VALOR ECONÔMICO - 22/11
Se você lê a imprensa brasileira, parece que o Brasil é o país com o pior desempenho fiscal do mundo. Mas se você olha os dados comparados do G-20, nós estamos entre os países com o melhor desempenho fiscal, mesmo com algumas dificuldades dadas pela crise.
O comentário do ministro da Fazenda, Guido Mantega, foi feito a esta coluna, após o anúncio de que o governo desistiu do projeto de lei complementar que autoriza a troca retroativa do indexador das dívidas dos Estados e municípios com a União.
É curioso, porque os jornais nos cobram rigor nos gastos públicos, mas cobram também quando corto gastos. Aí dizem que está faltando dinheiro para isso e aquilo. Converse com os outros ministros para ver se eles não vão reclamar. Vocês [os jornais] precisam chegar a um acordo.
O ministro conclui o desabafo. Ele está de bom humor e mostra a tabela com as projeções para 2013 dos resultados nominal e primário do setor público dos países do Grupo dos 20. Os indicadores apontam que o Brasil - com superávit primário estimado de 1,9% do PIB e déficit nominal de 3% do PIB este ano - só não está melhor do que a Arábia Saudita e a Itália.
Mantega cedeu, mas não concorda com a crítica de economistas do setor privado, que motivou o recuo do Executivo na troca do indexador das dívidas dos governos subnacionais. O projeto perdeu prioridade, porque ele suscita dúvidas sobre se aumenta ou não a capacidade de endividamento dos Estados e municípios. Não aumentaria não, porque sem o Programa de Ajuste Fiscal (PAF) eles não teriam autorização para contratar novos endividamentos. Temos isso muito bem controlado aqui. Mas é difícil explicar
Não é mesmo tarefa simples recuperar a confiança dos agentes privados, mas é isso que o governo busca desde que os dados de setembro mostraram forte deterioração fiscal. As críticas, que vêm de longe, tornaram-se mais ácidas. O governo Dilma Rousseff não é insensível a críticas. Ele reage, corrige rumos, realinha discursos, administra uma coisa aqui, outra ali. E, não raro, volta a dar sinais trocados. A aprovação, ontem, do projeto de lei que libera a União de compensar frustrações nas metas fiscais dos Estados e municípios desagradou investidores, sobretudo estrangeiros. Os nacionais já esperavam a aprovação da medida anunciada em abril.
O plano de voo de Mantega não preconiza grandes mudanças na área fiscal para 2014. Nada de formalizar bandas de flutuação da meta de superávit primário ou coisas do gênero. Vai esperar o Congresso aprovar a lei orçamentária para definir o resultado a perseguir, mas está confiante que a recuperação do crescimento se traduzirá em aumento das receitas. Esse, para ele, será um elemento crucial para corrigir o que ocorreu este ano, quando a arrecadação ficou abaixo do esperado. As desonerações estavam feitas e o governo permitiu que as despesas crescessem acima da alta do PIB. No Orçamento, a projeção de crescimento para 2014 é de 4%.
As eleições não o preocupam, mesmo sabendo que em anos eleitorais os gastos públicos aumentam. Olho mais para o cenário internacional do que para as eleições , diz. Mantega conta com um crescimento modesto nas economias avançadas, mas o suficiente para melhorar a lucratividade das empresas e a coleta de impostos.
No mercado, a repercussão do recuo do Executivo na questão da troca do indexador foi positiva, mas a não compensação de resultados dos Estados e municípios foi mal recebida. Prevalece o mau humor.
A área econômica está centrada em mostrar que, no encerramento do ano, os dados da economia serão melhores do que o mercado previu. Do lado das contas públicas, se esforça para engordar superávits entre outubro e dezembro. O Tesouro Nacional gerencia as despesas conforme a melhora das receitas e o ingresso, este mês, de R$ 15 bilhões do pagamento do campo de Libra, e do Refis em dezembro. Para honrar o compromisso de entregar uma inflação este ano menor do que a de 2012 (5,84%), poderá autorizar o aumento da gasolina só em meados de dezembro.
Ao mesmo tempo, surgem indícios, para alguns poucos economistas da área financeira, de que o pior já aconteceu. Batemos no fundo do poço e, agora, a tendência é de melhorar , disse um economista de uma grande instituição. O recuo na troca do indexador foi um sinal de que a teimosia tem limite , comentou.
Mesmo o adiamento da reunião do Conselho de Administração da Petrobras de ontem para o dia 28, para decidir sobre a política de preços da maior empresa do país, não foi o fim do mundo. Mais importante do que a data da reunião, ou do que a discordância entre Mantega e a direção da estatal sobre a metodologia que será adotada para dar automaticidade aos reajustes, é a certeza de que haverá nova política de preços. Fica para trás o experimento de se congelar preços em nome da inflação.
Outro fator que pode melhorar as expectativas é a própria inflação. Também do mercado surgem estimativas de que o IPCA pode cair para a casa dos 5,5% no primeiro trimestre de 2014 e que os alimentos - até então os algozes da carestia -terão, finalmente, inflação de um dígito. A declaração de Dilma de que há dez anos a inflação no Brasil está abaixo da meta de 6,5% (a meta é 4,5%) caiu na conta do ato falho.
O que não está boa é a perspectiva de crescimento. O plano de investimentos em infraestrutura, lançado pelo governo, não decolou. Os investimentos, portanto, não vão ser o motor da expansão da atividade em 2014 e o consumo continuará crescendo pouco. Apesar do relatório Focus do Banco Central prever crescimento de 2,1% em 2014, já se estima, no mercado, que a variação do PIB no último ano do governo Dilma pode ficar aquém de 2%.
Nenhum comentário:
Postar um comentário