ZERO HORA - 10/04
É paradoxal que um país com a dimensão continental do Brasil, e às vésperas de uma safra recorde, seja desafiado pelo crescimento incessante dos preços dos alimentos.
Os sucessivos aumentos que multiplicaram por três o preço do tomate no período de um ano são apenas a face mais visível de um fenômeno que já desarrumou a economia brasileira por décadas e está sempre à espreita. A inflação, sob controle há pelo menos uma década e meia, volta a preocupar governo e população por se manifestar principalmente na cesta básica, com reflexos diretos na vida de grande parte da sociedade que vem obtendo ganhos de renda nos últimos anos. Nada é mais preocupante do que a ascensão dos preços dos alimentos. Inflação na mesa significa corrosão do poder de compra do que é essencial, com danos ainda mais perversos entre as famílias que consomem quase tudo o que obtêm na aquisição de produtos básicos.
Mas os preços em alta não atemorizam apenas as camadas mais pobres, mesmo que essas sejam as mais vulneráveis. Qualquer risco de descontrole no custo de vida se reflete em insegurança para todos. Quem sobreviveu aos longos períodos de inflação alta sabe o que tal distorção representa. A situação atual, mesmo que não possa ser comparada à registrada até meados dos anos 1990, é de qualquer forma temerária, por indicar que, pelo segundo ano consecutivo, o país poderá enfrentar um índice inflacionário acima da meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional. É paradoxal que um país das dimensões do Brasil, que se prepara para colher uma safra recorde de 185 milhões de toneladas de grãos, tenha de importar comida para atender à demanda interna e segurar preços.
É particularmente esdrúxula a situação que leva o país a comprar polpa de tomate da China, gastando mais de R$ 12 milhões em apenas dois meses no que poderia ser produzido aqui. É óbvio que a escassez do produto não explica, sozinha, o momento de pico inflacionário da cesta básica, assim como a famigerada alta do chuchu não justificava a inflação dos anos 70. Mas é sintomático que o Brasil não tenha se preparado para atender à demanda do consumo doméstico, apresentando-se assim como exceção na economia global, que vem registrando, segundo a FAO, queda consecutiva nos preços da alimentação desde outubro do ano passado.
É por conta da pressão inflacionária que se prevê a elevação da taxa de juros, o recurso sempre à mão quando o objetivo é conter os preços pela desaceleração da economia. Não há como não lamentar que, depois de 12 meses quase sem crescimento, em 2012, o país se veja obrigado a conviver com uma estratégia que cobra o alto custo de conter o consumo e, por consequência, segurar a produção. O Brasil é um dos poucos países com baixa performance econômica após a crise mundial do final de 2008. Continuar atribuindo o fraco desempenho do PIB à persistência da instabilidade na Europa e nos Estados Unidos é como culpar apenas o tomate pela persistente distorção dos preços.
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