Fracassou
CELSO MING
O ESTADÃO - 05/11/11
A pauta, pormenorizadamente preparada ao longo de todo um ano pelo governo da França, que presidiu e sediou o encontro, foi atropelada dois dias antes pelo turbilhão da área do euro, que ameaçou mandar para o espaço um pedaço enorme da economia mundial. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, desembarcou em Cannes, onde se realizou o evento, e logo tratou de advertir que o principal objetivo era construir uma porta corta-fogo para impedir a propagação da crise do bloco do euro - primeiramente, dentro dele mesmo e, depois, para o resto do mundo.
Esse projeto consistiria em elevar recursos que se destinassem a socorrer países à beira do precipício - casos hoje da Grécia e, também, da Itália e da Espanha. A ideia anterior, de que outras economias bombassem dinheiro diretamente para o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF), foi barrada na entrada por duas razões: primeira, porque nem os próprios europeus definiram como o EFSF seria alavancado para que pudesse operar como se tivesse 1,3 trilhão de euros; e, segunda, porque os europeus (especialmente os alemães) não querem aumentar suas contribuições e, nessas condições, não podem desejar que emergentes e outras potências de fora façam o que eles não pretendem fazer.
A outra proposta, de expandir a capacidade de intervenção do Fundo Monetário Internacional (FMI), ficou para ser examinada em outra oportunidade.
Assim, o único avanço obtido no sentido de instalar uma porta corta-fogo foi o compromisso assumido "voluntariamente" pelo primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, de submeter trimestralmente as finanças da Itália à auditoria do FMI. Não deixa de ser um jeito de incutir a credibilidade que hoje falta na saúde das contas públicas italianas. Mas seria ótimo se simples monitoramentos bastassem para consertar rombos assustadores.
No mais, foi um amontoado de palavras ditas e depois resumidas no comunicado: "Concordamos com um plano de ação pelo crescimento econômico e criação de empregos. com aumentar esforços para fortalecer a segurança das finanças globais. com aumentar a regulação das instituições financeiras paralelas (shadow banking).". E foram por aí.
Alguns dirigentes, como a nossa presidente Dilma Rousseff, procuraram alertar que o ajuste fica mais difícil sem crescimento econômico. Daí por que não se pode insistir em sacrifícios fiscais excessivos. Certíssimo. Mas como se faz isso? De que modo garantir investimentos e crescimento da renda, se os Tesouros nacionais estão quebrados e o avanço do endividamento ficou insustentável? A resposta é que a saída talvez seja emitir moeda e admitir certa inflação, cujo efeito seria provocar erosão das dívidas. Mas coisas assim não vão para os comunicados.
Na prática, sob convulsões, a encrenca europeia continua sobre o colo dos europeus, de onde não saiu, embora alguns esperassem que os maiorais do mundo talvez pudessem tirar algum coelho de suas cartolas.
CONFIRA
Não pode falir. Entre as poucas novidades acertadas nesta última cúpula do G-20 está a elaboração de uma lista de bancos que serão objeto de supervisão e acompanhamentos especiais por não poderem mais ser considerados grandes demais para quebrar (too big to fail). A ideia é de que nunca mais se repita o caso Lehman Brothers, que atirou a economia mundial no pânico quando afundou, em setembro de 2008.
E o Lehman Brothers? A grande ironia dessa lista é a de que, se ainda estivesse em operação, o Lehman Brothers provavelmente não estaria lá. Quando quebrou, era apenas o quinto maior banco de investimentos dos Estados Unidos. E, no entanto, produziu o estrago conhecido.
Lista incompleta? Essa observação sugere que a operação blindagem não alcança um grande número de instituições financeiras também capazes de produzir grandes convulsões financeiras se acabarem quebrando
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