O GLOBO - 18/02
Há teorias bem formuladas que funcionam numa atividade e são ruinosas em outras. A descentralização administrativa, por exemplo, é receita infalível de agilidade no setor privado, mas nem sempre dá certo em segmentos da área pública.
Não deu na municipalização excessiva do país. Os números são eloquentes: os 4.180 municípios existentes quando a Constituição foi promulgada, em 1988, se multiplicaram para 5.568 e, mesmo assim, porque, no governo Fernando Henrique, concordou-se em travar a indústria de geração de prefeituras, tocada a todo vapor por esquemas políticos paroquiais. E a eficiência no atendimento à população não melhorou na mesma proporção.
Até FH, para se criar novas unidades da Federação bastava receber sinal verde das assembleias legislativas a fim de se fazer o plebiscito clássico, tudo sob o controle de caciques regionais. Com a determinação, por meio de emenda constitucional, aprovada em 1996, de que criação e fusão de municípios passavam a depender de lei complementar federal, aquela indústria foi contida. Mas ficou a herança da excessiva pulverização de prefeituras.
A descentralização, em si, é correta. O problema é que, no Brasil, a Federação tem um modelo rígido de organização que se reproduz de cima para baixo, da União ao menor dos municípios. Legislativo, ministérios/secretarias, Tribunal de Contas, procuradorias — é uma estrutura cara, impossível de ser sustentada por todos os entes da Federação com receita própria.
Há, então, maciça dependência dos recursos dos fundos de participação, principalmente da União. A esmagadora maioria das 5.568 prefeituras vive desses repasses, muitas sequer cobram o principal imposto municipal, o IPTU. Por despreparo administrativo, demagogia ou ambos. É mais conveniente viver da mesada federal e estadual.
Esta dependência é tão funesta que serve até mesmo como obstáculo ao rebaixamento da carga tributária geral. No ano passado, vieram de prefeitos as primeiras reclamações contra a política do governo federal de reduzir o IPI para estimular o consumo de produtos de certas linhas da indústria (eletrodomésticos, automóveis). Não porque discordassem da estratégica, mas devido à diminuição do fluxo de recursos da Federação para seus cofres.
Por estarem mais próximos da população, os prefeitos são agentes públicos com posição privilegiada para agir com rapidez em defesa do bem público. Não é o que acontece, como fica evidente nos desastres naturais, no vergonhoso problema da inexistência de saneamento básico, e assim por diante. Sem viabilidade fiscal, a maioria dos municípios é peso morto, sanguessuga do contribuinte nacional.
Existem porque grupos políticos trabalharam para emancipar currais eleitorais e usar os empregos criados pelas novas prefeituras para exercitar o clientelismo. É preciso um debate sério sobre a extinção de municípios inviáveis.
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