Dois homens tramam um assalto.
– Valeu, mermão? Tu traz o berro que nóis vamo rendê o caixa bonitinho. Engrossou, enche o cara de chumbo. Pra arejá.
– Podes crê. Servicinho manero. É só entrá e pegá.
– Tá com o berro aí?
– Tá na mão.
Aparece um guarda.
– Ih, sujou. Disfarça, disfarça...
O guarda passa pelos dois, que fingem estar discutindo.
– Discordo terminantemente. O imperativo categórico de Hegel chega a Marx diluído pela fenomenologia de Feurbach.
– Pelo amor de Deus! Isso é o mesmo que dizer que Kierkegaard não passa de um Kant com algumas sílabas a mais. Ou que os iluministas do século 18...
O guarda se afasta.
– O berro tá recheado?
– Tá.
– Então vamlá!
Desejável
– Meu bem...Você está deslumbrante!
– Tudo para você, querido.
– Esse penteado...
– Fui ao cabelereiro e pedi um corte novo para o meu maridinho me achar desejável. Fui ao maquiador e pedi que me deixasse bem bonita e sexy para atrair meu maridinho. Comprei esta camisola provocante para enlouquecer você.
– E conseguiu, meu amor. Você está...
– Não me toca senão estraga tudo!
O encontro
Um homem livra-se de todos os seus bens materiais, abandona a família e vai viver no deserto. Leva o suficiente para sobreviver no deserto durante um ano. Não fazendo nada, só olhando o sol de dia e as estrelas à noite. Quer se encontrar com Deus e não quer nada à sua volta. Nada que distraia sua atenção, nada que confunda sua visão no caso de Deus aparecer. E o deserto é nada para todos os lados. Nada de horizonte a horizonte.
Mas de tanto olhar o sol e examinar os horizontes esperando ver Deus, o homem fica cego. É socorrido e levado para um hospital numa cidade grande, e, incapaz de ver o que o cerca e distinguir o sono da escuridão da cegueira, mergulha em si mesmo – e encontra Deus, que o recebe com um “alô” amistoso.
– Eu queria muito encontrá-lo – diz o homem.
– Eu sei, eu sei.
– Fui procurá-lo no deserto, despojado de tudo, livre da civilização...
– Pois é, foi no lugar errado. Acontece muito. Eu estava aqui todo este tempo.
– Esperei você em vão.
– Para dizer a verdade, não gosto muito de lugares ermos. A gente começa a pensar demais, a se auto-questionar... E a solidão? Prefiro lugares onde há gente e movimento. Bom é civilização.
– Mas ninguém se lembra de procurar você dentro de si.
– Pois é. Querem espetáculo. Visões no deserto. Epifanias. Conversões cinematográficas. Não é o meu estilo.
– Mas...
– Vê se dorme um pouco. Amanhã a gente conversa. Agora você sabe onde me encontrar.
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