O GLOBO - 24/12
O Papa já mostrou ter a missão de aproximar a Igreja das pessoas. E, feita a reforma da Cúria, ele deverá ter condições de atuar mais como pastor neste mundo conturbado
Alguns mais crédulos expressaram esperança em um mundo de paz, tão logo, no final da década de 1980, o Leste da Europa passou a se abrir a ventos democráticos, depois da implosão do socialismo real soviético. Mais uma frustração. O choque global entre os dois sistemas, comunista e capitalista, vencido por este, cedeu espaço, não para um ciclo histórico sem violência, mas para conflitos regionais graves - geopolíticos, étnicos, religiosos.
Chegou a ser interpretado como um choque de civilizações , entre Ocidente e Oriente. Tratava-se de um reducionismo. Era mais complexo. No caso do Oriente Médio, na usina irradiadora da insensatez sectária que se retroalimenta entre árabes e judeus, também entre persas (iranianos) e grupos árabes, há outra força-motriz: o conflito entre xiitas e sunitas, uma divisão secular entre muçulmanos capaz de plasmar guerras civis localizadas - no Iraque, na Síria, no Líbano etc. - e que parece compor, numa colcha de retalhos, um sério e extenso embate sangrento, ninho da serpente do terrorismo que atinge indiscriminadamente a todos, muçulmanos e não muçulmanos.
É dentro desta moldura que o líder da maior religião monoteísta do planeta passa seu primeiro Natal no Vaticano. O Papa Francisco, com menos de um ano de pontificado, já demonstrou ter como missão aproximar a Igreja das pessoas, fieis ou não, das praças - tem atraído públicos recordes à São Pedro. Sem discriminar homossexuais, divorciados etc.
Francisco também precisa combater na frente interna do Vaticano, da Cúria, a ser arejada para não tutelar o Papa. E o caminho para isso, esboçado por ele, parece ser o da atenuação de um certo modelo decisório monárquico, torná-lo algo mais compartilhado - preservados os devidos dogmas da Igreja. Um equilíbrio talvez instável, mas que precisa ser tentado.
Eu seu primeiro documento papal, Evangelii Gaudium , ou A alegria do Evangelho , divulgado no final de novembro, Bergoglio é coerente com a visão da Igreja dos pobres, da pessoa comum, numa projeção da vida daquele de que resgatou o nome, Francisco (de Assis), para substituir Bento XVI. O Papa tratou, ainda, do diálogo entre religiões e da evangelização.
Está posto o enorme desafio de estender o espírito do Natal para todo o ano. Já estabelecido que Francisco deseja voltar a Igreja também para a vida real - sem que isso signifique qualquer crítica a antecessores -, o ideal é que consiga avançar na reforma do Vaticano para que, apaziguada esta frente, possa, com sua autoridade moral, atuar neste mundo muito longe da estabilidade e da paz imaginadas na parte final do século passado.
A História, entendida como um ciclo de conflitos, não havia acabado com a vitória do modelo democrático de formação social, como foi entendido por alguns na queda do Muro de Berlim. Um Vaticano mais atuante neste contexto será uma novidade a ser comemorada.
Chegou a ser interpretado como um choque de civilizações , entre Ocidente e Oriente. Tratava-se de um reducionismo. Era mais complexo. No caso do Oriente Médio, na usina irradiadora da insensatez sectária que se retroalimenta entre árabes e judeus, também entre persas (iranianos) e grupos árabes, há outra força-motriz: o conflito entre xiitas e sunitas, uma divisão secular entre muçulmanos capaz de plasmar guerras civis localizadas - no Iraque, na Síria, no Líbano etc. - e que parece compor, numa colcha de retalhos, um sério e extenso embate sangrento, ninho da serpente do terrorismo que atinge indiscriminadamente a todos, muçulmanos e não muçulmanos.
É dentro desta moldura que o líder da maior religião monoteísta do planeta passa seu primeiro Natal no Vaticano. O Papa Francisco, com menos de um ano de pontificado, já demonstrou ter como missão aproximar a Igreja das pessoas, fieis ou não, das praças - tem atraído públicos recordes à São Pedro. Sem discriminar homossexuais, divorciados etc.
Francisco também precisa combater na frente interna do Vaticano, da Cúria, a ser arejada para não tutelar o Papa. E o caminho para isso, esboçado por ele, parece ser o da atenuação de um certo modelo decisório monárquico, torná-lo algo mais compartilhado - preservados os devidos dogmas da Igreja. Um equilíbrio talvez instável, mas que precisa ser tentado.
Eu seu primeiro documento papal, Evangelii Gaudium , ou A alegria do Evangelho , divulgado no final de novembro, Bergoglio é coerente com a visão da Igreja dos pobres, da pessoa comum, numa projeção da vida daquele de que resgatou o nome, Francisco (de Assis), para substituir Bento XVI. O Papa tratou, ainda, do diálogo entre religiões e da evangelização.
Está posto o enorme desafio de estender o espírito do Natal para todo o ano. Já estabelecido que Francisco deseja voltar a Igreja também para a vida real - sem que isso signifique qualquer crítica a antecessores -, o ideal é que consiga avançar na reforma do Vaticano para que, apaziguada esta frente, possa, com sua autoridade moral, atuar neste mundo muito longe da estabilidade e da paz imaginadas na parte final do século passado.
A História, entendida como um ciclo de conflitos, não havia acabado com a vitória do modelo democrático de formação social, como foi entendido por alguns na queda do Muro de Berlim. Um Vaticano mais atuante neste contexto será uma novidade a ser comemorada.
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