GAZETA DO POVO - PR - 21/12
Na polêmica sobre a obrigatoriedade de airbags e freios ABS nos carros, entre a bolsa ou a vida, Guido Mantega parecia preferir a primeira opção até ser desautorizado
A estatística mais recente do Ministério da Saúde informa que mais de 43 mil brasileiros morreram vítimas de acidentes de trânsito em 2011. A mesma fonte revela que, em 2012, 180 mil sofreram traumatismos graves nas ruas e estradas do país. Esses números colocam o Brasil em 4.º lugar no ranking mundial de violência no trânsito: para cada milhão de veículos em circulação, registram-se 640 mortes por ano, ao passo que no Japão, por exemplo, o índice é de 60 óbitos.
Esses dados mostram que o Brasil vive uma situação de violência no trânsito cujas consequências só são comparáveis às causadas por guerras ou por grandes terremotos e tsunamis que afetam outras regiões do mundo. Culpa de quem? Para as autoridades, é sempre mais cômodo afirmar que é dos condutores de veículos, que dirigem sob efeito de álcool, abusam da velocidade e desrespeitam as mais triviais normas do Código de Trânsito Brasileiro.
Claro, os motoristas têm sua parcela de culpa, e que não é pequena; mas o quadro poderia ser menos trágico se, além da boa educação dos motoristas, as estradas e ruas fossem melhores, a fiscalização fosse mais eficiente e se os veículos fabricados no Brasil fossem dotados de equipamentos de segurança mais eficazes para proteger a integridade física de condutores e passageiros em caso de acidente. Tais equipamentos, diga-se de passagem, há muitos anos são exigidos das montadoras – as mesmas, aliás, que operam no Brasil – nos países desenvolvidos.
Os últimos dias foram tomados por uma polêmica nacional surreal a respeito do tema: o ministro da Fazenda, Guido Mantega, sinalizou a possibilidade de as fábricas brasileiras de automóveis serem desobrigadas de cumprir já em 2014 uma obrigação, prevista desde 2009, de equipá-los com freios ABS e airbags. Segundo ele, os veículos custariam mais caro, o que influiria negativamente no cálculo da inflação, além de provocar desemprego nas linhas de montagem de carros mais antiquados. Quanto às vidas perdidas... bem, isto é apenas um detalhe.
O ministro foi logo desautorizado pelos seus superiores e a exigência terá mesmo de ser cumprida no ano que vem. Mas, ainda assim, não custa lembrar que Mantega, embora talvez tivesse um pouco de razão quanto à eventual pressão inflacionária que a modernização dos automóveis provocaria (calcula-se que sairiam R$ 1,5 mil mais caros que os modelos atuais), ele pegou o caminho errado ao colocar a discussão nesses termos.
De fato, entre a bolsa ou a vida, ele parece preferir a primeira opção, mas melhor teria se havido se, em vez de se preocupar com os efeitos inflacionários de airbags e freios, viesse demonstrando mais eficiência para controlar outros fatores mais poderosos que têm mantido a inflação brasileira beirando o teto da meta, de 6,5% ao ano. Reduzir os gastos excessivos e improdutivos da máquina pública seria, só para citar um exemplo, mais eficaz para reconduzir a inflação ao centro da meta (de 4,5%) que adiar a adoção de itens de segurança dos veículos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário