Público e privado, condenável simbiose
MARIA CLARA R. M. DO PRADO
VALOR ECONÔMICO - 20/10/11
Se fosse hoje, Dinho poderia incluir como exemplo do poder das oligarquias a decisão tomada pela Assembléia do Maranhão de transferir para a Secretaria de Educação do Estado a Fundação José Sarney, em claro exemplo de interesse privado que passa a ser absorvido pelo setor público.
Renato Russo escreveu a célebre música em 1978. De lá para cá, o que se vê é o acúmulo de descalabros no governo, em todas as três esferas de administração.
O poder executivo federal conta hoje com 37 ministérios, um exagero desnecessário que é justificado pela necessidade de sustentar o processo democrático em governo de coalizão. Cada partido político da base governista demanda postos e poder e os cargos do chamado primeiro escalão vão proliferando. Quanto mais ministérios houver, maior é a possibilidade de desvio do dinheiro público pela dificuldade de controle e de fiscalização. Não é à toa que têm crescido as suspeitas de atos de corrupção na máquina pública. E isso parece geral porque a "boa-vontade" dos governantes com os representantes dos partidos aliados se reproduz nos governos estaduais e municipais.
O "apadrinhamento" se estende aos postos de destaque nas agências reguladoras e nas empresas estatais, tornando-as ineficientes, com larga possibilidade de estarem a serviço dos interesses pessoais e não públicos.
As pessoas se escandalizam, mas a questão não tem sido devidamente estudada, com a profundidade que merece. Fernando de Holanda Barbosa, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), além dos temas mais em evidência, como os da política cambial e da política monetária, tem chamado a atenção para a necessidade de manter o setor público sob controle. "O aumento da taxa de crescimento do produto potencial brasileiro depende de uma reforma que torne o estado eficiente na provisão de educação, saúde, segurança pública e justiça, e libere recursos para aumentar os investimentos públicos", diz ele, sugerindo uma reforma que comece pela extinção de cargos de ministros do governo federal e de secretários nos estados e municípios.
Os gastos com a Fundação José Sarney serão, claro, cobertos com taxas e impostos pagos pelo povo maranhense. Não se tem ideia a quanto isso montará. Cabe à população local levantar a causa para descobrir o valor que vai afetar o bolso dos contribuintes. Será preciso dinheiro não apenas para manter a Fundação, mas também para a construção do túmulo do homenageado, algo que está incluído na decisão da Assembleia do estado. Apenas se desconhece se será uma simples sepultura ou um panteão.
O governo federal tem conseguido manter dentro do previsto os resultados de suas contas graças à crescente e altíssima carga da receita fiscal. Mesmo assim, não se pode despregar as vistas dos números oficiais, divulgados todo o mês. Vale destacar o aumento significativo que vem afetando o estoque da dívida pública federal. Os últimos dados mostram que a dívida interna alcançou o valor de R$ 2,4 trilhões na posição de final de agosto deste ano, bem acima dos R$ 1,7 trilhão apurado em dezembro de 2008 e dos R$ 838 milhões contabilizados em dezembro de 2002. Isso significa que toda a grandiosa carga tributária não tem sido suficiente para cobrir as despesas que, obviamente, só crescem. O governo precisa ir ao mercado para captar dinheiro, na forma de endividamento, para enfrentar as despesas que excedem a arrecadação.
Casos como o da Fundação José Sarney são, espera-se, contabilizados no rol dos gastos públicos. Ocorre que outros tipos de despesas não formais, nem oficiais, como os desvios de recursos públicos, passam ao largo da contabilidade. Ninguém tem ideia do montante. Recentemente, a Fiesp realizou um estudo onde estima entre R$ 41,5 bilhões e R$ 69,1 bilhões o valor da corrupção no país. A margem entre os números do estudo é muito larga e não por acaso. Em verdade, é difícil descobrir a quanto isso chega. Nem adiantaria sair com lápis e papel na mão a perguntar a todos os funcionários do governo se desviam dinheiro público e quanto seria isso. As respostas, obviamente, não seriam confiáveis!
Maria Clara R. M. do Prado, jornalista, é sócia diretora da Cin - Comunicação Inteligente e autora do livro "A Real História do Real".
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