GAZETA DO POVO - PR - 05/08
Atlas de Desenvolvimento Humano, recém-publicado, mostra que 30% das cidades brasileiras têm nota muito baixa em educação. O esvaziamento do ensino médio, por acréscimo, agrava ainda mais a tragédia que de tão repetida já nos dá sono
Num mundo perfeito, os dados do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, o IDH-M, divulgados no início da semana passada, desencadeariam uma corrida maluca atrás de alternativas para a educação no país. Mas não. De tão propalada, nossa falta de jeito com o assunto provoca bocejos involuntários em muita gente. É visto como doença crônica – dessas cuidadas com emplastro e simpatias. Mas há de se considerar que os dias de hoje não são como antigamente. As lamúrias contra a educação também têm outros motivos. Doenças evoluem, e sobre isso se deve falar.
Mudou a geografia do ensino no país, reconheça-se. Os dados são alvissareiros e pedem um Hino Nacional cantado a plenos pulmões. Entre 1991 e 2010, a educação avançou 128%. No início da década de 1990, pouco mais de 30% da população brasileira tinha ensino fundamental. Em 2010, esse índice subiu para 55%. Outros dados positivos se somam a esse. Palmas. Seguidas de silvos.
O problema é que há mais gente na escola, mas a escola não é boa. Pior que isso, só o estágio falimentar do ensino médio. Essa etapa continua sendo um escoadouro de gente, o mais retumbante fracasso da vida brasileira. Estima-se que 60% dos jovens entre 18 e 20 anos não tenham ensino médio completo. Por tabela, a chegada à universidade continua alimentando resultados tão esquálidos que só resta dizer em coro que a escola é um sistema excludente, um desperdício de dinheiro público, de talentos, um atentado contra o futuro.
Não há país desenvolvido no mundo com dados feito os nossos. Se fosse resumir, a palavra é “imoral”. Atente para o funil. Um total de 90% dos petiz de 5 e 6 anos estão na escola. Mas apenas 57% dos que fazem entre 15 e 17 anos concluem o ensino fundamental.
A grita dos analistas de educação ganha o efeito de um protesto. Os berros vão, antes de mais nada, para o próprio sistema de medição do IDH-M, incapaz de avaliar a qualidade, apenas a quantidade. Como na última década houve sensível aumento de vagas e universalização do ensino básico, bingo, os índices positivos podem não ser tão grandiloquentes assim. Em seguida, os “ais” se dirigem à nossa lentidão em reagir. Alô? Está mais que provado de que o ensino médio é tão atraente quanto uma sopa de pedra, dando ganho de causa a qualquer coisa que não se pareça a uma sala de aula.
Avançar na qualidade, portanto, é que são elas. Pede um mutirão nacional. Uma operação Sherlock Holmes nas universidades e escolas, para mapear o que há de melhor. Fala-se na reforma curricular. Em mobilidade de professores. Em sistemas alternativos de aprendizagem, catando por aí metodologias capazes de fazer acordar.
Sobretudo, fala-se numa reviravolta nos modelos de avaliação, única forma de saber se o conhecimento chegou lá ou não. A cobrança desses quesitos todos, aliás, tem de ser política. Não custa sonhar: diz-se que educação não dá voto, mas temos de empenhar nas urnas a revolução educacional que agora já pedimos desolados, tantas vezes foi repetida, cansando a beleza e os pulmões.
Um alerta precisa ser dado. A grande mancha de leitores no mapa populacional brasileira é formada por quem tem mais de 12 anos de estudo. É outro agravante. Num país como os Estados Unidos, 50% da população tem ensino médio, sem perdas profundas no desenvolvimento. O americano médio lê. No Brasil, os anos passados na escola não são garantia de que o ex-estudante, mesmo que tenha passado oito ou dez anos debruçado sobre os livros, possa se virar, fazendo cálculos e entendendo uma notícia de jornal, por exemplo.
É grave – o ensino fundamental e médio não tem demonstrado fôlego para garantir dias melhores para quem o enfrentou. Não forma leitores, o que seria o mínimo para garantir voos solos. Como é que pode? Triste pergunta.
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