O GLOBO - 07/11
Pode-se gostar ou não dos mercados, mas, a partir de expectativas, eles afetam o lado real da economia. E as expectativas sobre o Brasil não são as melhores
O governo Dilma se moveu na direção certa para melhorar os termos de licitações e atrair o capital privado, ao ter consciência de que, sem ele, os problemas na infraestrutura só se agravarão. Mas ainda falta demonstrar competência gerencial nesta aproximação e abertura, digamos, “ideológica”, nas negociações.
Agora, o foco das tensões se concentra na área fiscal, flanco desguarnecido do governo pela quantidade de erros cometidos — do desgaste causado pelo uso da “contabilidade criativa”, na tentativa ingênua e inócua de mascarar déficits, a decisões que reforçam a percepção de que não existe mesmo a intenção de se praticar uma política de gastos austera. Seja porque o marketing político-eleitoral já é considerado mais importante do que tudo ou devido a alguma visão macroeconômica míope que se recusa a entender a imperiosa necessidade de se conter despesas em custeio, combustível de pressões inflacionárias. Ou a ambos motivos.
Ao menos, sinais emitidos pelos mercados — goste-se ou não, a partir de expectativas eles afetam o lado real das economias — levam autoridades a se mexer. Por enquanto, na tentativa de debelar o mau humor com o Brasil na base do discurso. Em entrevista ao “Estado de S.Paulo”, por exemplo, o secretário do Tesouro, Arno Augustin, além de garantir que tudo está sob controle na sua área, disse haver um “ataque especulativo à política fiscal”.
Se existe, a culpa é do próprio governo. Preocupa é a tendência de deterioração do quadro fiscal. Mesmo quando os números melhorarem no final do ano — depois do déficit primário recorde de setembro, de R$ 9,048 bilhões —, a recuperação se deverá basicamente a receitas eventuais, como os R$ 15 bilhões do bônus de assinatura do contrato de exploração do campo de Libra. Dinheiro que entra no caixa uma única vez. Não é um fluxo.
A desconfiança é reforçada quando, mesmo depois de a nota de crédito do país ter sido colocada em viés de baixa pela Standard & Poor's, agência de avaliação de risco, o Planalto trabalha para contrariar princípio básico da Lei de Responsabilidade Fiscal e faz aprovar na Câmara a retroatividade de novos índices de correção das dívidas estaduais e municipais — na prática, uma renegociação, proibida pela própria LRF.
Somado à convivência perigosa com uma inflação próxima dos 6% e ao baixo crescimento da economia, o descuidado com a política fiscal corrói ainda mais as percepções sobre o Brasil.
Faz parte deste quadro a alta em quase 2% do dólar, na terça-feira, para R$ 2,289, a mais elevada cotação em dois meses. A continuar assim, será inevitável o rebaixamento da avaliação da economia brasileira por agências de risco, com todas as consequências conhecidas em termos de menor atração de divisas, impacto no câmbio e, por tabela, numa inflação já robusta. Só discurso não adianta.
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