O grande desafio do novo presidente francês, François Hollande, será conciliar crescimento com controle da dívida e do déficit. Ele pode proclamar na Bastilha que a austeridade não é uma fatalidade, mas governará um país com 5% de déficit público e que saiu de 64% para 87% de dívida/PIB em três anos. As eleições mostraram uma aversão à atual política fiscal e monetária da Europa, que não tem sido resposta eficaz ao desemprego.
O pêndulo da França em direção à esquerda exige da Europa a procura de novas respostas para a crise econômica. O governo da Angela Merkel precisa reconhecer que a austeridade pura levou a Europa a um beco sem saída. E ela mesma começa a perder terreno. Seu partido teve mais uma derrota em eleições regionais.
Ampliar o gasto público em período de alto endividamento, déficit e desconfiança dos financiadores não é sustentável. Apenas cortar gasto público tem produzido um círculo vicioso de recessão-desemprego-perda de receitas. É preciso encontrar um terceiro caminho que concilie redução de desequilíbrios fiscais com aumento do investimento público. Neste aspecto, um novo líder na França, com ideias novas, pode ajudar a tornar o debate na comando da UE mais eficaz.
Hollande terá dias intensos daqui para a frente. A mais importante batalha foi iniciada ali mesmo na Bastilha: a campanha para ter maioria no parlamento e assim fazer um governo todo socialista. Se o partido de Sarkozy ganhar, a França será governada pelo sistema que eles chamam de coabitação. No regime francês, o presidente tem mais poder do que no parlamentarismo, mas o parlamento tem mais poder do que no presidencialismo. Neste regime semipresidencial, para que Hollande tenha realmente força para implantar seu programa a esquerda tem que ganhar de novo em junho.
Antes disso, Hollande terá o encontro com Angela Merkel, a posse e as reuniões de cúpula da OTAN e do G-8 nos Estados Unidos. Nesses encontros, o líder francês terá que dizer como pretende aumentar o emprego público, induzir o crescimento e manter as contas sob controle. Uma das formas pode ser um plano bancado pela União Europeia, de incentivo ao crescimento, que não signifique necessariamente aumento do endividamento nem a sinalização de explosão de gastos.
Certos pontos do seu programa podem ser tiro no pé. Ele propôs um aumento da alíquota do Imposto de Renda para quem ganha entre 1 milhão e 10 milhões e de 75% para quem ganha mais de 10 milhões. Falta explicar como cobrar uma alíquota como essa sem provocar fuga de capitais.
A eleição da esquerda na França pode ser um impulso importante para se encontrar uma fórmula que equacione a busca da queda do endividamento e do déficit que não seja apenas a austeridade. Há hoje na Europa uma fadiga das propostas de corte e ajuste fiscal, que não dão horizonte para a melhora econômica, e há uma síndrome que persegue os governantes sejam eles de que lado político forem.
Desde que começou a crise externa, já mudaram de governo os seguintes países: República Checa, Grécia, Eslováquia, Eslovênia, Finlândia, Irlanda, Portugal, Espanha, Dinamarca, Holanda, Itália, Reino Unido, Hungria, França. Em alguns países, mais de uma queda. A Bélgica ficou um enorme tempo sem governo. A Grécia está indo para a terceira queda e o quinto ano de recessão.
Os gregos são um caso limite de toda essa armadilha entre superendividamento e crescimento. O retrato que saiu das urnas mostra isso: espantosa fragmentação, recuo dos dois partidos que se alternam no poder há tempos, crescimento da extrema-esquerda e uma inédita representação do Partido Nazista no parlamento. Nas primeiras horas após o fim das eleições, não se conseguiu formar coalizão porque a Nova Democracia, de direita, e o Pasok, socialista, que sustentaram o governo de Lucas Papademos, conseguiram apenas 149 cadeiras e o mínimo é 151. Se não conseguirem apoio de um terceiro partido terá que haver nova eleição. O problema é que a Grécia tem recebido em pedaços aquele enorme pacote de ajuda. O FMI e a União Europeia só darão dinheiro ao governo se, primeiro, houver governo, e, segundo, se ele continuar implementando o programa negociado.
As bolsas que amanheceram em queda se recuperaram, exceto, evidentemente, a da Grécia. Na Espanha, o governo conservador de Mariano Raroy admitiu usar dinheiro público para socorrer o Bankia, terceiro maior banco do país, o que claramente contraria as ideias que defendeu quando derrubou o governo de José Luis Zapatero. Os jornais espanhóis estão falando que entre 7 bilhões e 10 bilhões seriam necessários para sanear o banco, que é o mais exposto aos empréstimos podres da bolha imobiliária. O problema é que pode não ser o último. Imagine o sentimento do jovem espanhol, que enfrenta um desemprego acima de 50%, vendo o governo investir tanto dinheiro para salvar um banco. Difícil explicar que bancos quando quebram podem provocar um colapso na economia para quem já acha que vive em meio ao colapso.
A situação da Europa continua difícil, mas desde este fim de semana a França começa a liderar uma nova resposta. Que Hollande tenha na economia a sabedoria que mostrou na política quando uniu o partido e levou-o à vitória.
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