O GLOBO - 08/07
Com chance de votação recorde, grupos de centro-direita negociam candidatura à presidência da Câmara, o terceiro posto na linha sucessória da República
Está em ascensão uma tendência política tradicionalista em questões morais e sociais, defensora da liberdade individual e do livre mercado. Pode emergir das urnas em outubro sob a bandeira da renovação da democracia cristã, hoje dispersa na geleia partidária brasileira.
Desde o início da disputa presidencial as pesquisas destacam uma organização gestada na harmonia ecumênica entre protestantes e católicos, o Partido Social Cristão. Ele conseguiu escavar e preservar uma trincheira no instável terreno da centro-direita.
O PSC surgiu no pós-ditadura, na coligação de forças que derrotou Lula e levou Fernando Collor de Mello à Presidência, em 1989. Disputou a eleição de 1994 quando outro Fernando, o Henrique Cardoso, surfou na estabilidade da moeda, o Real, epílogo de duas décadas de agonia inflacionária. Na época o candidato do PSC, um militar, obteve 0,38% dos votos.
Agora o partido apresenta um pastor evangélico, a bordo de um roteiro conservador, moldado no ideário da moral cristã e de princípios caros ao liberalismo na política e na economia.
Com um tom populista, e cautelosamente contido na fronteira da laicidade, o candidato do PSC Everaldo Pereira prega contra o aborto e o controle da natalidade com o mesmo fervor com que defende a “assistência psicológica” aos homossexuais. Flerta com o “Estado mínimo” e faz o elogio do livre mercado com vigor similar à proposta de relações diretas com as massas, espelhando-se na experiência do Cheque Cidadão — o controvertido programa assistencialista do qual foi um dos operadores no governo Garotinho, no Rio do fim dos anos 90.
Sua desenvoltura levou a centro-direita alinhada ao PSC a um desempenho inédito: 4% nas pesquisas dos últimos dois meses. Se confirmado nas urnas, multiplicaria por onze a preferência alcançada na disputa de 20 anos atrás. Equivale a seis milhões de votos no universo de 142 milhões de eleitores.
Esse volume ajudaria a conduzir a eleição ao segundo turno. O Datafolha atribui 38% a Dilma Rousseff. É igual à soma dos índices de oito dos seus adversários: 33% divididos entre Aécio Neves (PSDB), Eduardo Campos (PSB) e Everaldo Pereira (PSC) e mais 5% entre José Maria, do PSTU; Eduardo Jorge, do PV; Luciana Genro, do PSOL; e Mauro Iasi, do PCB.
A perspectiva aberta já fomenta apostas no mercado futuro do Congresso. Abriu-se uma negociação entre alas partidárias distintas, porém complementares como dois lados da mesma moeda. O objetivo é reeleger no Rio o deputado Eduardo Cunha, atual líder do PMDB na Câmara. Em seguida, levá-lo à disputa pela presidência da Câmara — terceiro posto na linha sucessória da República.
A despeito de indivíduos e interesses obscurantistas no jogo eleitoral, o que as pesquisas mostram é a receptividade de parte do eleitorado ao projeto liberal-conservador. Refletem a fermentação em torno de ideias afinadas com o liberalismo econômico e o conservadorismo clássico, mesmo com mofo residual da Guerra Fria.
É saudável para a democracia. E, talvez por isso, a centro-direita tenha virado atração nas livrarias. Editoras nacionais contabilizam recordes sucessivos na impressão de autores locais, com vendas de até cem mil exemplares por título.
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