FOLHA DE SP - 08/05
RIO DE JANEIRO - Visto de um terraço no quinto andar, o quadro está se desenhando há anos: as amendoeiras subindo imperturbadas, tomando a rua na largura e na altura, cobrindo as janelas dos andares médios e competindo com as coberturas dos edifícios. O Leblon se orgulha do verde de suas ruas internas, mas o exagero parecia beirar a imprudência --não era possível que árvores tão altas pudessem se equilibrar sobre raízes que já não têm para onde se expandir sob a calçada.
Na manhã de segunda-feira, os ventos de 100 km/h que atingiram o Rio submeteram minhas enormes vizinhas a uma dança de filme de terror, com trilha sonora de folhas farfalhando, silvos, uivos e demais clichês do gênero. Tentei calcular o ângulo a que uma delas cairia sobre meu prédio se chegasse a se partir e concluí que, desta vez, estava a salvo --mas não poderia garantir o mesmo numa próxima ventania.
Minha rua foi poupada, mas os ventos derrubaram mais de cem árvores pela cidade e mataram uma pessoa. O Rio já teve chuvas e ventos mais fortes e com menos prejuízos. Segundo me garantem, a culpa cabe a uma nova política inadequada de poda, limitada agora aos galhos mais baixos e permitindo que as árvores cheguem a quase 20 metros, quando o bom-senso aconselha a que não passem de 12.
Enquanto isso, há poucas semanas, um centenário açacu em Copacabana, querido pelos moradores e tombado como uma das "árvores notáveis do Rio", esteve prestes a ser posto abaixo sob a argumentação oficial de que ameaçava cair. A árvore foi parcialmente mutilada, mas o movimento de seus amigos --para os quais o que havia era um espúrio interesse imobiliário-- a salvou.
Pois, na segunda-feira, o açacu foi castigado pelos mesmos ventos que derrubaram árvores mais jovens e orgulhosas. E, mesmo ferido, continua lá, inabalável, invicto.
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