O GLOBO - 08/03
Na reunião de quinta-feira no Palácio do Planalto, o primeiro a falar foi o diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp. E fez um cenário otimista sobre as chuvas nos próximos três meses. A presidente Dilma mandou pôr o climatologista Carlos Nobre no viva voz. Os participantes entenderam que ele não era tão otimista, mas também que havia muitas incertezas.
“Então, não há nada conclusivo!”, disse a presidente, quando desligou o telefone.
O ministro Edison Lobão, o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, e o secretário executivo do MME, Márcio Zimmerman, continuaram a dar força à ideia de que as águas vão rolar e tudo vai se resolver naturalmente.
Os meteorologistas estão prevendo chuva neste fim de semana no Sudeste e os próximos dias podem ser mesmo aguados. Mas o governo tem empreendido neste caso uma marcha da insensatez. O racionamento pode ser evitado, mas já se formou um grande problema fiscal na energia. Agora o governo prepara duas canetadas para empurrar tudo para diante.
Uma canetada que se espera no setor é a de interferência na formação de preços no mercado spot. Em vez de ser o preço mais alto da energia até o limite de R$ 822 o MWh, passará a ser o preço médio da energia que entra no sistema. Com isso, melhora a situação das distribuidoras que estão descontratadas, ou seja, as que não conseguiram fechar contrato de compra com preço certo de toda a energia que têm que entregar e, por isso, estão expostas aos preços altos do mercado spot.
— Tudo bem, isso melhora a situação das distribuidoras, mas quem vai pagar o custo da energia mais cara? — pergunta um especialista do setor.
Outra forma de tapar o sol com a peneira será mais gasto público para cobrir o rombo criado pelo uso das usinas térmicas. Ontem à noite, a Fazenda já anunciou um aporte de R$ 1,2 bi na Conta de Desenvolvimento Energético, apenas para cobrir gastos de janeiro. Em fevereiro, segundo cálculos do setor, serão necessários mais R$ 2,5 bi, e a conta deve chegar ao final do ano em R$ 23 bilhões. No futuro, as distribuidoras repassarão isso aos consumidores.
O ONS divulgou que as previsões de chuva para março são de 77% da média histórica. No começo do mês, previa 67%, e, na primeira semana, choveu apenas 55%. Aí ele decidiu rever para cima. O número só será atingido se chover, na média, 81% no resto do mês.
O Fórum das Associações do Setor Elétrico, entidades que representam o setor, foi ao ministro Edison Lobão com uma carta em que, no tom mais suave possível, pediu para ser ouvida. Segundo o texto, “Nesse cenário de escassez de recursos hidráulicos e de recursos térmicos com capacidade instalada limitada, em nossa opinião, a situação merece cautela. Qualquer proposição deve ser tecnicamente embasada para que se possa encontrar, em conjunto com os agentes, soluções para fazer frente ao atual quadro de dificuldades e, adicionalmente, preservar o fluxo de pagamentos ao longo da cadeia entre produção e consumo, dando estabilidade ao setor.”
No último parágrafo, o setor reclama que a decisão de que eles participariam do Conselho de Monitoramento do Setor Elétrico foi revogada. O que todos os integrantes das diversas entidades, associações e empresas do setor dizem é que não há interlocutor. Eles não são ouvidos nem têm com quem conversar. Um deles contou que recentemente tentou explicar para uma autoridade o erro técnico que havia numa medida. E ouviu que ele fosse até a presidente Dilma para explicar o problema. “Se ela me chamar eu vou concordar com você; mas não vou lá dizer isso a ela.”Conclusão: os integrantes do governo na área elétrica têm medo da presidente. Preferem errar.
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