terça-feira, março 26, 2013

''Jilozinho da Esplanada'' - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S. PAULO - 26/03
Com a transferência do seu titular, o veterano político Wellington Moreira Franco, para a Secretaria da Aviação Civil, na semana passada, a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) ficou a cargo, interinamente, do economista Marcelo Neri. Até então ele conduzia o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o reputado Ipea. Isso porque a presidente Dilma Rousseff não conseguiu despertar o interesse dos caciques partidários pelo cargo, um dos 15 equiparados na administração federal aos atuais 24 ministros de Estado. Pelo menos duas legendas procuradas, o PSD do ex-prefeito Gilberto Kassab e o PMDB do vice Michel Temer, à qual Moreira Franco é filiado, declinaram da oferta.

No país onde os partidos "fazem o diabo", como diria Dilma, para alojar os seus no primeiro escalão do governo e onde ela trincha o Gabinete em generosas porções para comprometer as agremiações beneficiadas com o mais estratégico de seus projetos - a reeleição -, o desdém dos interlocutores do Planalto pela SAE é perfeitamente compreensível, dado o que dele esperam. Para começar, o orçamento do "Ministério do Futuro", como o órgão foi batizado quando Lula lhe deu a forma atual em 2008, nomeando para sua direção o trêfego Roberto Mangabeira Unger, dublê de acadêmico bem-sucedido e político frustrado, é uma quirera da ordem de R$ 15 milhões.

Para ter ideia, o do Ipea, vinculado à própria Secretaria, é quatro vezes maior, ou R$ 63 milhões - o que faz sentido. Além disso, como observam os parlamentares, "a pasta não tem recursos, não executa obras nem o secretário é recebido pela presidente", enumera o deputado Lúcio Vieira Lima, do PMDB baiano, decerto ecoando os argumentos dos seus pares, sem distinção de siglas. "O partido que assumir não terá nada para mostrar", resume. É disso que vivem os mandatários - poder e prestígio, os quais variam na razão direta dos recursos públicos sob o seu controle ou influência e do número de cargos comissionados ao alcance de suas canetas. Na SAE, limitam-se a 145.

Perto das mais de 22 mil vagas chamadas de livre provimento no Executivo, isso e nada é a mesma coisa. Daí o "Ministério do Futuro" ter outro apelido entre os chamados a compartilhar da mesa de refeições do governo: "Jilozinho da Esplanada". O deboche dos comensais, diga-se desde logo, não deve ser tomado como prova da desimportância da SAE. Não há Estado que valha o nome que não disponha de um think-tank, ou mais de um, voltado para formular os cenários de longo prazo com que o País terá de se haver, e até mesmo para oferecer sugestões fundamentadas em relação a diretrizes governamentais do agora e aqui. Militares fazem isso o tempo todo, nas áreas de sua competência - não só em matéria de defesa nacional, como ainda de inovação tecnológica, por exemplo. Diplomatas, evidentemente, também.

Assentada a necessidade de um organismo público que "pense grande", trata-se de saber se deve competir pelos holofotes que aquecem as elites do poder. O subsecretário de Ações Estratégicas da SAE, economista Ricardo Paes de Barros, acha que a imagem da Secretaria seria outra se a presidente lhe desse crédito pela sua contribuição para a criação de programas de apelo popular. "A Casa Civil também não executa nada", compara, "mas tem visibilidade porque influencia o pensamento da presidente." Essa, no entanto, é uma questão relativamente secundária. Os problemas da SAE decorrem, antes, da proliferação, nos últimos 10 anos, de entidades oficiais cujos dirigentes têm status ministerial.

Sabe-se lá quantas delas foram criadas apenas porque era preciso aumentar o número de assentos na primeira classe do governo para acomodar, como acham que merecem, figuras politicamente valiosas para o Planalto. Quanto maior a quantidade de Secretarias, mais oportunidades haverá para oferecer prêmios de consolação a políticos desempregados, em razão principalmente da lealdade política que demonstrem do que da familiaridade que tenham com os assuntos que lhes tocarão administrar. De resto, o status de ministro de qualquer dos quatro titulares da SAE desde o seu surgimento em nada contribuiu para o progresso do País. Ultimamente, ela só foi notícia quando o mais recente deles, Moreira Franco, disse que o órgão não elege nem vereador.

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