O GLOBO - 01/12
O Congresso havia ignorado princípios jurídicos básicos e a presidente antecipou uma decisão que certamente seria tomada pelo Supremo Tribunal Federal
A presidente Dilma antecipou uma decisão que seria inevitavelmente tomada pela Justiça (no caso, o Supremo Tribunal Federal) em relação ao projeto aprovado no Congresso sobre a distribuição dos royalties do petróleo extraído no mar. O projeto não apenas feriu o espírito do pacto federativo, ao transformar cidadãos fluminenses e capixabas em cidadãos de segunda categoria, mas violou princípios jurídicos básicos. A receita que o Congresso deseja redistribuir envolve campos de petróleo e gás que já estão em produção, muitos deles há vários anos. Áreas que já se apoiam na infraestrutura de municípios capixabas e fluminenses, e agora também do litoral norte de São Paulo. Pelo desejo de parlamentares, parcela substancial da receita decorrente desses campos destinada aos estados e municípios produtores desapareceria, para ser apropriada por todos os demais, dentro de um critério sem qualquer relação com o impacto da atividade petrolífera.
O que inspirou o desrespeito ao pacto federativo e aos princípios jurídicos foi a expectativa das descobertas na camada do pré-sal, que provavelmente elevarão de maneira substancial a produção de petróleo e gás. Mas o Congresso sequer se preocupou em olhar para frente e avançou sobre a receita já existente, sem qualquer consideração com os cidadãos fluminenses, capixabas e do litoral norte de São Paulo. Uma volta aos tempos da barbárie, quando tribos e povos se juntavam para saquear a produção dos vizinhos, sem dar-lhes chance de defesa.
Argumentos de que essa ação desorganizaria finanças estaduais e municipais do Rio e do Espírito Santo, reduzindo significativamente a capacidade de investimento destes entes federativos, não surtiram efeito. Os atingidos assistiram com perplexidade a governantes e parlamentares dos estados beneficiados pela rapina fazerem declarações no estilo “danem-se”. Existe uma motivação que até contaria com a solidariedade de fluminenses e capixabas, que é a busca de receitas, mas para alcançar esse objetivo governantes e parlamentares resolveram atacar o lado mais fraco da corda, no caso, estados e municípios produtores.
A presidente Dilma certamente não tomou sua decisão com base somente em sua assessoria jurídica. Deve ter avaliado o estrago que o rompimento de contratos faria à imagem do país entre os potenciais investidores. Como frisou a ministra Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, ao explicar ontem o veto da presidente Dilma, com base nos contratos já existentes estados e municípios produtores comprometeram parcela considerável das receitas futuras, em uma prática usual no mercado (os chamados recebíveis), em pagamentos, inclusive com a União. Os que aceitaram os recebíveis não tinham embutido esse risco nas transações, pois não poderiam contar com o rompimento de contratos, há muito tempo respeitados no Brasil. E que continue assim.
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