segunda-feira, novembro 26, 2012

O TCU e os subsídios ilegais - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 26/11


Pelo menos R$ 72,3 bilhões devem sair do bolso do contribuinte, entre 2011 e 2015, para cobrir os subsídios embutidos nos empréstimos do Tesouro Nacional ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de acordo com estimativa do Tribunal de Contas da União (TCU). Esse custo, estimado com base nas hipóteses mais favoráveis, corresponde a operações de crédito de R$ 234,8 bilhões já realizadas. Ficou fora da conta uma operação autorizada, mas ainda sem desembolso, de R$ 55 bilhões. Desde 2008 o governo tem transferido grandes volumes de recursos orçamentários ao banco. Ao realizar essas transferências, o governo tem, segundo o TCU, violado a Lei de Responsabilidade Fiscal. O Executivo tem descumprido as regras de especificação de custos e de outros detalhes financeiros e descuidado da avaliação do impacto nas metas fiscais previstas para cada ano. Essas falhas, de acordo com o documento, são uma "severa afronta" à lei.

Segundo o relator, ministro Aroldo Cedraz, os órgãos responsáveis têm alegado incertezas quanto à evolução dos juros, mas nem por isso ficam dispensados de apresentar os cálculos ou de cumprir as normas de transparência dos gastos governamentais. Uma detalhada análise dessas operações foi apresentada pelo relator e aprovada em reunião plenária no dia 14. Por meio de acórdão, medidas corretivas foram determinadas à Secretaria de Política Econômica e à Secretaria do Tesouro Nacional, órgãos do Ministério da Fazenda. Os ministros cobraram, entre várias providências, estimativas de impacto dessas transações sobre a dívida pública e, naturalmente, a adoção de todas as práticas determinadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal para a elaboração das propostas orçamentárias de cada ano. A Secretaria do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) fica obrigada a enviar aos bancos oficiais a lista das obras incluídas na política de subsídios orçamentários.

Ministros do TCU têm chamado a atenção, com frequência, para problemas nos programas de investimento do governo federal - irregularidades nos contratos, falhas nos cálculos de custos, ineficiência na execução e mau uso de recursos financeiros. O relatório sobre os empréstimos do Tesouro ao BNDES explora uma dimensão especialmente importante desses programas - o uso de recursos orçamentários para ampliação do crédito aos investimentos.

O documento menciona, além das irregularidades formais, o risco dessas operações "para o equilíbrio das contas públicas", por causa do enorme volume dos recursos envolvidos e da negligência na explicitação dos custos e das consequências para as metas fiscais. A cuidadosa análise apresentada pelo relator é mais uma confirmação - a mais importante até agora - do estilo voluntarista dominante na administração federal petista e acentuado há alguns anos.

O desprezo pelos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, claramente apontado no documento do TCU, é apenas parte de um quadro preocupante. Como já foi mostrado por vários analistas competentes, a forma de transferência de recursos do Tesouro para o BNDES e outros bancos estatais é uma reedição, com pequenas mudanças, de uma prática nefasta seguida por longo tempo e abolida no fim dos anos 80.

Ao realizar esses empréstimos, o governo põe em funcionamento um mecanismo semelhante ao da velha conta movimento e estabelece uma relação promíscua e muito perigosa entre o Tesouro e as instituições financeiras. Enquanto durou, esse tipo de operação foi um fator de constante perturbação, tanto do sistema fiscal quanto da ordem monetária. A extinção dessa conta ocorreu muito antes da elaboração do projeto da Lei de Responsabilidade Fiscal e foi um passo importante para a recuperação dos fundamentos da economia brasileira a partir do Plano Real. A promiscuidade entre o Tesouro e os bancos oficiais havia sido apontada - e criticada com argumentos estritamente econômicos - várias vezes antes da publicação do relatório e do acórdão do TCU. Com esses documentos, a crítica se amplia e ganha uma importantíssima dimensão jurídica.

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