O GLOBO - 08/06
O corte da taxa básica de juros anunciado de surpresa pelo Banco Central da China, para estimular o crescimento econômico através do consumo interno, é movimento similar ao que vem sendo feito no Brasil a partir do governo Dilma para enfrentar a crise econômica internacional.
Anteriormente, a partir do início da crise, em 2008, a China havia investido pesadamente em obras públicas, coisa que o Brasil ainda está para fazer.
A China começou este ano uma política de "pouso suave" num mundo em crise, preparando-se para um crescimento médio de 7% do PIB nacional, bem abaixo dos dois dígitos das últimas décadas, mas com metas que incluem promoção do consumo, redução das diferenças sociais pela melhoria do salário mínimo e eficiência energética.
Mais urbana que rural, a China, com seu 12 Plano Quinquenal, em vigor desde março do ano passado, tem o objetivo de fazer migrar seu padrão de desenvolvimento para indústrias avançadas e desenvolvimento tecnológico, em busca do que classifica de "harmonização da sociedade".
O economista Carlos Geraldo Langoni, ex-presidente do Banco Central do Brasil e atual diretor do Centro de Economia Mundial da FGV, analisa em recente trabalho que o Brasil, em contraste com a China, não tem capacidade de utilizar o investimento público como eficiente instrumento anticíclico.
Além das limitações orçamentárias, existem inúmeras restrições burocráticas "envolvendo regras rígidas de licitações e licenciamentos ambientais que retardam sobremaneira a execução de projetos essenciais para a modernização da infraestrutura".
Os investimentos públicos caíram cerca de 2,7% em termos reais neste 1º quadrimestre. Langoni destaca que, em alguns setores-chave, como energia e telecomunicações, novas exigências de conteúdo nacional elevam o custo e podem limitar a participação do setor privado.
Para o economista da Fundação Getulio Vargas, a alternativa seria flexibilizar essas regras, reduzir impostos e anunciar uma onda de concessões a fim de assegurar a retomada de um padrão de desenvolvimento liderado pelo investimento.
Embora a presidente Dilma, repetindo o que fizera seu inspirador político, o ex-presidente Lula, tenha afirmado em discurso recente que "quem aposta na crise, como há quatro anos, vai perder de novo", Langoni diz que os resultados são decepcionantes, mas não se constituem em grande surpresa nem em fato isolado.
A desaceleração dos países que ele classifica de superemergentes - China, Índia e Brasil - vem sendo observada a partir de março de 2010, sendo que a única exceção é a Rússia, devido ao comportamento, até há pouco tempo favorável, do preço do petróleo.
O baixo crescimento da economia brasileira, o menor entre os Brics e inferior à média mundial, alimenta o debate sobre a sustentabilidade do desenvolvimento.
O curioso, lembra Langoni, é que, na saída da recessão de 2008/2009, a preocupação era com a ameaça de superaquecimento e as pressões inflacionárias.
Políticas restritivas foram, então, implementadas, e, em alguns casos, como na China e no Brasil, houve êxito na reversão desses desequilíbrios.
O efeito colateral, entretanto, foi o esfriamento da demanda doméstica, e o aprofundamento da crise europeia em 2011 amplificou a desaceleração da atividade econômica, fazendo com que o foco da política macro mudasse novamente para ação preventiva, na tentativa de minimizar o impacto deflacionário da economia mundial.
Para Carlos Langoni, esse stop and go das políticas macro dificultou o gerenciamento de expectativas.
"A redução dos juros pelo BC brasileiro a partir do 2º semestre de 2011 foi encarada com desconfiança, e hoje parece ter sido medida adequadamente", registra Langoni, mas se revelou insuficiente, porém, para impedir a "débâcle no crescimento", ainda que reforçada com estímulos fiscais seletivos.
A resposta da economia ao que Langoni chama de "ação anticíclica gradualista" tem sido lenta, em parte pela natureza das medidas, mas também pela onda pessimista vinda do exterior. Para ele, a demonstração da vulnerabilidade do sistema financeiro europeu levou os bancos privados brasileiros a adotar postura conservadora na concessão de empréstimos, especialmente para a pessoa física.
Langoni lembra a recente falência do Banco Cruzeiro do Sul, especializado em empréstimos consignados, teoricamente de risco mais baixo, como um "sinal objetivo" de que essa maior cautela fazia sentido.
No entanto, independentemente desses riscos, o governo acionou os bancos estatais, cuja oferta de crédito avançou 25% em abril: o dobro da média observada nas instituições privadas.
Carlos Langoni ressalta que essa postura ousada conta, implicitamente, com a proteção de mecanismos de recapitalização pelo Tesouro, que têm, entretanto, desdobramentos fiscais negativos.
Ao mesmo tempo, o consumo das famílias, "ainda que sustentado por ganhos reais de salário e beneficiado pela queda de juros reais", não tem força suficiente para elevar o crescimento potencial. Além disso, a alavancagem exagerada do crédito pode ser interrompida pelo recrudescimento das pressões inflacionárias.
No plano externo, a contribuição da balança comercial continuará a ser negativa. "O novo patamar da taxa de câmbio não foi suficiente para compensar a fraqueza da demanda externa e a queda no preço das commodities", analisa Langoni.
Com a aversão global ao risco, os fluxos de capitais vão se tornar cada vez mais seletivos e devem reagir negativamente à maior dosagem de intervencionismo estatal que vem sendo observada.
"A mudança do modelo não é tarefa simples, exigindo vontade e mobilização política para atacar questões estruturais que passam necessariamente pelo fragmentado Congresso Nacional", adverte Langoni, que prevê que o esgotamento da dinâmica do mercado interno precisará ser testado objetivamente no próximo ano: os cortes seletivos de impostos e a expansão forçada do crédito podem esbarrar nos limites impostos pela austeridade fiscal, pela inadimplência e pelas pressões inflacionárias.
"O sinal amarelo seria dado pela necessidade de o Banco Central voltar a elevar os juros a fim de evitar novo e elevado patamar dos preços."
Carlos Langoni lembra que a História brasileira ilustra que reformas só acontecem em momentos de crise aguda. "Ainda não chegamos a esse estágio", diz ele, sugerindo que o cenário de baixo crescimento poderá se estender por mais alguns anos.
Anteriormente, a partir do início da crise, em 2008, a China havia investido pesadamente em obras públicas, coisa que o Brasil ainda está para fazer.
A China começou este ano uma política de "pouso suave" num mundo em crise, preparando-se para um crescimento médio de 7% do PIB nacional, bem abaixo dos dois dígitos das últimas décadas, mas com metas que incluem promoção do consumo, redução das diferenças sociais pela melhoria do salário mínimo e eficiência energética.
Mais urbana que rural, a China, com seu 12 Plano Quinquenal, em vigor desde março do ano passado, tem o objetivo de fazer migrar seu padrão de desenvolvimento para indústrias avançadas e desenvolvimento tecnológico, em busca do que classifica de "harmonização da sociedade".
O economista Carlos Geraldo Langoni, ex-presidente do Banco Central do Brasil e atual diretor do Centro de Economia Mundial da FGV, analisa em recente trabalho que o Brasil, em contraste com a China, não tem capacidade de utilizar o investimento público como eficiente instrumento anticíclico.
Além das limitações orçamentárias, existem inúmeras restrições burocráticas "envolvendo regras rígidas de licitações e licenciamentos ambientais que retardam sobremaneira a execução de projetos essenciais para a modernização da infraestrutura".
Os investimentos públicos caíram cerca de 2,7% em termos reais neste 1º quadrimestre. Langoni destaca que, em alguns setores-chave, como energia e telecomunicações, novas exigências de conteúdo nacional elevam o custo e podem limitar a participação do setor privado.
Para o economista da Fundação Getulio Vargas, a alternativa seria flexibilizar essas regras, reduzir impostos e anunciar uma onda de concessões a fim de assegurar a retomada de um padrão de desenvolvimento liderado pelo investimento.
Embora a presidente Dilma, repetindo o que fizera seu inspirador político, o ex-presidente Lula, tenha afirmado em discurso recente que "quem aposta na crise, como há quatro anos, vai perder de novo", Langoni diz que os resultados são decepcionantes, mas não se constituem em grande surpresa nem em fato isolado.
A desaceleração dos países que ele classifica de superemergentes - China, Índia e Brasil - vem sendo observada a partir de março de 2010, sendo que a única exceção é a Rússia, devido ao comportamento, até há pouco tempo favorável, do preço do petróleo.
O baixo crescimento da economia brasileira, o menor entre os Brics e inferior à média mundial, alimenta o debate sobre a sustentabilidade do desenvolvimento.
O curioso, lembra Langoni, é que, na saída da recessão de 2008/2009, a preocupação era com a ameaça de superaquecimento e as pressões inflacionárias.
Políticas restritivas foram, então, implementadas, e, em alguns casos, como na China e no Brasil, houve êxito na reversão desses desequilíbrios.
O efeito colateral, entretanto, foi o esfriamento da demanda doméstica, e o aprofundamento da crise europeia em 2011 amplificou a desaceleração da atividade econômica, fazendo com que o foco da política macro mudasse novamente para ação preventiva, na tentativa de minimizar o impacto deflacionário da economia mundial.
Para Carlos Langoni, esse stop and go das políticas macro dificultou o gerenciamento de expectativas.
"A redução dos juros pelo BC brasileiro a partir do 2º semestre de 2011 foi encarada com desconfiança, e hoje parece ter sido medida adequadamente", registra Langoni, mas se revelou insuficiente, porém, para impedir a "débâcle no crescimento", ainda que reforçada com estímulos fiscais seletivos.
A resposta da economia ao que Langoni chama de "ação anticíclica gradualista" tem sido lenta, em parte pela natureza das medidas, mas também pela onda pessimista vinda do exterior. Para ele, a demonstração da vulnerabilidade do sistema financeiro europeu levou os bancos privados brasileiros a adotar postura conservadora na concessão de empréstimos, especialmente para a pessoa física.
Langoni lembra a recente falência do Banco Cruzeiro do Sul, especializado em empréstimos consignados, teoricamente de risco mais baixo, como um "sinal objetivo" de que essa maior cautela fazia sentido.
No entanto, independentemente desses riscos, o governo acionou os bancos estatais, cuja oferta de crédito avançou 25% em abril: o dobro da média observada nas instituições privadas.
Carlos Langoni ressalta que essa postura ousada conta, implicitamente, com a proteção de mecanismos de recapitalização pelo Tesouro, que têm, entretanto, desdobramentos fiscais negativos.
Ao mesmo tempo, o consumo das famílias, "ainda que sustentado por ganhos reais de salário e beneficiado pela queda de juros reais", não tem força suficiente para elevar o crescimento potencial. Além disso, a alavancagem exagerada do crédito pode ser interrompida pelo recrudescimento das pressões inflacionárias.
No plano externo, a contribuição da balança comercial continuará a ser negativa. "O novo patamar da taxa de câmbio não foi suficiente para compensar a fraqueza da demanda externa e a queda no preço das commodities", analisa Langoni.
Com a aversão global ao risco, os fluxos de capitais vão se tornar cada vez mais seletivos e devem reagir negativamente à maior dosagem de intervencionismo estatal que vem sendo observada.
"A mudança do modelo não é tarefa simples, exigindo vontade e mobilização política para atacar questões estruturais que passam necessariamente pelo fragmentado Congresso Nacional", adverte Langoni, que prevê que o esgotamento da dinâmica do mercado interno precisará ser testado objetivamente no próximo ano: os cortes seletivos de impostos e a expansão forçada do crédito podem esbarrar nos limites impostos pela austeridade fiscal, pela inadimplência e pelas pressões inflacionárias.
"O sinal amarelo seria dado pela necessidade de o Banco Central voltar a elevar os juros a fim de evitar novo e elevado patamar dos preços."
Carlos Langoni lembra que a História brasileira ilustra que reformas só acontecem em momentos de crise aguda. "Ainda não chegamos a esse estágio", diz ele, sugerindo que o cenário de baixo crescimento poderá se estender por mais alguns anos.
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