O GLOBO - 04/05/12
Não foi por acaso que seis organizações representativas da imprensa privada em países da América do Sul soltaram uma nota denunciando ataques à liberdade de expressão no Dia Internacional da Liberdade de Imprensa. A situação atual na região mostra o paradoxo de governos democráticos criarem obstáculos à liberdade de expressão.
Dissemina-se pela região um movimento de contenção da liberdade de imprensa em diversos países onde TVs, rádios e jornais vão sendo fechados sob os mais variados pretextos, e muitos outros são ameaçados com diversas formas de pressão, seja financeira, seja através de medidas judiciais.
A nota das entidades ressalta essa questão financeira como parte de movimento coordenado de criação de um mecanismo "de prêmio e castigo", que gera a criação em diversos países de uma imprensa "oficial e paraoficial" financiada pelos governos para deslegitimar as visões críticas e criar uma "cultura da intolerância" em relação aos órgãos de imprensa independentes. Uma prática principalmente em vigor no Brasil e na Argentina, onde os governos montaram um aparato midiático financiado pelo dinheiro público. Os representantes dos seis países - Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Equador e Peru - preferiram não especificar as denúncias, tratando o assunto como uma questão regional, o que de certa forma dá uma dimensão mais grave aos problemas enfrentados, dando-lhes o caráter de uma orquestração política.
O amadurecimento democrático no Brasil nos torna uma exceção em um continente cada vez mais dominado por governos autoritários ou simples ditaduras.
As ações recentes do governo da Argentina contra o grupo jornalístico Clarín, o maior do país, cuja fábrica de papel foi expropriada pelo governo como de interesse público, citadas na nota, fazem parte de uma já longa disputa pelo controle da informação pelo governo de Cristina Kirchner, prosseguindo o projeto que foi iniciado no governo de seu falecido marido, Nestor Kirchner.
Uma tentativa de cercear a liberdade de imprensa que é jogada em todos os níveis, empresariais e jornalísticos. Outro caso exemplar é o do Equador, onde os diretores do jornal "El Universo" e o jornalista e ex-editorialista Emilio Palacio foram condenados por um tribunal a pagar nada menos que US$ 40 milhões por supostos danos morais ao presidente do Equador, Rafael Correa.
O absurdo do valor da pena demonstra uma intenção de desencorajar novos artigos críticos. A Organização dos Estados Americanos (OEA) exigiu que o presidente equatoriano voltasse atrás no processo, e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos emitiu medidas cautelares para impedir a execução da sentença contra o jornal "a fim de garantir a liberdade de expressão".
Pressionado pela péssima repercussão internacional, o presidente Correa anunciou seu perdão, acusando no entanto a existência de uma "ditadura" dos meios de comunicação. No Brasil, coube à presidente Dilma Rousseff baixar a temperatura desse debate ao não encampar o chamado "controle social da mídia", que era proposto como uma política oficial de governo na gestão de Lula.
Mas, mesmo assim, ainda enfrentamos ameaça à liberdade de expressão, que se configura de diversas maneiras. No momento, ela se revela na tentativa, frustrada de início, de levar a grande imprensa representada pela revista "Veja" à investigação na CPI do Cachoeira.
Os documentos surgidos até o momento, no entanto, nada revelam de transgressor no comportamento de seus profissionais, e todas as pseudoacusações se baseiam mais em ilações tiradas de versões do bicheiro e de seus asseclas do que em fatos comprovados.
Essa foi apenas, porém, mais uma das muitas tentativas desse mesmo grupo político de cercear a liberdade de expressão no país, tarefa a que se dedicam com afinco seus componentes desde que chegaram ao poder.
No início do governo Lula, propôs-se a criação de várias agências oficiais, como a de cinema e audiovisual, que daria condições ao governo de interferir na programação da televisão e tentar direcionar o financiamento de filmes e toda a produção cultural para temas em sintonia com as metas sociais do governo.
O Conselho Nacional de Jornalismo, com o objetivo de controlar o exercício da profissão, teria poderes para punir, até mesmo com a cassação do registro profissional, os jornalistas que infringissem normas de conduta que seriam definidas pelo próprio conselho.
A nota oficial dos jornais independentes se refere ao "assédio judicial e administrativo" como ferramenta para limitar a livre circulação de informações na região. É o que também acontece no Brasil.
Sob o pretexto de exercer um controle social sobre os meios de comunicação, vários estados já aprovaram a criação de conselhos para acompanhar os meios de comunicação, e a executiva do Partido dos Trabalhadores decidiu que uma das prioridades do partido é o que chamade "democratização da comunicação".
Há também uma legislação retrógrada que permite a censura prévia e uma prática cada vez mais perversa de pressionar financeiramente os meios de comunicação com processos, sob os mais variados pretextos.
A impunidade característica dos sistemas judiciais desses países, em especial o Brasil e o México, faz também com que aumentem as ações violentas contra jornais e jornalistas na região, tendo ocorrido nada menos que 29 mortes no ano de 2011.
O importante dessa nota é que todos esses países têm em comum, com exceção do Brasil, uma ação permanente do Estado para subjugar os demais poderes.
A força de seus Executivos é tamanha que se aproxima de uma ditadura, podendo ser classificada de um hiperpresidencialismo, onde todos os poderes estão subjugados ao presidente da República.
A diferença para a ditadura, segundo os estudiosos, é justamente a existência de uma imprensa livre, o que nesses países está cada vez mais a perigo.
No Brasil, mesmo com o Executivo tendo muita força, o governo tem uma maioria esmagadora no Congresso, e o PT já nomeou oito dos 11 ministros do Supremo - não houve até o momento nenhum avanço antidemocrático para controlar o Judiciário nem o Legislativo, embora o escândalo do mensalão seja um ponto fora da curva nesse respeito à democracia, e por isso tão grave.
Dissemina-se pela região um movimento de contenção da liberdade de imprensa em diversos países onde TVs, rádios e jornais vão sendo fechados sob os mais variados pretextos, e muitos outros são ameaçados com diversas formas de pressão, seja financeira, seja através de medidas judiciais.
A nota das entidades ressalta essa questão financeira como parte de movimento coordenado de criação de um mecanismo "de prêmio e castigo", que gera a criação em diversos países de uma imprensa "oficial e paraoficial" financiada pelos governos para deslegitimar as visões críticas e criar uma "cultura da intolerância" em relação aos órgãos de imprensa independentes. Uma prática principalmente em vigor no Brasil e na Argentina, onde os governos montaram um aparato midiático financiado pelo dinheiro público. Os representantes dos seis países - Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Equador e Peru - preferiram não especificar as denúncias, tratando o assunto como uma questão regional, o que de certa forma dá uma dimensão mais grave aos problemas enfrentados, dando-lhes o caráter de uma orquestração política.
O amadurecimento democrático no Brasil nos torna uma exceção em um continente cada vez mais dominado por governos autoritários ou simples ditaduras.
As ações recentes do governo da Argentina contra o grupo jornalístico Clarín, o maior do país, cuja fábrica de papel foi expropriada pelo governo como de interesse público, citadas na nota, fazem parte de uma já longa disputa pelo controle da informação pelo governo de Cristina Kirchner, prosseguindo o projeto que foi iniciado no governo de seu falecido marido, Nestor Kirchner.
Uma tentativa de cercear a liberdade de imprensa que é jogada em todos os níveis, empresariais e jornalísticos. Outro caso exemplar é o do Equador, onde os diretores do jornal "El Universo" e o jornalista e ex-editorialista Emilio Palacio foram condenados por um tribunal a pagar nada menos que US$ 40 milhões por supostos danos morais ao presidente do Equador, Rafael Correa.
O absurdo do valor da pena demonstra uma intenção de desencorajar novos artigos críticos. A Organização dos Estados Americanos (OEA) exigiu que o presidente equatoriano voltasse atrás no processo, e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos emitiu medidas cautelares para impedir a execução da sentença contra o jornal "a fim de garantir a liberdade de expressão".
Pressionado pela péssima repercussão internacional, o presidente Correa anunciou seu perdão, acusando no entanto a existência de uma "ditadura" dos meios de comunicação. No Brasil, coube à presidente Dilma Rousseff baixar a temperatura desse debate ao não encampar o chamado "controle social da mídia", que era proposto como uma política oficial de governo na gestão de Lula.
Mas, mesmo assim, ainda enfrentamos ameaça à liberdade de expressão, que se configura de diversas maneiras. No momento, ela se revela na tentativa, frustrada de início, de levar a grande imprensa representada pela revista "Veja" à investigação na CPI do Cachoeira.
Os documentos surgidos até o momento, no entanto, nada revelam de transgressor no comportamento de seus profissionais, e todas as pseudoacusações se baseiam mais em ilações tiradas de versões do bicheiro e de seus asseclas do que em fatos comprovados.
Essa foi apenas, porém, mais uma das muitas tentativas desse mesmo grupo político de cercear a liberdade de expressão no país, tarefa a que se dedicam com afinco seus componentes desde que chegaram ao poder.
No início do governo Lula, propôs-se a criação de várias agências oficiais, como a de cinema e audiovisual, que daria condições ao governo de interferir na programação da televisão e tentar direcionar o financiamento de filmes e toda a produção cultural para temas em sintonia com as metas sociais do governo.
O Conselho Nacional de Jornalismo, com o objetivo de controlar o exercício da profissão, teria poderes para punir, até mesmo com a cassação do registro profissional, os jornalistas que infringissem normas de conduta que seriam definidas pelo próprio conselho.
A nota oficial dos jornais independentes se refere ao "assédio judicial e administrativo" como ferramenta para limitar a livre circulação de informações na região. É o que também acontece no Brasil.
Sob o pretexto de exercer um controle social sobre os meios de comunicação, vários estados já aprovaram a criação de conselhos para acompanhar os meios de comunicação, e a executiva do Partido dos Trabalhadores decidiu que uma das prioridades do partido é o que chamade "democratização da comunicação".
Há também uma legislação retrógrada que permite a censura prévia e uma prática cada vez mais perversa de pressionar financeiramente os meios de comunicação com processos, sob os mais variados pretextos.
A impunidade característica dos sistemas judiciais desses países, em especial o Brasil e o México, faz também com que aumentem as ações violentas contra jornais e jornalistas na região, tendo ocorrido nada menos que 29 mortes no ano de 2011.
O importante dessa nota é que todos esses países têm em comum, com exceção do Brasil, uma ação permanente do Estado para subjugar os demais poderes.
A força de seus Executivos é tamanha que se aproxima de uma ditadura, podendo ser classificada de um hiperpresidencialismo, onde todos os poderes estão subjugados ao presidente da República.
A diferença para a ditadura, segundo os estudiosos, é justamente a existência de uma imprensa livre, o que nesses países está cada vez mais a perigo.
No Brasil, mesmo com o Executivo tendo muita força, o governo tem uma maioria esmagadora no Congresso, e o PT já nomeou oito dos 11 ministros do Supremo - não houve até o momento nenhum avanço antidemocrático para controlar o Judiciário nem o Legislativo, embora o escândalo do mensalão seja um ponto fora da curva nesse respeito à democracia, e por isso tão grave.
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