O ESTADO DE S. PAULO - 22/02
A presidente Dilma Rousseff acha que é "simples" enfrentar a seca no Nordeste.
Em discurso no Piauí, durante mais um dos eventos do calendário eleitoreiro do governo, Dilma declarou que o segredo é "conviver com a seca".
Façamos um esforço para acompanhar seu raciocínio. Segundo a presidente, "a seca não é uma maldição, a seca é uma ocorrência, é algo que ocorre", comparável aos "invernos rigorosos" dos países do Hemisfério Norte, que "duram seis, sete meses, todo ano, chova ou faça sol". Conceda-se que o tal inverno rigoroso que dura "sete meses" seja apenas um arroubo retórico para reforçar seu argumento. Mas Dilma continua, animada: "Eles têm um inverno forte, que acaba com toda a produção, a neve mata tudo o que cresce, e eles sobrevivem muito bem, obrigada, e fortes. Nós também podemos enfrentar a seca, sim".
Dilma descobriu agora que "a seca não deve ser combatida". Em lugar disso, é preciso haver "ações emergenciais" para ajudar os agricultores a contornar os efeitos da estiagem enquanto as condições climáticas não melhoram. E a institucionalização do assistencialismo - e nesse campo, como de hábito, chovem apenas promessas.
Em novembro de 2012, quando o Nordeste enfrentava a maior seca em meio século, Dilma lançou o programa Mais Irrigação e garantiu que o sertão seria transformado em "um dos maiores produtores de alimentos que nosso país e o mundo necessitam" e que "a vítima da seca deixará de ser flagelado para se tornar um produtor rural". Os investimentos anunciados para tão ousado objetivo somavam R$ 10 bilhões.
Seis meses depois, em abril de 2013, Dilma esteve no Ceará para prometer um novo pacote contra a estiagem, no valor de R$ 9 bilhões. Desse dinheiro, R$ 3,1 bilhões eram o quanto o governo estimava deixar de arrecadar em razão da renegociação de dívidas de agricultores que tiveram prejuízos com a seca. Outra parte dizia respeito à prorrogação de programas assistenciais, o Garantia Safra e o Bolsa Estiagem. Havia, portanto, pouco "dinheiro novo" no pacote, formado basicamente por verbas já empenhadas, seguindo a tradição dos governos petistas de reciclar programas antigos para apresentá-los como novidade.
Mas isso não é tudo. A caríssima e controversa transposição das águas do Rio São Francisco, prometida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o "compromisso não de um presidente, mas de um retirante nordestino", tomou-se um autêntico elefante branco. Além dos seguidos atrasos em seu cronograma, a obra, se e quando estiver concluída, vai produzir água a um preço proibitivo para os pequenos agricultores, o que obrigará o governo a recorrer a subsídios, adicionando sacrifícios aos contribuintes.
Agora, em 2014, depois de tantas promessas, Dilma diz que é preciso aceitar a seca como um fato da vida, a exemplo do que fazem os agricultores do Hemisfério Norte ante a dureza do inverno. A presidente tem razão, mas há importantes diferenças. Em vez de prometer bilhões em "ações emergenciais" e em projetos que mal saem do papel, os países do Hemisfério Norte estimularam o desenvolvimento de avançadas técnicas agrícolas mesmo em pequenas propriedades, o que permite aos produtores retomar seu trabalho em alto nível após o inverno, reduzindo os prejuízos. Em relatório sobre os efeitos das mudanças climáticas sobre a agricultura, a União Européia diz que há uma 'Vasta gama de opções" para lidar com o problema, todas baseadas em tecnologia para prevenção. Considerar o inverno inevitável não significa aceitar, como uma fatalidade, as perdas decorrentes dele.
Ao dizer que é "simples" lidar com a seca no Nordeste, Dilma esbanja a mesma arrogância de seu criador, Luiz Inácio Lula da Silva, que, ao deixar a Presidência, disse que era "fácil" governar o Brasil. Quando se governa do palanque, tudo parece mais simples mesmo. Mas já passou da hora de tratar o centenário flagelo da seca no Nordeste com mais responsabilidade. Não se pode mais admitir que o sertanejo continue a ser tratado como mera commo-dity eleitoral, sempre à espera do caminhão-pipa.
Em discurso no Piauí, durante mais um dos eventos do calendário eleitoreiro do governo, Dilma declarou que o segredo é "conviver com a seca".
Façamos um esforço para acompanhar seu raciocínio. Segundo a presidente, "a seca não é uma maldição, a seca é uma ocorrência, é algo que ocorre", comparável aos "invernos rigorosos" dos países do Hemisfério Norte, que "duram seis, sete meses, todo ano, chova ou faça sol". Conceda-se que o tal inverno rigoroso que dura "sete meses" seja apenas um arroubo retórico para reforçar seu argumento. Mas Dilma continua, animada: "Eles têm um inverno forte, que acaba com toda a produção, a neve mata tudo o que cresce, e eles sobrevivem muito bem, obrigada, e fortes. Nós também podemos enfrentar a seca, sim".
Dilma descobriu agora que "a seca não deve ser combatida". Em lugar disso, é preciso haver "ações emergenciais" para ajudar os agricultores a contornar os efeitos da estiagem enquanto as condições climáticas não melhoram. E a institucionalização do assistencialismo - e nesse campo, como de hábito, chovem apenas promessas.
Em novembro de 2012, quando o Nordeste enfrentava a maior seca em meio século, Dilma lançou o programa Mais Irrigação e garantiu que o sertão seria transformado em "um dos maiores produtores de alimentos que nosso país e o mundo necessitam" e que "a vítima da seca deixará de ser flagelado para se tornar um produtor rural". Os investimentos anunciados para tão ousado objetivo somavam R$ 10 bilhões.
Seis meses depois, em abril de 2013, Dilma esteve no Ceará para prometer um novo pacote contra a estiagem, no valor de R$ 9 bilhões. Desse dinheiro, R$ 3,1 bilhões eram o quanto o governo estimava deixar de arrecadar em razão da renegociação de dívidas de agricultores que tiveram prejuízos com a seca. Outra parte dizia respeito à prorrogação de programas assistenciais, o Garantia Safra e o Bolsa Estiagem. Havia, portanto, pouco "dinheiro novo" no pacote, formado basicamente por verbas já empenhadas, seguindo a tradição dos governos petistas de reciclar programas antigos para apresentá-los como novidade.
Mas isso não é tudo. A caríssima e controversa transposição das águas do Rio São Francisco, prometida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o "compromisso não de um presidente, mas de um retirante nordestino", tomou-se um autêntico elefante branco. Além dos seguidos atrasos em seu cronograma, a obra, se e quando estiver concluída, vai produzir água a um preço proibitivo para os pequenos agricultores, o que obrigará o governo a recorrer a subsídios, adicionando sacrifícios aos contribuintes.
Agora, em 2014, depois de tantas promessas, Dilma diz que é preciso aceitar a seca como um fato da vida, a exemplo do que fazem os agricultores do Hemisfério Norte ante a dureza do inverno. A presidente tem razão, mas há importantes diferenças. Em vez de prometer bilhões em "ações emergenciais" e em projetos que mal saem do papel, os países do Hemisfério Norte estimularam o desenvolvimento de avançadas técnicas agrícolas mesmo em pequenas propriedades, o que permite aos produtores retomar seu trabalho em alto nível após o inverno, reduzindo os prejuízos. Em relatório sobre os efeitos das mudanças climáticas sobre a agricultura, a União Européia diz que há uma 'Vasta gama de opções" para lidar com o problema, todas baseadas em tecnologia para prevenção. Considerar o inverno inevitável não significa aceitar, como uma fatalidade, as perdas decorrentes dele.
Ao dizer que é "simples" lidar com a seca no Nordeste, Dilma esbanja a mesma arrogância de seu criador, Luiz Inácio Lula da Silva, que, ao deixar a Presidência, disse que era "fácil" governar o Brasil. Quando se governa do palanque, tudo parece mais simples mesmo. Mas já passou da hora de tratar o centenário flagelo da seca no Nordeste com mais responsabilidade. Não se pode mais admitir que o sertanejo continue a ser tratado como mera commo-dity eleitoral, sempre à espera do caminhão-pipa.
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