domingo, maio 12, 2013

A crise que o governo não vê - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S. PAULO - 12/05
Ao minimizar os maus resultados da balança comercial que de janeiro a abril- acumulou um déficit de US$ 6,15 bilhões, o maior da história para o período co­mo fez na segunda-feira em São Paulo, a presidente Dilma Rousseff tenta encobrir um problema que preocupa cada vez mais o empresariado e está cada vez mais longe de ser passageiro. "Qualquer oscilação na balança comercial é apenas uma oscilação", disse tautologicamente a presidente, na pos­se da nova diretoria da Federa­ção das Associações Comer­ciais do Estado de São Paulo, para demonstrar despreocupa­ção com o desempenho do co­mércio exterior, e uma atitude que pode ter conseqüências e não serão positivas para o Brasil.

Nessa questão, quanto mais despreocupado estiver o gover­no tanto pior para o País, pois cada vez menos os responsá­veis pelas políticas públicas voltadas para o setor produti­vo conseguirão entender que o problema não é ocasional. Por sua persistência e profundida­de, começa a transformar-se em problema estrutural da eco­nomia brasileira.

Ainda há tem­po para evitar que a situação piore tanto que fique muito mais difícil corrigi-la, mas é preciso que, primeiro, o gover­no entenda o que ocorre e, de­pois, admita que o problema existe e é grave e comece a agir na direção correta.

São muitos os fatores que afetam o setor produtivo brasi­leiro, sobretudo a indústria de transformação, que vem tendo dificuldades cada vez maiores para enfrentar os competido­res, tanto no mercado externo como no interno.

São muito expressivos os nú­meros que mostram a progres­siva perda de competitividade dos produtos manufaturados brasileiros. O jornal O Globo mostrou que, no ano pas­sado, o setor de bens manufa­turados registrou um déficit co­mercial de US$ 94,9 bilhões. Não se trata de uma oscilação, mas de um processo que come­çou há seis anos (em 2006, o setor registrou superávit co­mercial, que, naquele ano, al­cançou US$ 5,2 bilhões), inten­sificou-se em conseqüência da crise mundial iniciada em 2008 e mantém-se ativo. Os re­sultados vêm piorando de ma­neira persistente.

A crise mundial aprofundou uma tendência iniciada em 2007 (no primeiro trimestre daquele ano, a balança da indústria de transformação regis­trou saldo positivo), fazendo crescer os déficits até os níveis observados atualmente.

De acordo com um relatório divulgado há dias pelo Institu­to de Estudos para o Desenvol­vimento Industrial (ledi), o crescimento do déficit comer­cial da indústria de transforma­ção nesse período não ocorreu de maneira homogênea. Em 2010 e 2011, o saldo negativo foi causado sobretudo pelo rá­pido aumento das importa­ções, fato que ficou conhecido como "invasão" do mercado por produtos estrangeiros. Em­bora as exportações continuas­sem a crescer, as importações cresceram a velocidades bem maiores.

Em 2013, no entanto, embo­ra as importações continuem a crescer, as exportações come­çaram a diminuir, o que pode tornar ainda maiores os défi­cits do setor. Essa tendência é observada em três dos quatro segmentos da indústria classifi­cados de acordo com a densida­de tecnológica dos produtos. A exceção é a indústria de baixo conteúdo tecnológico, cuja li­nha de produção inclui itens como alimentos industrializa­dos, bebidas, fumo, produtos de madeira, celulose, papel.

Quanto maior o conteúdo tecnológico, mais rápida tende a ser a deterioração da balança comercial. A balança conjunta da indústria de alta intensida­de tecnológica - que atende aos mercados que mais cres­cem em todo o mundo - e de média intensidade, por exem­plo, registrou déficit de US$ 16,3 bilhões no primeiro trimes­tre, 22,6% maior do que o dos três primeiros meses de 2012.

As causas da perda de com­petitividade da indústria são conhecidas. Carga tributária excessiva, graves deficiências de infraestrutura, ausência de política efetiva de comércio exterior, escassez cada vez mais aguda de mão de obra adequadamente preparada, en­tre outras. Sobre isso, o gover­no nada diz.

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