quarta-feira, maio 09, 2012

Chance de ajuste - MIRIAM LEITÃO


O GLOBO - 09/05/12


As contas do governo continuam fechando da mesma forma. Com a ajuda de uma arrecadação maior do que a inflação e com um pequeno déficit coberto por mais endividamento. No primeiro trimestre, as receitas cresceram 8,3% em relação ao mesmo período do ano passado, já descontada a inflação. O governo gastou 5,8% a mais, também descontando a inflação. Mesmo assim, ninguém espera que o ano termine em azul.

As previsões são de que o governo deve gastar este ano 7% a mais do que no ano passado, que já teve um aumento de 3,5% em relação a 2010. Levando-se em conta que o PIB em 2011 cresceu 2,7% e este ano deve crescer em torno de 3,5%, o governo continua aumentando seu gasto acima do crescimento da economia, como tem ocorrido desde 1995, com raras exceções, como a do ano de 2003. É por isso que a conta só fecha com aumento da carga tributária.

Prisioneiro dessa armadilha, o governo sempre promete - e nunca cumpre - fazer a reforma tributária. O temor é o de reduzir os impostos para quem está pagando excessivamente e, como isso, ficar sem dinheiro suficiente em caixa para cobrir seus gastos crescentes.

Num mundo de déficits gigantescos, o Brasil parece muito bem. Muito bem mesmo. Mas é bom lembrar que ele fecha no vermelho todos os anos. O déficit nominal - que inclui o gasto com juros - consolidado fechou no negativo em 2,6% do PIB em dezembro e continuou no vermelho em 2,4% em março. Essa pequena melhora é resultado do aumento da arrecadação. De janeiro a março, a receita do Imposto de Renda da Pessoa Física aumentou 9,65%. A da Pessoa Jurídica subiu 12,75%. Já a Cide, imposto que incide sobre combustíveis, e cuja alíquota foi reduzida para evitar o aumento da gasolina, teve uma queda de arrecadação de 42%.

O que esses números mostram é que o governo não faz qualquer mudança relevante nas sua forma de cobrar impostos e gastar suas receitas. Continua a mesma marcha da insensatez, que é gastar cada vez mais, contar com o aumento da arrecadação, e dar descontos em alguns impostos por razões absolutamente conjunturais e casuísticas, como no caso da Cide.

Em março, as despesas cresceram 11% em relação ao mesmo mês do ano passado. No primeiro trimestre, houve uma desaceleração no ritmo de gastos. No ano passado, neste mesmo período, haviam crescido 27% em relação ao ano anterior. Agora, subiram 15,6%. Mas quando se analisa a despesa, dá para ver que as escolhas são erradas: o gasto com subsídio cresceu 60%, os de custeio subiram 5,7%.

Comparado com outros países, o Brasil está bem em suas contas. A dívida bruta ficou em 56,3% do PIB em março. Mas em dezembro estava em 54%. Entre as razões para esse aumento, segundo o Banco Central, está o endividamento da União para fazer aportes no BNDES. É a mesma história: o governo se endivida, repassa ao BNDES, que empresta a juros abaixo do que o Tesouro pagará pelo título. E se os jornalistas quiserem saber mais sobre esses empréstimos têm que entrar na Justiça.

Atualmente há uma janela de oportunidade importante que não deveria ser desperdiçada. Os juros estão sendo reduzidos e, portanto, a dívida do governo está ficando mais barata. Segundo o economista Felipe Salto, da Tendências Consultoria, R$ 30 bilhões a menos devem ser gastos este ano com a queda da Selic. É mais fácil, assim, ter o objetivo de zerar o déficit nominal, que havia sido a proposta feita pelos ministros da Fazenda e Planejamento, Antonio Palocci e Paulo Bernardo, em 2005. A proposta, rechaçada pela então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, continua sendo boa e deveria ser perseguida. A vantagem é que com juros baixos é mais fácil atingir.

Sem a necessidade de lançar novos papéis para cobrir o déficit a cada ano, o governo poderá reduzir ainda mais os juros, como deseja. Tudo está pronto para o equilíbrio das contas: arrecadação aumentando e juros caindo. Uma boa hora para mudar a maneira como o governo gasta sua receita e como cobra os impostos, a chamada reforma fiscal.

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