FOLHA DE SP - 08/04/12
Preço da eletricidade torna a indústria menos competitiva; redução depende de cortes em tarifas e tributos que a Presidência reluta em tocar
A perda de competitividade da indústria brasileira decorre de uma miríade de fatores, em especial do custo dos tributos, da infraestrutura precária e da burocracia tributária e trabalhista.
Há um elemento adicional, porém, em que o Brasil se destaca muito do restante do mundo: o preço da energia, que representa parcela relevante dos custos das empresas, em particular na indústria.
Segundo estudo da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), a tarifa industrial de consumo de energia alcança, em média, R$ 329 por megawatt-hora (MWh), 53% acima da média global. Nos EUA, por exemplo, a tarifa fica em R$ 117,4 por MWh.
É um paradoxo. A matriz energética brasileira se baseia na eficiente geração hidrelétrica, e muitas das usinas geradoras são antigas, já amortizaram o investimento. Mas essa vantagem potencial não alcança o consumidor.
Para deslindar a questão, é preciso considerar a composição da tarifa elétrica. Segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), a somatória de geração, transmissão e distribuição (GTD) representa, em média, 63% do valor final. Desses 63%, metade corresponde à geração.
Os 37% restantes decorrem de impostos (26%) e de vários encargos setoriais (11%). Muitos desses encargos são anacrônicos, pois se esgotaram os motivos de sua criação (como a contribuição para o programa Luz para Todos, extinto).
Os principais impostos são PIS/Cofins e ICMS, com alíquotas de 9,35% e 25%, respectivamente, em média. No caso do ICMS, há a aberração adicional de cobrar o imposto "por dentro", ou seja, com inclusão do tributo na própria base de cálculo: numa área com alíquota de 25%, o impacto real do imposto resulta em 33%.
Há duas formas principais de reduzir o custo da energia: cortar preços de GTD, de um lado, e os encargos e impostos, de outro.
O estudo da Firjan aponta que, para alcançar padrões internacionais, o custo de GTD precisaria cair 35%. O vencimento de numerosas concessões -em 2015 expiram contratos de cerca de 22% do parque de geração, 60% da transmissão e quase todas as distribuidoras estatais- em tese oferece uma oportunidade para a redução de valores.
Ela não será significativa, porém -não na velocidade necessária. Mesmo que o governo zerasse as tarifas de geração e transmissão das concessões renovadas, a diminuição máxima possível do preço final seria de apenas 10%.
Eis um cálculo simples: a geração representa 31% da tarifa, e vencerão 22% das concessões de geradoras; no caso hipotético de tarifa zerada, a redução seria de, no máximo, 6,8% (31% de 22%). A mesma conta resultaria em 3% de corte pelo lado da transmissão.
Na prática, a redução da tarifa será bem menor que isso, pois o governo parece trabalhar com uma queda no preço de, no máximo, 30%, com vistas a preservar a capacidade de investimento das empresas geradoras, especialmente da Eletrobras.
Além disso, o custo de novas usinas não é baixo. Fontes alternativas de energia térmica e biomassa, além das novas hidrelétricas, vendem energia a preços médios próximos de R$ 100 por megawatt.
Do lado da distribuição, a revisão periódica de tarifas deve resultar em redução mais significativa neste ano. Os ganhos de produtividade e a diminuição da estimativa de custo de capital aplicada pela Aneel podem permitir, em alguns casos, um recuo de cerca de 10% no valor final.
Parece viável pensar, portanto, em cortes de 10% a 20% nos preços de GTD nos próximos anos. Traria um benefício real, mas ainda insuficiente.
Para que haja queda mais sensível, em prazo razoável, é preciso contemplar os impostos. E, nesse caso, o alvo principal é o ICMS.
Há resistência natural dos governos dos Estados a reduzir o ICMS, pois as concessões públicas, como energia e telefonia, contribuem com parcela significativa de sua arrecadação. Mas, tal como no caso de GTD, também se avizinha uma oportunidade para aliviar o peso dos impostos.
Estão em debate no Congresso a divisão dos royalties do pré-sal, as mudanças nas alíquotas interestaduais do ICMS (para conter a guerra fiscal) e uma nova fórmula de partilha do Fundo de Participação dos Estados. Além disso, os governadores (com razão) querem renegociar os juros que incidem nas dívidas com a União, defasados após sucessivas reduções da taxa básica pelo Banco Central.
São assuntos aparentemente desconexos, mas que se encontram no tema da divisão de receitas entre os entes federativos.
A presidente Dilma Rousseff, neste segundo ano de mandato e gozando de alta aprovação, deveria liderar um debate nacional sobre a melhor forma de cortar esse nó górdio e dotar o país da energia e dos tributos na justa medida para sustentar o crescimento.
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