O Estado de S.Paulo - 07/11
A moeda comum europeia é insuportável. Faz o que dá na cabeça. Adora paradoxos. Ao mesmo tempo em que a economia da zona do euro encontra dificuldades para deslanchar, o euro continua a mostrar sua força.
No mesmo dia em que a Comissão Europeia em Bruxelas revisa para baixo as perspectivas de crescimento para 2014, de 1,4% para 1,1%, o euro bate recordes de alta. Em 29 de outubro, a moeda atingiu o pico de US$ 1,38, o que jamais se registrou desde o verão de 2012.
Mas todos os especialistas concordam num ponto: se o euro ultrapassar o valor de US$ 1,40, então a balbuciante retomada da zona do euro que se delineia há alguns meses terá todas as possibilidade de ser interrompida.
Pior ainda: um euro forte prejudicará as regiões deficientes, ou seja, os países do sul do continente europeu. A consequência automática de um euro forte será o aumento do preço das exportações. Esse efeito perverso afetará sobretudo as nações do sul. Um país como a Alemanha, ao contrário, sofrerá menos.
Como explicar isso? A Alemanha fabrica e vende para o estrangeiro produtos topo de linha e seus clientes não prestam muita atenção aos preços, pois nenhum outro país poderá lhes fornecer mercadoria similar.
Inversamente, as nações do sul exportam para o estrangeiro produtos que podem ser encontrados, a preços melhores, em outros países. É o caso do azeite português ou das máquinas-ferramenta italianas.
Um especialista da Natixis expôs essas diferenças em cifras. Ele estabeleceu como hipótese um aumento de 10% no preço das exportações na zona do euro, diante do valor elevado da moeda única. Nesse caso, o volume das exportações cairia 10% na Itália, 9% em Portugal e 11% na Espanha. Na Alemanha, pelo contrário, a perda em volume não ultrapassaria os 3%.
Um outro problema ronda a zona do euro. A inflação está muito baixa. Em setembro, a inflação média era de 1,1%. Um mês depois caiu para 0,7%.
Portanto, o temor é que a zona do euro sucumba a uma deflação, com duas consequências graves: de um lado a deflação anestesia a atividade econômica. E, de outro, aumenta o custo de financiamento do Estado.
Podemos lembrar que uma das missões confiadas ao Banco Central Europeu era não permitir que a inflação baixasse para menos de 2%.
Eis portanto os dois dragões que Mario Draghi e seus conselheiros deverão enfrentar em Frankfurt: a alta do euro e os sinais de deflação.
E vale acrescentar que a tarefa de Draghi é ainda mais delicada porque os diferentes países da zona do euro não sofrem todos das mesmas doenças e assim não podem se servir dos mesmos remédios. Mais uma vez, a Alemanha será vista com severidade por seus parceiros.
Qual é a falha da Alemanha? De ser um país muito melhor administrado.
A Alemanha é um ótimo aluno. Basta olhar para a chanceler Angela Merkel para compreender tudo isso. É a imagem eterna, impassível e, ao mesmo tempo, exasperante do "primeiro da classe".
Além disso, mesmo na aridez das cifras, dos algoritmos e dos teoremas econômicos, um país tem um "inconsciente" e estes "inconscientes" divergem. A Alemanha, por exemplo, ainda é traumatizada pela lembrança da inflação delirante que a consumiu e a destruiu após a guerra de 1914-1918. Para um alemão, o perigo maior, o perigo diabólico, é a inflação. Como explicar a ele que o inverso da inflação, que é a deflação, é também um perigo viperino?/TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
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