FOLHA DE SP - 23/12
Dilma reduz o número de coletivas; escassez de entrevistas formais evidencia tradição viciada nas relações entre a imprensa e o poder
Diminuiu consideravelmente, segundo registros da Secretaria de Imprensa da Presidência, o número de entrevistas da presidente Dilma Rousseff em 2012, na comparação com o ano anterior.
No total, deram-se 34 encontros com a imprensa neste ano (27 entrevistas coletivas e sete exclusivas). Em 2011, haviam sido 62.
Excluídos os chamados "quebra-queixos" -aquelas incômodas e insatisfatórias ocasiões em que dezenas de microfones cercam as autoridades, em busca de migalhas de informação-, são ainda mais raros os casos em que a presidente esteve disponível para esclarecer, de viva voz e organizadamente, as ações e omissões de seu governo.
Computados apenas os eventos formais, resumem-se a cinco, no ano de 2012, os momentos em que Dilma respondeu a perguntas de jornalistas. Segundo relatório da Secretaria de Imprensa, cuja última atualização é do dia 13, por três vezes essas entrevistas formais se deram ao término de conferências internacionais, como a Rio+20, em junho.
Trata-se, naturalmente, de situações em que os olhos do mundo e a expectativa de pronunciamentos protocolares se combinam para justificar que se afastem da pauta os temas, porventura mais incômodos, da política doméstica.
Diferentemente do que acontece em outros países, como os Estados Unidos -onde é periódica a realização de verdadeiras sabatinas do presidente, com uma plateia de jornalistas credenciados-, no Brasil a Presidência continua a se mostrar avara nessa prática.
Não é preciso remontar ao regime autoritário -quando uma raríssima entrevista do então presidente Geisel, em viagem ao Japão, chegou a ser recebida como espantoso sinal de modernidade- para assinalar o constrangedor deficit de transparência que marca o trato dos governantes com a imprensa.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como se sabe, preferia a elocução desabrida nos comícios ao confronto, sobretudo se desse direito a réplicas, com repórteres.
Sem vocação para a oratória, mas dotada de familiaridade com a argumentação técnica, Dilma Rousseff teria, em tese, propensão maior para defrontar-se com a imprensa. Seria, no mínimo, uma maneira de desbastar as arestas de personalidade que a notabilizaram antes de assumir o cargo. O próprio desempenho dos jornalistas, cabe reconhecer, padece com a falta de prática e certa cultura de reverência quando "convidados" (e o termo já é consternador) a entrevistar os ocupantes do Planalto.
A democracia brasileira -cujos avanços na transparência institucional são notáveis, como a transmissão ao vivo dos julgamentos do Supremo Tribunal Federal- se ressente de uma tradição ao mesmo tempo autoritária e intimista nas relações entre imprensa e poder.
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