da presidente.

A criação de um horizonte claro e crível para a atividade econômica é condição apontada, de modo geral, pelos analistas citados pela imprensa. As ideias de clareza e credibilidade constituem um bom argumento a favor da decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN), na quinta-feira passada, sobre a meta de inflação para 2018.

O Conselho, formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do Banco Central (BC), manteve a meta de 4,5% e confirmou a redução da margem de tolerância de 2 pontos porcentuais para 1,5 ponto. Alguns podem ter recebido essa decisão como um anticlímax, talvez como sinal de timidez, mas essa interpretação é precipitada.

Muito mais do que fixar um alvo mais ambicioso para 2018, o desafio importante para a autoridade monetária, neste momento, é entregar a inflação na meta, ou muito perto de 4,5%, no fim do próximo ano. Se a política estiver claramente voltada para esse objetivo, haverá, nos próximos meses, com certeza, um ganho de credibilidade. A partir daí haverá condições muito melhores para a escolha de metas abaixo de 4,5%, mais próximas daquelas em vigor em países com melhores fundamentos econômicos.

A consolidação da confiança dependerá tanto da firmeza do BC, prometida por seu novo presidente Ilan Goldfajn, quanto do esforço de recuperação das finanças públicas. Um dos primeiros passos deve ser a definição da meta fiscal para 2017. Se for muito frouxa, será desmoralizante. Se muito apertada, o governo poderá ser forçado a pedir uma revisão, com inevitável desgaste.

A travessia até a conclusão do processo de impeachment será politicamente complicada e cheia de riscos. O presidente em exercício terá de ser capaz de manter um bom entendimento com sua base e ao mesmo tempo resistir às pressões por bondades perigosas para as contas públicas. Mas poderá avançar em algumas linhas de ação, como a política de concessões de infraestrutura – um bom caminho para destravar o investimento físico e acionar o motor do crescimento.


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