segunda-feira, novembro 18, 2013

Ataque suicida - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 18/11

O Brasil vai na contramão da maioria dos países ao permitir a aposentadoria precoce



São raros os sistemas previdenciários oficiais no mundo, baseados no regime de repartição (pelo qual as receitas são repartidas entre aposentados e pensionistas, sem que haja capitalização individual das contribuições dos segurados) que não estabelecem uma idade mínima para a aposentadoria. O Brasil está entre essas exceções, embora não seja um país rico e em condições de custear aposentadorias precoces. Os gastos totais da previdência no país correspondem a 13% do Produto Interno Bruto, percentual equivalente ao de nações europeias que têm hoje o dobro de proporção de idosos. O Brasil também deverá atingir essa proporção dentro de duas a três décadas, o que significa que as regras previdenciárias deveriam já estar ajustadas prevendo-se essa realidade.

Mas, ao contrário, centrais sindicais se mobilizam, com apoio dentro do Congresso, para eliminar mecanismos que tentam inibir ou atenuar os efeitos negativos da aposentadoria precoce sobre as contas da previdência. É um movimento que causa perplexidade, pois empurra o sistema para uma situação de total inviabilidade financeira, o que acabará exigindo aumento das contribuições ou corte de outras despesas governamentais essenciais num futuro não tão distante.

Como o regime geral de previdência (INSS) atualmente permite que homens se aposentem com 35 anos de contribuições, e mulheres com 30 anos, sem limite mínimo de idade, o cálculo dos valores mensais é feito considerando-se a expectativa média de vida da população brasileira. O valor mensal é então calculado considerando-se o número provável de anos que o segurado que se aposenta irá receber tal benefício. Assim, o valor aumenta para os que se aposentam mais tarde, e diminui para os que antecipam a aposentadoria. Na soma, os valores se equivalem.

Na fórmula de cálculo, chama-se “fator previdenciário” o componente que compensa o número provável de anos de recebimento do benefício, de acordo com a estimativa da expectativa média de vida dos brasileiros, feita pelo IBGE. Trata-se de uma questão de justiça social, pois é a única maneira de evitar que as aposentadorias precoces onerem ainda mais o sistema previdenciário. É sempre bom relembrar a filosofia que norteia a previdência em um regime de repartição: ninguém contribui para si mesmo; quem trabalha se solidariza com aqueles que perdem a capacidade laboral, por motivo de idade ou saúde. A contribuição individual do segurado é apenas um parâmetro para o cálculo do benefício, mas não uma garantia de retorno dos recursos, pois não se compara a uma aplicação financeira, como acontece, por exemplo, nos sistemas previdenciários que adotam o regime de capitalização.

Revogar o fator previdenciário sem que haja uma regra bem definida de limite de idade para a aposentadoria (ajustável de acordo com a tendência demográfica do país) é um atentado suicida contra a própria previdência e as finanças públicas, pois os mais atingidos serão os que mais precisam desse sistema.

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