Ao assistir à peça Arte, que esteve recentemente em cartaz em Porto Alegre, no festival Palco Giratório Sesc, tive a mesma sensação de quando assisti a Deus da Carnificina, não por acaso obras da mesma autora, a fantástica Yasmina Reza. É incrível a capacidade que ela tem de criar situações que nos desconstroem.
Sem piedade, ela evidencia o quanto somos todos patéticos. Fazemos um dramalhão por pequenas coisas, expomos carências infantis e perdemos a compostura por nada. Somos experts em desproporção entre causa e efeito.
Será que um dia conseguiremos equalizar nossas reações, dar a elas uma medida exata? Acho improvável. Vida também é teatro. Por mais humildes que sejamos ao reconhecer nossos exageros diante de alguns acontecimentos, dificilmente conseguimos nos conter. Defendemos nossas opiniões com todas as ferramentas de que dispomos: palavra, voz, gestos, paixão, raiva. E dá-lhe atrapalhação. Agimos de forma farsesca acreditando estar sendo espontâneos.
Fazemos piada de assuntos graves e, por outro lado, levamos a sério as maiores bobagens. Amamos alguém e o atacamos. Desprezamos alguém e o tratamos com mesuras. Somos vigorosamente contra ou a favor, como se de nossas posições dependesse nossa vida. E chegam a ser inocentes nossas tentativas de compreender a nós mesmos, aos outros e ao mundo. Eu, particularmente, gosto muito dessa busca, mas sem perder a consciência de que, onde quer que eu chegue, ainda estarei a milhões de anos-luz da compreensão absoluta.
De certa forma, ainda bem. O que viria depois da compreensão absoluta?
Claro que as coisas podem ser mais simples, mas nunca serão exatas. Não há como ter controle sobre algo em constante movimento: a própria vida. É tão grande o número de influências, ideias, sensações e circunstâncias que nos impactam diariamente, que nunca teremos uma verdade pronta e empacotada para lidar com elas – e muito menos uma estabilidade emocional condizente com a experiência. Sempre estaremos falando num tom mais alto, tentando assim nos defender contra o susto que é ser confrontado diariamente com nossa vulnerabilidade.
O que admiro nesses dois textos de Yasmina Reza, Arte e Deus da Carnificina, é que ela mostra claramente o delírio de se levar a ferro e fogo situações banais, a absurda insistência em querermos causar boa impressão e a inutilidade de nos comportarmos como se estivéssemos diante de um tribunal.
Sendo assim, o que nos resta? Rir. No que diz respeito às nossas relações pessoais, a vida segue sendo mais cômica do que trágica.
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