FOLHA DE SP - 08/05/12
SÃO PAULO - O "Equilíbrio" de hoje mostra a dificuldade que é conseguir uma doação de óvulo no Brasil. O problema tem uma solução simples, óbvia e quase certamente eficaz -modificar a lei para permitir que a doadora seja paga-, mas que, por uma mistura de hipocrisia com intuições morais difíceis de justificar racionalmente, preferimos ignorar.
Ora, se o médico e a sua equipe podem ser remunerados quando fazem um procedimento de fertilização "in vitro", se a clínica, os laboratórios e as farmácias também ganham, por que só o doador deve ser excluído dos lucros? Se é o altruísmo que deve animar o processo, por que não aplicá-lo a todas as partes envolvidas?
E, já que sujeira pouca é bobagem, não vejo motivo para pararmos nos óvulos. Deveríamos autorizar também a comercialização de rins e partes do fígado, além de pagar às famílias de acidentados em morte cerebral que autorizem a retirada de seus órgãos, assim como o SUS já remunera o hospital que faz o procedimento.
É claro que o mercado precisaria ser regulado com cuidado, para evitar o risco de apenas pessoas ricas conseguirem o transplante. Mas isso é perfeitamente factível. Um exemplo: não precisamos "privatizar" todo o sistema. Admitir doações intervivos mediante pagamento não implica pôr fim à atual rotina pela qual os órgãos de cadáveres são distribuí-dos por meio de uma lista pública.
Outra objeção frequente é a de que uma pessoa com dificuldades econômicas se veria compelida a vender uma parte de si mesma, no que configuraria uma espécie de extorsão orgânica. Falácia. Muita gente passa por constrangimentos financeiros, mas não sai por aí roubando, se prostituindo ou vendendo pedaços do corpo no mercado negro.
Ainda que muitos ficassem tentados a vender rins, não vejo por que tirar-lhes o direito de decidir por si mesmos, o que, de resto, teria como subproduto a melhora da qualidade de vida de milhares de pacientes.
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