FOLHA DE SP - 28/08
Após fuga de senador boliviano de embaixada brasileira, Dilma substitui Patriota por chanceler que ainda é uma incógnita
Não conseguiu passar incólume ao mais recente imbróglio da diplomacia brasileira o chanceler Antonio de Aguiar Patriota.
Funcionou como pretexto para sua queda a operação conduzida pelo encarregado de negócios na Bolívia, Eduardo Saboia, a fim de trazer ao Brasil o senador boliviano Roger Pinto Molina, asilado na embaixada brasileira em La Paz havia mais de 450 dias.
Orquestrada sem conhecimento do Itamaraty, a ação teria demonstrado que faltava a Patriota comando sobre seu ministério.
Foi movido por um espírito humanitário que Saboia decidiu agir. Na sua avaliação, a situação de saúde do senador boliviano na embaixada brasileira havia chegado a um limite.
Como ele próprio reconhece, porém, Saboia violou as regras da profissão e está sujeito a ser punido por isso. Na diplomacia, a disciplina é requisito fundamental.
Se o governo brasileiro agiu bem ao conceder asilo a Molina --alvo de perseguição judicial do governo Evo Morales após ter denunciado envolvimento de autoridades locais com narcotraficantes--, errou, durante 15 meses, ao permitir que o caso se arrastasse sem solução. Não é crível que a diplomacia brasileira não conseguisse, com o devido empenho, obter do governo boliviano o salvo-conduto para trazer o senador ao Brasil.
É possível que outro ministro se saísse do episódio apenas com uma reprimenda. Antonio Patriota, porém, era um chanceler enfraquecido. Diferenças de estilo com a presidente Dilma Rousseff parecem ter sido constantes nos dois anos e oito meses de sua gestão no Itamaraty.
Além de questões pessoais, Patriota sofreu com fatores estruturais. Enquanto a primeira década dos anos 2000 permitiu ao Brasil se projetar no plano internacional, a recuperação econômica em curso nos países desenvolvidos impôs freios aos emergentes.
Patriota, assim, viu-se forçado a pilotar uma gestão de arrefecimento do ímpeto do país, com a perda de espaço de fóruns como os Brics e a diminuição da importância de acordos de cooperação e comércio Sul-Sul.
Patriota encarnava, com sua discrição, a repaginação apropriada à diplomacia brasileira. Com ele, os contenciosos retóricos com os Estados Unidos, por exemplo, foram mitigados.
Não foi o suficiente, contudo, para ganhar prestígio no governo Dilma. Como saída honrosa, lhe caberá a representação do Brasil na ONU, em Nova York --inversão de papéis com seu sucessor no Itamaraty, Luiz Alberto Figueiredo.
Por ter construído carreira na área ambiental, o novo chefe do Itamaraty pode se transformar em ativo para Dilma Rousseff na disputa eleitoral de 2014 --a principal candidata de oposição, até aqui, é a ambientalista Marina Silva.
Sem que tenha chefiado uma embaixada, Figueiredo, embora com boa reputação, ainda é uma incógnita. Para afastar a impressão de que é apenas uma peça no xadrez eleitoral, precisará, o quanto antes, mostrar a que veio.
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