Bombeiros
REGINA ALVAREZ
O GLOBO - 05/11/11
Os analistas estão divididos sobre os resultados da cúpula, mas a sensação que prevalece é de frustração. A reunião foi completamente ofuscada pela crise do euro e pela decisão da Grécia de submeter o pacote de resgate a um referendo popular.
A pauta original do G-20 foi colocada de lado para que os líderes do bloco pudessem atuar como bombeiros da crise grega. A reação forte atingiu o objetivo de fazer os gregos caírem na real. Ou aceitam o pacote de ajuste duro imposto pelo bloco europeu, em troca da renegociação da dívida, ou deixam a zona do euro.
Mas todo esse estresse causado pela Grécia durante o encontro de cúpula serviu para ressaltar a gravidade da crise na zona do euro e como a solução ainda está distante. O economista Antonio Correa de Lacerda, da PUC-SP considera que a reunião teve um resultado razoável no combate à crise, na medida que a situação da Grécia foi equacionada, mas destaca que há um longo caminho a percorrer.
- O encaminhamento da questão grega vai abrir espaço para a recuperação da economia. Mas o quadro é ainda de muita incerteza. O problema da Europa está longe de uma solução. Não está claro, por exemplo, como o fundo de resgate será fortalecido com aporte de recursos.
O economista Marcelo Toledo, do Bradesco, diz que o mercado já estava cético em relação aos resultados do encontro. Pelo que viu acontecer durante a semana, o mercado já não contava que da Cúpula do G-20 pudesse sair grandes decisões sobre a crise. A possibilidade de um acordo concreto sobre a ajuda do FMI , incluindo o montante de recursos, surgiu ontem nos bastidores, mas não se concretizou. A reação positiva veio com a notícia de que a Itália será monitorada pelo FMI.
- Acho que o mercado está cético. Não acredito que os países emergentes conseguirão chegar tão cedo a um acordo para ampliar a capacidade do FMI e ajudar a zona do euro - prevê.
Retrato argentino I
O economista Fernando Montero, da Convenção Corretora, traçou um perfil da economia argentina que ajuda a entender os desequilíbrios do vizinho e as medidas duras adotadas por Cristina Kirchner - restrição à compra de dólares e corte de subsídios - logo após uma vitória avassaladora nas urnas. O gráfico abaixo exibe a trajetória dos gastos e das receitas tributárias nacionais do setor público não financeiro. O país saiu da crise em 2002 com carga de 16,1% do PIB. Nos nove anos do casal K no poder, esta passou a 29,1% do PIB, com alta de 80% da receita tributária. O PIB acumulou expansão de 92%, com média anual de 7,5%, o que elevou a arrecadação real de tributos em 246%.
Retrato argentino II
Só que no governo de Néstor Kirchner os gastos cresciam sobre receitas genuínas, explica Montero. Havia superávits fiscal e comercial, câmbio desvalorizado e inflação baixa. Sob Cristina, a partir de 2008, as receitas caíram, mas mantiveram-se os gastos elevados. Ocupação da ociosidade na indústria, alta nas commodities e câmbio ainda elevado pressionaram a inflação. Para controlá-la, o governo começou a subsidiar fortemente os serviços públicos, maquiar índices e atrasar o câmbio. Agora a Argentina enfrenta o problema de commodities mais baixas, o que deprime uma fonte importante de dólares e de receitas fiscais. O crescimento menor do Brasil também afeta as exportações argentinas.
- O país terá de depreciar o câmbio real e remover subsídios, o que alimentará uma inflação já muito elevada numa economia aquecida. Precisará moderar gastos e a moeda - recomenda Montero.
Nenhum comentário:
Postar um comentário