Nos primeiros seis anos de governo, Lula manteve boa parte da política macroeconômica herdada de FHC. Em relação à política fiscal, persistiu na geração de superávits primários elevados, compatíveis com a redução da relação dívida/PIB. Em 2005, o ex-ministro Antônio Palocci chegou a apresentar uma proposta que objetivava a obtenção do déficit nominal zero alguns anos à frente. Naquela data, a proposta foi bombardeada pela então Ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que a rotulou de "rudimentar" e completou com a famosa frase: "gasto corrente é vida".
Alguns anos mais tarde, mais precisamente em outubro de 2008, quando explodiu a crise financeira internacional com a quebra do Lehman Brothers, o déficit nominal acumulado nos últimos 12 meses havia atingido 1,4%, o menor patamar da série histórica. Estávamos de fato a um passo de zerar o déficit nominal. O que isso teria significado? De acordo com nossos cálculos, caso o superávit primário tivesse sido mantido em 3,5% do PIB, estaríamos zerando o déficit nominal até 2020 (excluindo os efeitos cambiais). Se, além disso, não tivéssemos emitido títulos para capitalizar o BNDES e outros bancos públicos, poderíamos estar mirando uma dívida bruta (no conceito brasileiro e não do FMI) de 35% do PIB em 2020, ao passo que estamos caminhando para 65% do PIB, supondo, de maneira otimista, que as capitalizações dos bancos públicos sejam decrescentes, tendendo a zero até 2020. Fica então evidente a diferença da trajetória de endividamento que a política fiscal é capaz de gerar em um período de apenas 12 anos (2008-2020).
Os críticos da ortodoxia fiscal dirão certamente que essa política fiscal alternativa iria gerar uma recessão sem precedentes, sacrificando o bem-estar do trabalhador brasileiro. Será mesmo? O exercício contrafactual é sempre difícil, porém, é lícito supor que uma trajetória de endividamento cadente como a delineada acima iria reduzir consideravelmente o prêmio de risco da dívida pública do país. Com isso, o Tesouro teria mais facilidade para colocar os títulos e a taxa de juro poderia ser substancialmente menor. Com juros mais baixos, o setor público permitiria o "crowding in" do setor privado, ou seja, maior crescimento do setor privado compensando a redução dos gastos públicos. Com o passar do tempo, dado o menor pagamento de juros sobre a dívida pública, seria possível até cortar a carga tributária, mantendo-se o mesmo resultado nominal.
Mas e a inflação? Não teríamos que combater a inflação aumentando a Selic como estamos fazendo agora? Não necessariamente. Grande parte do problema da inflação no Brasil vem do fato de que a curva de oferta é excessivamente inelástica. Há escassez de fatores de produção importantes como mão de obra especializada, infraestrutura adequada, insumos a preços competitivos, tecnologia importada a custo baixo, energia barata, para citar alguns. Uma taxa de juros substancialmente mais baixa resolve parte desses problemas porque permite equacionar estruturas de financiamento de longo prazo para se investir em infraestrutura. Isso, conjugado com abertura comercial e atração de capitais estrangeiros, ampliaria os investimentos e melhoraria a oferta de insumos e tecnologia importados, facilitando a integração do Brasil às cadeias de produção internacionais. Por fim, boas políticas microeconômicas de caráter horizontal e a melhoria do ambiente regulatório poderiam completar a tarefa de tornar a curva de oferta agregada mais elástica.
Os críticos, no entanto, ainda podem argumentar que a atração de capitais externos tornaria o câmbio muito valorizado, o que, conjugado com a abertura comercial, seria um golpe de morte na indústria nacional. Esse argumento, contudo, não procede. A tendência a um câmbio mais apreciado ocorreu entre 2008 e 2011, porque a taxa de juros era muito mais alta do que a taxa internacional e o risco de solvência fiscal ainda era muito baixo, o que gerou uma atração de capitais especulativos. Com uma política fiscal mais ortodoxa, as taxas de juros seriam cada vez menores, atraindo menos capital especulativo, ao passo que a integração da cadeia produtiva ao mercado externo e a abertura ao capital estrangeiro atrairiam capital produtivo. O efeito líquido na conta de capitais é incerto, mas a qualidade do passivo externo melhoraria e este seria mais bem aproveitado pelo país, que o usaria para aumentar a capacidade produtiva.
O resultado final de uma política fiscal mais austera seria então um país com dívida pública cadente, taxas de juros menores, maior crescimento econômico e menos inflação. Não é preciso ser muito imaginativo para vislumbrar esse cenário. O Chile, aqui perto, é um exemplo de país que fez esse caminho. No entanto, o que temos hoje? Dívida bruta crescendo, taxas de juros em elevação, estagnação dos investimentos, inflação ascendente e, para coroar, perspectiva de rebaixamento da classificação de risco soberano. Esse é o resultado da brilhante decisão que tomamos lá atrás, quando se concluiu que "gasto corrente é vida".
Alguns anos mais tarde, mais precisamente em outubro de 2008, quando explodiu a crise financeira internacional com a quebra do Lehman Brothers, o déficit nominal acumulado nos últimos 12 meses havia atingido 1,4%, o menor patamar da série histórica. Estávamos de fato a um passo de zerar o déficit nominal. O que isso teria significado? De acordo com nossos cálculos, caso o superávit primário tivesse sido mantido em 3,5% do PIB, estaríamos zerando o déficit nominal até 2020 (excluindo os efeitos cambiais). Se, além disso, não tivéssemos emitido títulos para capitalizar o BNDES e outros bancos públicos, poderíamos estar mirando uma dívida bruta (no conceito brasileiro e não do FMI) de 35% do PIB em 2020, ao passo que estamos caminhando para 65% do PIB, supondo, de maneira otimista, que as capitalizações dos bancos públicos sejam decrescentes, tendendo a zero até 2020. Fica então evidente a diferença da trajetória de endividamento que a política fiscal é capaz de gerar em um período de apenas 12 anos (2008-2020).
Os críticos da ortodoxia fiscal dirão certamente que essa política fiscal alternativa iria gerar uma recessão sem precedentes, sacrificando o bem-estar do trabalhador brasileiro. Será mesmo? O exercício contrafactual é sempre difícil, porém, é lícito supor que uma trajetória de endividamento cadente como a delineada acima iria reduzir consideravelmente o prêmio de risco da dívida pública do país. Com isso, o Tesouro teria mais facilidade para colocar os títulos e a taxa de juro poderia ser substancialmente menor. Com juros mais baixos, o setor público permitiria o "crowding in" do setor privado, ou seja, maior crescimento do setor privado compensando a redução dos gastos públicos. Com o passar do tempo, dado o menor pagamento de juros sobre a dívida pública, seria possível até cortar a carga tributária, mantendo-se o mesmo resultado nominal.
Mas e a inflação? Não teríamos que combater a inflação aumentando a Selic como estamos fazendo agora? Não necessariamente. Grande parte do problema da inflação no Brasil vem do fato de que a curva de oferta é excessivamente inelástica. Há escassez de fatores de produção importantes como mão de obra especializada, infraestrutura adequada, insumos a preços competitivos, tecnologia importada a custo baixo, energia barata, para citar alguns. Uma taxa de juros substancialmente mais baixa resolve parte desses problemas porque permite equacionar estruturas de financiamento de longo prazo para se investir em infraestrutura. Isso, conjugado com abertura comercial e atração de capitais estrangeiros, ampliaria os investimentos e melhoraria a oferta de insumos e tecnologia importados, facilitando a integração do Brasil às cadeias de produção internacionais. Por fim, boas políticas microeconômicas de caráter horizontal e a melhoria do ambiente regulatório poderiam completar a tarefa de tornar a curva de oferta agregada mais elástica.
Os críticos, no entanto, ainda podem argumentar que a atração de capitais externos tornaria o câmbio muito valorizado, o que, conjugado com a abertura comercial, seria um golpe de morte na indústria nacional. Esse argumento, contudo, não procede. A tendência a um câmbio mais apreciado ocorreu entre 2008 e 2011, porque a taxa de juros era muito mais alta do que a taxa internacional e o risco de solvência fiscal ainda era muito baixo, o que gerou uma atração de capitais especulativos. Com uma política fiscal mais ortodoxa, as taxas de juros seriam cada vez menores, atraindo menos capital especulativo, ao passo que a integração da cadeia produtiva ao mercado externo e a abertura ao capital estrangeiro atrairiam capital produtivo. O efeito líquido na conta de capitais é incerto, mas a qualidade do passivo externo melhoraria e este seria mais bem aproveitado pelo país, que o usaria para aumentar a capacidade produtiva.
O resultado final de uma política fiscal mais austera seria então um país com dívida pública cadente, taxas de juros menores, maior crescimento econômico e menos inflação. Não é preciso ser muito imaginativo para vislumbrar esse cenário. O Chile, aqui perto, é um exemplo de país que fez esse caminho. No entanto, o que temos hoje? Dívida bruta crescendo, taxas de juros em elevação, estagnação dos investimentos, inflação ascendente e, para coroar, perspectiva de rebaixamento da classificação de risco soberano. Esse é o resultado da brilhante decisão que tomamos lá atrás, quando se concluiu que "gasto corrente é vida".
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