GAZETA DO POVO - PR - 01/03
Senadores darão a si próprios, até o fim de 2014, uma folga equivalente a 72% dos dias em que deveriam trabalhar
O presidente do Senado Federal, Renan Calheiros, reuniu os líderes partidários e com eles acertou o calendário de atividades que a Casa cumprirá até o fim deste ano. Coisa bem feita e ajustada às excepcionais circunstâncias de 2014, ano de Copa do Mundo e de eleições gerais. Considerados esses fatores, os senadores estarão dispensados de comparecer a 72% dos dias que faltam para o ano acabar. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senador Vital do Rego, justificou a adoção do calendário com uma frase que muitos podem entender como uma piada: “Isso é para que a sociedade veja que o Congresso está trabalhando”. Renan se saiu com outra anedota para explicar o encurtamento das jornadas senatoriais: o ano está tomado por “eventos internacionais”, disse ele.
O calendário “calheiriano” é muito menor que o gregoriano. Em vez dos 365 dias distribuídos em 12 meses e 52 semanas, a que se submetem todos os trabalhadores do mundo ocidental, da folhinha do Senado não constam como dias de trabalho aqueles em que, por exemplo, há jogos da seleção brasileira e de outras equipes admiradas pelas torcidas; assim como foram suprimidos também os dois meses que antecedem as eleições de outubro – período que os parlamentares poderão aproveitar para se dedicar às próprias campanhas de reeleição ou de correligionários nas respectivas “bases”, como costumam se referir aos currais de onde colhem votos.
O calendário gregoriano, no entanto, será religiosamente cumprido em relação aos pagamentos dos salários e dos penduricalhos que adornam seus holerites. Assim como também não prevê reduções nas despesas de seus gabinetes, incluindo as representadas pelos servidores que têm à disposição seja em Brasília, seja alhures. Para efeito das atividades do Senado, também não se contam o recesso de julho, os dias completos da Semana Santa, os feriados e feriadões, o durante e o depois do carnaval, as segundas e as sextas-feiras – nesses mesmos dias e semanas a absoluta maioria dos contribuintes estará trabalhando e recolhendo os tributos que sustentam regiamente o parlamento.
Mas nem só de folgas viverão os senadores neste bulicioso 2014. Eles serão convocados a trabalhar durante duas estafantes semanas em agosto e setembro (uma em cada mês, logicamente), durante as quais certamente – com tempo tão suficiente – poderão deliberar sobre matérias importantes, capazes de traçar novos rumos para o desenvolvimento econômico e social do país.
Não há ironia que baste para tratar deste assunto – embora fosse ele mais motivo de tristeza e de santa indignação. Trata-se, o calendário “calheiriano”, de mais uma daquelas atitudes dos nossos políticos e governantes a se constituir em vergonha e revolta para os cidadãos de bem, trabalhadores, eleitores e contribuintes, que nelas encontram alimento para irem às ruas. Só os políticos parecem não compreender a realidade e as causas do próprio descrédito.
Um comentário:
O artigo do Dr. Miguel Reale- Estado de S. Paulo, 01/3/14- Anomia e mudança, cita entre outras coisas, a total falta de cumprimento das leis vigentes. Infelizmente o exemplo "vem de cima".
BRAZIL, PAÍS RICO...DE ANOMIA!!!
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