FOLHA DE SP - 18/07
Desde que sem violência, manifestações durante a visita do papa precisam ser tratadas como um fenômeno que faz parte da democracia
Menos mal que seja assim. Entre as possíveis fontes de ameaça à visita do papa Francisco ao Brasil na próxima semana, somente a ação de "grupos de pressão" mereceu alerta vermelho da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Questões por certo mais graves, como o crime organizado ou a hipotética atuação de grupos terroristas, não chegam a preocupar tanto a Abin quanto o risco de confrontos durante a passagem do pontífice pelo Rio, onde participará da Jornada Mundial da Juventude.
O que deveria provocar certo alívio, porém, converteu-se em motivo de preocupação para as autoridades nacionais, ainda desconcertadas diante da recente predisposição dos brasileiros para o protesto.
Responsáveis pela segurança do papa no Brasil, a Abin, o Exército e a Polícia Federal conversam com a equipe do Vaticano acerca de alterações que poderiam ser feitas na agenda oficial a fim de aumentar a proteção oferecida ao pontífice e a sua comitiva.
Estão em estudo a suspensão de compromissos e até mudanças, feitas de última hora, nos locais de alguns encontros.
A principal modificação diria respeito à recepção do papa Francisco, no dia 22. A solenidade, com a presença do governador e do prefeito do Rio, está marcada para o Palácio Guanabara, sede do governo fluminense. Para policiais, o local --que tem sido alvo de agressivos protestos-- não é seguro.
Até aqui, entretanto, o chefe da Igreja Católica não deu sinais de ter se sensibilizado com os temores brasileiros. Dois dias atrás, o Vaticano pediu para a Polícia Federal dispensar o uso de fuzis pelos agentes que acompanharão Francisco em Copacabana --haverá apenas policiais com pistolas.
Ontem, o porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, afirmou que o pontífice manterá a programação original e acrescentou que as manifestações nada têm de específico contra o papa ou a igreja.
O argumento não é preciso. Pelo menos um ato contra os gastos públicos no megaevento católico já foi convocado pela internet, e há muito tempo militantes da causa gay ou feminista, por exemplo, têm seus motivos para protestar.
Parece prevalecer na declaração e nas atitudes do Vaticano, ainda assim, a percepção de que manifestantes, no exercício pacífico de seu direito, não representam ameaça nem podem ser confundidos com criminosos.
Essa é uma lição que as autoridades brasileiras, perdidas entre o abuso da força contra protestos não violentos e a omissão diante de atos de vandalismo, ainda precisam assimilar.
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