O GLOBO - 21/09
Se dois aviões da mesma companhia abastecerem com o mesmo volume de combustível, um ao lado do outro, e um for para Maceió, e o outro, para Buenos Aires, o que viajar pelo Brasil pagará 35% mais caro. É que recairá PIS/Cofins e ICMS sobre o combustível para o que voar internamente. Isso é o que conta Paulo Sérgio Kakinoff, presidente da Gol, sobre uma das esquisitices do setor.
Há várias outras esquisitices que os presidentes das empresas aéreas não conseguem explicar, como o fato de terem pulado de 30 milhões para 100 milhões de passageiros transportados por ano, num período de 10 anos, e mesmo assim estarem em crise.
Esta semana conversei com Kakinoff, da Gol, e José Efromovich, presidente da Avianca, sobre os problemas reclamados pelas companhias aéreas. A interrupção da disparada do dólar diminuiu um pouco a intensidade com que se falava em o governo ajudar as empresas. Os dois, em entrevista na Globonews, não foram claros sobre o que exatamente querem do governo.
Efromovich reclama dos impostos — e o exemplo dado acima por Kakinoff é mesmo surrealista —, mas, ao mesmo tempo, como isentar um setor cuja tendência mundial é pagar mais impostos por ser um grande emissor de gases de efeito estufa?
Kakinoff disse que eles não têm previsibilidade da demanda, mas os aviões têm prazos de entrega de quatro, cinco anos. Ou seja, eles têm que encomendar novos aviões mesmo sem ter capacidade de prever se a demanda por voos vai aumentar.
Eles alegam que a tarifa média caiu à metade. Mas é difícil auditar. Como todos sabem, eles oferecem tarifas baixas em horários e dias que ninguém quer viajar. Todas as empresas cobram mais em passagens para um prazo mais curto do que as tarifas compradas com antecedência. Se o passageiro quiser antecipar uma
viagem, pagará uma barbaridade, se quiser postergar, não receberá dinheiro de volta.
Kakinoff disse que a demanda de passageiros, de fato, cresceu muito e isso fez as empresas ampliarem a oferta, e, quando o setor parou de crescer, como aconteceu este ano, houve um aumento de custos das companhias aéreas. Efromovich e Kakinoff reclamam muito da volatilidade do dólar — mais até do que da alta da moeda — porque ela traz a falta de previsibilidade dos custos.
Seja como for, não é novidade que o custo do leasing é em dólar, o querosene de aviação é afetado pelo dólar, portanto, o setor tem que se proteger de alguma forma, exatamente porque essa volatilidade cambial acontece depois de um longo período de vento a favor.
Eles não concordam. Alegam que se fizessem hedge de tudo seria caro demais e têm que conviver, como disse Efromovich, com certas velharias como a de pagar adicional de marinha mercante, quando o querosene de aviação é produzido aqui mesmo.
Conferindo os dados da ANP se vê que o pagamento da taxa de marinha mercante pode ser antigo, mas nem tudo é refinado aqui. A balança comercial de querosene de aviação tem um rombo de US$ 900 milhões de janeiro a julho. O Brasil produziu, mas teve que importar 26% da oferta. É bem verdade que repassa imediatamente o custo para as empresas, ao contrário do que faz com a gasolina.
Esse é um setor em que há muita reclamação de passageiro. Todo mundo tem histórias para contar, por isso é difícil ouvi-los falar em melhora do serviço e que a Gol é uma companhia de baixa tarifa. Ou ouvir que a empresa preservou 500 funcionários da Webjet quando ela comprou a empresa para fechar e demitiu mil. Mas esse é o setor que está na porta do governo pedindo ajuda. Que ele se restrinja a acabar com algumas irracionalidades.
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