segunda-feira, julho 08, 2013

Serviço público: o problema - LUIS CARLOS ALCOFORADO

CORREIO BRAZILIENSE - 08/07

As ruas brasileiras foram ocupadas por multidões de pessoas, entre as quais cidadãos, que perseguiam mudanças, e vândalos, que pretendiam, simplesmente, o caos predatório.

O movimento social, aparentemente espontâneo, abalou e surpreendeu o Estado, que, atônito e perplexo, correu para refugiar-se na intimidade das instituições, muitas das quais alvo da insatisfação popular, em busca de resposta para a crise de confiança há muito instalada na complexa relação entre povo e poder.

Logo, os Poderes migraram da letargia enfadonha para, em linguagem improvisada, apresentar soluções teoréticas que acalmassem a exaltação popular. O povo despertou a inércia das autoridades, que supunham que a insatisfação popular era residual, limitada a setores da sociedade, mas nada que merecesse reflexão e ação. O consumidor de serviço público inadequado é que foi às ruas.

Parece que tudo estaria resolvido com reforma política, como se o Brasil não fosse um dos países em que mais se teceram modificações no sistema institucional, inclusive com esbajamento de processos constituintes e excessivas produções de normas jurídicas. Na verdade, o povo, muitas vezes, pouco entende o complexo e custoso sistema funcional do Estado, mas sabe, sempre, o que quer: serviços públicos de qualidade.

Uma reforma política radical, com a introdução de novos institutos que aperfeiçoem e legitimem a representação popular, se revela imperiosa, pela falência do modelo atual, que extravasa a imperfeição do regime de escolha dos agentes políticos.

Ocorre que, mais do que plebiscito ou referendo, a sociedade, que foi e não foi às ruas, quer, na verdade, serviço público de qualidade, cuja efetividade prescinde de invocações de fórmulas de consulta popular, porque se escancaram as carências que avultam num modelo estatal ineficiente.

A questão nuclear do Brasil se assenta numa compreensão inadequada da verdadeira importância e necessidade de um serviço público a ser prestado sob o regime dos princípios elementares que norteiam, pelo menos teoricamente, a administração. E os princípios que dariam pujança à ação e à administração dos serviços públicos estão explicitados na Constituição e nas leis, basta querer...

O sistema legal brasileiro tem muita elegância propositiva e idealista, sem olvidar os excessos quantitativos, mas são pouco lembrados os princípios e os preceitos que devem ser observados e respeitados pelos sujeitos estatais a quem competem as funções típicas de Estado.

A concretização dos serviços públicos de qualidade resulta da boa gestão político-administrativa, que depende da escolha dos responsáveis pela condução da coisa pública. E, para melhorar a escolha dos homens de Estado, urge a introdução de novos modelos no sistema eleitoral e no acesso ou na ascensão aos cargos estatais, em cujo exercício há agente que deve ser melhor fiscalizado.

Impõe-se a mudança dos costumes e dos dogmas que comprometem a qualidade na prestação dos serviços públicos. O serviço público brasileiro, aqui considerado na acepção mais ampla, expõe as vicissitudes da desqualificação, porque, prestado, diretamente, pelo Estado, ou em regime de delegação, na forma de concessão, permissão ou autorização, acusa flagrante ineficiência.

Carece o sistema de mecanismo de controle da eficiência na prestação do serviço público, segundo padrões que dialoguem com o resultado que satisfaça ao fim a que se destina. O regime jurídico que estabelece o acesso aos cargos públicos mediante concurso é salutar, mas, em si, não elimina a ineficiência, à falta de controle da gestão administrativa, que desconhece a fixação de metas ou resultados.

O servido público no Brasil somente se submete a controle formal, sem que se lhe recolha análise ou julgamento efetivo de qualidade. Mas o povo conhece os graves defeitos, porquanto usuário e consumidor dos serviços públicos, razão por que, quando se manifesta nas ruas ou nos prédios estatais, sabe exatamente que o Estado não cumpre, corretamente, as obrigações por cuja execução responde. Serviço público não é favor ou benesse, mas necessidade impostergável do povo e obrigação essencial do Estado.

A presente crise é muito mais de Estado do que de governos, que tardam em revolucionar a gestão pública, num país que se transformou e acorda todo dia com ampliações de demandas e reivindicações crescentes de gente ligada ao mundo das redes sociais, que verbalizam sentimentos em franca liberdade de expressão.

Respostas rápidas à crise antiga não se oferecem apenas com novas medidas legais, mas, necessariamente, com a urgente intervenção na qualidade da prestação dos serviços públicos. Basta lembrar: serviço público com qualidade é direito do povo e dever do Estado. Serviço público, já!


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