SÃO PAULO - Em termos puramente racionais, é difícil encontrar algo mais estúpido do que um esporte olímpico. Não faz sentido que algumas pessoas dediquem suas vidas a ver quem atira mais longe um pedaço de pau ou a tentar superar, às vezes por milésimos de segundo, um desconhecido num percurso terrestre ou aquático que liga nada a lugar nenhum. Pior mesmo só entusiasmar-se à distância com esses eventos, como fazemos os torcedores.
Se é incoerente e todo mundo adora, estamos diante de um fenômeno que vale a pena investigar. Quem oferece pistas interessantes é o hoje quase esquecido historiador holandês Johan Huizinga (1872-1945). Para Huizinga, a ideia de jogo é central para a civilização. Em seu "Homo Ludens", o autor afirma que todas as atividades humanas, incluindo filosofia, guerra, arte, leis e linguagem, podem ser vistas como o resultado de um jogo, ou, para usarmos a terminologia técnica, "sub specie ludi" (a título de brincadeira).
A escrita alfabética surgiu porque um escriba com gosto por trocadilhos infames brincou com sons, significados e símbolos. A filosofia não é muito mais que um grande jogo de conceitos. O direito, então, é pura encenação. Na Inglaterra, advogados e juízes ainda usam perucas (por aqui só sobrou a toga), evidência de que o mundo das leis tem muito de teatro.
Huizinga define jogo como "atividade ou ocupação voluntária executada dentro de certos limites fixos de tempo e espaço, de acordo com regras livremente aceitas, mas absolutamente restritivas, que tenha seu fim em si mesma e que se faça acompanhar de um sentimento de tensão, alegria e da consciência de que ela difere da vida ordinária".
Paradoxalmente, é porque não serve para nada que o esporte provoca tanto fascínio. Ele nos lança num mundo de brincadeira, tão afastado das agruras do dia a dia que não precisamos nem nos curvar aos imperativos da razão.
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