O GLOBO - 31/08
Sem limitar o BC, governo tem de perseverar no combate à inflação, impulsionada agora pelo câmbio, e ter uma política fiscal séria, para atrair investimentos
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, e governo têm, afinal, algum motivo para comemorar: no segundo trimestre do ano, o crescimento de 1,5% do PIB contrariou projeções pessimistas do mercado — as estimativas otimistas chegaram a menos que isso — e serviu de argumento para o ministro decretar que já se deixou o “fundo do poço”. A composição do crescimento também é animadora: os investimentos continuam em ascensão — embora os 3,6% tenham sido inferiores aos 4,7% do primeiro trimestre —, a indústria emite sinal de vida (2%), a agropecuária se mantém forte (3,9%), e tudo isso compensa a frouxidão no consumo familiar, condição necessária para a inflação não disparar pelo lado da pressão de demanda.
Anualizada, a expansão do segundo trimestre chega a 6%, taxa dos sonhos. Mas, infelizmente, a simples projeção deste trimestre para os dois restantes tem lógica aritmética, mas não se sustenta diante de indicadores que já sinalizaram uma perda de empuxo no início do período de julho a setembro. Continua a rondar o ano de 2013 a possibilidade de uma expansão na faixa dos 2% — melhor que o irrisório 0,9% de 2012, porém ainda distante de um patamar razoável (4% a 5%).
Que ao menos o relativamente bom resultado deste PIB trimestral estimule o Planalto a não cometer mais erros na administração da economia. Um deles seria tolher o Banco Central no enfrentamento da inflação, justo quando o país enfrenta um choque cambial, de inexorável impacto nos preços internos. O aperto monetário em curso pode até vir a ser menos intenso, pois o IGP-M, da Fundação Getúlio Vargas, foi de apenas 0,15% em agosto. Há um ano, tinha sido de 1,4%. Como este índice reflete bastante os preços no atacado, isso significa que parece maior do que se imaginava a margem para a absorção do impacto da desvalorização cambial. Esperemos. O importante é não subordinar o BC ao calendário eleitoral.
A política fiscal (gastos) é outro aspecto sensível. No PIB do segundo trimestre, os gastos do governo cresceram apenas 0,5% em relação ao trimestre anterior. Mas quando se olham estatísticas de prazo mais amplo, o ritmo de expansão das despesas oficiais continua a preocupar. Tanto quanto a capacidade que demonstram áreas da Fazenda na aplicação da “contabilidade criativa”, para maquiar o quadro fiscal a fim de que transpareça uma austeridade inexistente na vida real.
Chama a atenção que o Brasil não tenha autorizado o Fundo Monetário Internacional (FMI) a divulgar o relatório periódico que o organismo faz de todas as economias, e isso no momento em que o país e o Fundo divergem sobre os critérios na contabilização da dívida pública bruta — em lépida expansão no caso brasileiro. Esta é uma questão-chave, por envolver a credibilidade do país perante os investidores, ainda a ser recuperada depois das barbeiragens dos últimos meses. O PIB trimestral pode ser um ponto de partida neste resgate.
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