O Estado de S.Paulo - 08/05
Há pelo menos dois anos, o governo brasileiro e as lideranças da indústria já sabem que está em curso uma revolução energética nos Estados Unidos, que pode alijar do mercado global boa parte do sistema produtivo nacional - se uma mudança de atitude não vier a tempo.
A novidade, de só três anos, é a obtenção em larga escala de gás e de petróleo nos Estados Unidos por meio de fraturamento das rochas de xisto.
No ano passado, os Estados Unidos foram o país que mais elevou a produção de petróleo no mundo (mais 780 mil barris diários) e passou a colocar volume enorme de gás a uma mera fração do preço pago no resto do mundo: US$ 2,8 por milhão de BTU nos Estados Unidos ante entre US$ 10 e US$ 12 por milhão de BTU na Europa e no Brasil (veja o gráfico).
São dois os efeitos de enorme alcance estratégico: (1) até 2025, os Estados Unidos deverão ser autossuficientes em petróleo e gás, avalia a Agência Internacional de Energia; e (2) a abundância da oferta de gás e seu baixíssimo preço começam a transferir para os Estados Unidos bom número de investimentos em petroquímica, fertilizantes hidrogenados, química básica (soda e cloro), metalurgia de não ferrosos e outros setores eletrointensivos - como os de cerâmicas, vidro e, provavelmente, cimento. Esse novo movimento de capitais inviabiliza projetos de investimento em outras regiões do Planeta, entre as quais o Brasil.
Os Estados Unidos contam com enormes formações de xisto em regiões altamente industrializadas, o que dispensa pesados custos em infraestrutura de transporte (oleodutos e gasodutos).
A nova tecnologia consiste em injeção a alta pressão de mistura de água, areia e produtos químicos em perfurações horizontais. O processo de microfraturamento da rocha (fracking) libera hidrocarbonetos que sobem à superfície.
A única objeção à essa técnica tem natureza ambiental. A injeção de produtos químicos, sobretudo benzeno, aumenta o risco de contaminação dos lençóis freáticos. Por outro lado, a dispensa de carvão e óleo combustível na produção de energia termoelétrica deve contribuir para a melhora das condições do ar.
A presidente da Petrobrás, Graça Foster, advertiu várias vezes que não há como concorrer com esse gás. É fator que ameaça desde já a sobrevivência de amplos setores da indústria no Brasil, dependentes não só de gás como matéria-prima, mas também de energia elétrica de baixo custo para sua produção.
O governo Dilma sabe que o Brasil também conta com enormes reservatórios de xisto. Cálculos da Agência Nacional do Petróleo indicam que há somente em três bacias (Parecis, Recôncavo Baiano e Parnaíba) potencial de produção de quase 17 trilhões de metros cúbicos de gás. No entanto, o governo brasileiro está ainda muito longe de definir uma política de exploração desse potencial e também de assegurar viabilidade futura para o setor produtivo.
É claro que esse fato estratégico relativamente novo exige redefinição drástica da política industrial brasileira. Não somente para garantir a competitividade, neste momento ainda mais ameaçada, mas também para tirar proveito da nova tecnologia.
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