O ESTADÃO - 16/09
No último ano a queda da taxa real de juros ajudou a expandir as vendas reais do comércio, que vêm mantendo um crescimento robusto. Mas contrariamente à expectativa do governo no início do ano, ela não foi capaz nem de elevar a formação bruta de capital fixo, que persistiu em queda, nem de compensar o desestímulo vindo da desaceleração das exportações. Com isso, o Brasil vem mostrando taxas de crescimento decepcionantes. O governo reagiu efetuando alterações na política econômica.
A primeira mudança ocorreu no câmbio. O Brasil nunca esteve em um regime puro de flutuação cambial. Pesadas intervenções nos mercados à vista e futuro de câmbio associadas a controles maiores ou menores de ingressos de capitais sempre interferiram com a trajetória da taxa cambial. Porém, nos últimos meses, assistimos a algo muito diferente de um regime de câmbio flutuante altamente manejado. Ingressamos em um regime de bandas de flutuação, com um valor mínimo em R$ 2,00/US$ e máximo que se aproxima de R$2,10/US$ que é, de fato, um regime de câmbio fixo.
Estímulo à indústria. O propósito desta mudança é tentar estimular a produção industrial, que, após uma espetacular recuperação à recessão de 2008, persistiu estagnada entre o início de 2010 e a metade de 2011, declinando desde então. A razão para esse comportamento está na queda das margens de lucro da indústria, devido à combinação de um aumento do custo unitário do trabalho provocado pelos reajustes de salários reais característicos de uma economia em pleno emprego, com a impossibilidade de repassar aumentos de custos para preços, devido à competição das importações. Doses elevadas de estímulos monetários, fiscais e creditícios deverão sustentar a economia em pleno emprego e, por isso, não há perspectivas de queda no custo unitário do trabalho. Na visão do governo, a tarefa de recompor o lucro das indústrias deverá ser parcialmente realizada pelo câmbio um pouco mais depreciado.
A segunda mudança diz respeito ao uso da política fiscal. O governo havia se comprometido com metas elevadas de superávits primários, permitindo acentuar a queda da taxa de juros, mas a decepção com os resultados vem provocando uma revisão da política fiscal.Há um misto de reduções de impostos sobre bens de consumo, voltadas para elevar as vendas de automóveis, eletrodomésticos e móveis, e de desonerações voltadas a estimular a produção. Porém, o Brasil não vive um problema de falta de demanda e, por isso, o governo deveria ser muito mais parcimonioso nos estímulos às vendas de bens de consumo, concentrando-se predominantemente em desonerações tributárias para estimular a produção. Um passo importante nessa direção foi dado com a redução dos encargos sobre o custo da energia elétrica. Outro passo, mais tímido, vem sendo dado nas sucessivas desonerações de impostos incidentes sobre a folha de trabalho em setores escolhidos.
Um movimento mais preocupante é o ligado à redução das metas do superávit primário. Não se nega que atualmente haja espaço para uma redução do superávit primário sem interromper a tendência declinante da relação dívida/ PIB. Afinal, a crise acentuou a queda da taxa real neutra de juros, que deverá se manter baixa por um período razoavelmente longo. O resultado sobre o crescimento da economia vai depender da correta escolha sobre como o governo decidir gastar os recursos.
Se o Brasil estivesse em uma recessão, abaixo do pleno emprego no mercado de trabalho, o aumento de quaisquer gastos e/ou a redução de quaisquer tributos teria um efeito idêntico: expandiria a demanda, tirando a economia da recessão e reduzindo a taxa de desemprego. Mas atualmente estamos próximos - ou mesmo acima - do pleno emprego no mercado de trabalho. Ao lado disso, a expansão robusta das vendas reais do comércio mostra que não temos um problema de falta de consumo. Temos, sim, um problema de competitividade na indústria, que vem restringindo a oferta, e a forma de superá-lo é reduzindo encargos tributários sobre a produção, e gerando externalidades - na forma de quedas de custos - derivadas de investimentos em infraestrutura.
Depreciação cambial. Há quem proponha que este problema poderia ser superado com maior depreciação cambial. Mas esta "solução" esbarraria em mais inflação, exigindo taxas de juros mais elevadas. Talvez por isso o Banco Central venha intervindo no mercado de câmbio não somente para evitar uma valorização abaixo de R$ 2,00/US$, mas também quando o real ameaça se aproximar de R$ 2,10/US$. A adesão ao câmbio fixo fechou um canal de transmissão da política monetária,o que por si só representa uma dificuldade um pouco maior para reduzir a inflação, que continua pressionada pelos preços dos serviços - com uma economia em pleno emprego deverão continuar mostrando taxas elevadas. O risco da inflação impõe limites ao uso tanto dos estímulos cambiais quanto de medidas protecionistas, como as que foram recentemente anunciadas.
Como estas mudanças interferem com a política monetária? Estamos nos aproximando do final do ciclo de quedada taxa Selic. O relevante, neste ponto, não é saber se o Banco Central decidirá ou não mais uma redução de 25 pontos base na taxa de juros, mas sim por quanto tempo tentará manter a taxa neste novo nível. Aparentemente o plano de voo das autoridades econômicas é manter a taxa de juros neste novo nível por um extenso período, que abrangeria o final de 2012 e todo o ano de 2013, buscando manter o estímulo ao crescimento.
Já há uma dose elevada de estímulos monetários colocados em ação, aos quais provavelmente serão adicionados novos estímulos fiscais. Mas uma política fiscal mais expansionista, qualquer que seja a sua natureza, eleva a taxa neutra real de juros, o que significa um pouco a mais de pressões inflacionárias. Embora este seja um governo mais tolerante com a inflação, e use mais intensamente as desonerações de encargos e reduções de tributos para reduzir preços, como ocorre com a redução dos encargos sobre energia elétrica, há limites para o crescimento da inflação.
Se as desonerações tributárias privilegiarem o consumo, e o aumento de gastos públicos se concentrarem em transferências e em despesas correntes, a inflação será maior, sem que ocorra o benefício do aumento da produtividade e do estímulo ao aumento da produção. Já se as desonerações se concentrarem em estímulos à produção, e os gastos forem destinados a investimentos em infraestrutura, colheremos uma melhora da eficiência produtiva, e um aumento no PIB potencial.
Não é qualquer expansão fiscal que interessa, mesmo que atendendo à restrição de manter a tendência declinante da relação dívida/PIB. Nas atuais circunstâncias da economia brasileira a política fiscal correta é a que estimula a produção, devendo concentrar-se, sobretudo, na elevação de investimentos em infraestrutura.
A primeira mudança ocorreu no câmbio. O Brasil nunca esteve em um regime puro de flutuação cambial. Pesadas intervenções nos mercados à vista e futuro de câmbio associadas a controles maiores ou menores de ingressos de capitais sempre interferiram com a trajetória da taxa cambial. Porém, nos últimos meses, assistimos a algo muito diferente de um regime de câmbio flutuante altamente manejado. Ingressamos em um regime de bandas de flutuação, com um valor mínimo em R$ 2,00/US$ e máximo que se aproxima de R$2,10/US$ que é, de fato, um regime de câmbio fixo.
Estímulo à indústria. O propósito desta mudança é tentar estimular a produção industrial, que, após uma espetacular recuperação à recessão de 2008, persistiu estagnada entre o início de 2010 e a metade de 2011, declinando desde então. A razão para esse comportamento está na queda das margens de lucro da indústria, devido à combinação de um aumento do custo unitário do trabalho provocado pelos reajustes de salários reais característicos de uma economia em pleno emprego, com a impossibilidade de repassar aumentos de custos para preços, devido à competição das importações. Doses elevadas de estímulos monetários, fiscais e creditícios deverão sustentar a economia em pleno emprego e, por isso, não há perspectivas de queda no custo unitário do trabalho. Na visão do governo, a tarefa de recompor o lucro das indústrias deverá ser parcialmente realizada pelo câmbio um pouco mais depreciado.
A segunda mudança diz respeito ao uso da política fiscal. O governo havia se comprometido com metas elevadas de superávits primários, permitindo acentuar a queda da taxa de juros, mas a decepção com os resultados vem provocando uma revisão da política fiscal.Há um misto de reduções de impostos sobre bens de consumo, voltadas para elevar as vendas de automóveis, eletrodomésticos e móveis, e de desonerações voltadas a estimular a produção. Porém, o Brasil não vive um problema de falta de demanda e, por isso, o governo deveria ser muito mais parcimonioso nos estímulos às vendas de bens de consumo, concentrando-se predominantemente em desonerações tributárias para estimular a produção. Um passo importante nessa direção foi dado com a redução dos encargos sobre o custo da energia elétrica. Outro passo, mais tímido, vem sendo dado nas sucessivas desonerações de impostos incidentes sobre a folha de trabalho em setores escolhidos.
Um movimento mais preocupante é o ligado à redução das metas do superávit primário. Não se nega que atualmente haja espaço para uma redução do superávit primário sem interromper a tendência declinante da relação dívida/ PIB. Afinal, a crise acentuou a queda da taxa real neutra de juros, que deverá se manter baixa por um período razoavelmente longo. O resultado sobre o crescimento da economia vai depender da correta escolha sobre como o governo decidir gastar os recursos.
Se o Brasil estivesse em uma recessão, abaixo do pleno emprego no mercado de trabalho, o aumento de quaisquer gastos e/ou a redução de quaisquer tributos teria um efeito idêntico: expandiria a demanda, tirando a economia da recessão e reduzindo a taxa de desemprego. Mas atualmente estamos próximos - ou mesmo acima - do pleno emprego no mercado de trabalho. Ao lado disso, a expansão robusta das vendas reais do comércio mostra que não temos um problema de falta de consumo. Temos, sim, um problema de competitividade na indústria, que vem restringindo a oferta, e a forma de superá-lo é reduzindo encargos tributários sobre a produção, e gerando externalidades - na forma de quedas de custos - derivadas de investimentos em infraestrutura.
Depreciação cambial. Há quem proponha que este problema poderia ser superado com maior depreciação cambial. Mas esta "solução" esbarraria em mais inflação, exigindo taxas de juros mais elevadas. Talvez por isso o Banco Central venha intervindo no mercado de câmbio não somente para evitar uma valorização abaixo de R$ 2,00/US$, mas também quando o real ameaça se aproximar de R$ 2,10/US$. A adesão ao câmbio fixo fechou um canal de transmissão da política monetária,o que por si só representa uma dificuldade um pouco maior para reduzir a inflação, que continua pressionada pelos preços dos serviços - com uma economia em pleno emprego deverão continuar mostrando taxas elevadas. O risco da inflação impõe limites ao uso tanto dos estímulos cambiais quanto de medidas protecionistas, como as que foram recentemente anunciadas.
Como estas mudanças interferem com a política monetária? Estamos nos aproximando do final do ciclo de quedada taxa Selic. O relevante, neste ponto, não é saber se o Banco Central decidirá ou não mais uma redução de 25 pontos base na taxa de juros, mas sim por quanto tempo tentará manter a taxa neste novo nível. Aparentemente o plano de voo das autoridades econômicas é manter a taxa de juros neste novo nível por um extenso período, que abrangeria o final de 2012 e todo o ano de 2013, buscando manter o estímulo ao crescimento.
Já há uma dose elevada de estímulos monetários colocados em ação, aos quais provavelmente serão adicionados novos estímulos fiscais. Mas uma política fiscal mais expansionista, qualquer que seja a sua natureza, eleva a taxa neutra real de juros, o que significa um pouco a mais de pressões inflacionárias. Embora este seja um governo mais tolerante com a inflação, e use mais intensamente as desonerações de encargos e reduções de tributos para reduzir preços, como ocorre com a redução dos encargos sobre energia elétrica, há limites para o crescimento da inflação.
Se as desonerações tributárias privilegiarem o consumo, e o aumento de gastos públicos se concentrarem em transferências e em despesas correntes, a inflação será maior, sem que ocorra o benefício do aumento da produtividade e do estímulo ao aumento da produção. Já se as desonerações se concentrarem em estímulos à produção, e os gastos forem destinados a investimentos em infraestrutura, colheremos uma melhora da eficiência produtiva, e um aumento no PIB potencial.
Não é qualquer expansão fiscal que interessa, mesmo que atendendo à restrição de manter a tendência declinante da relação dívida/PIB. Nas atuais circunstâncias da economia brasileira a política fiscal correta é a que estimula a produção, devendo concentrar-se, sobretudo, na elevação de investimentos em infraestrutura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário