Biotecnologia - limites e oportunidades
ANTÔNIO M. BUAINAIN e JOSÉ M. DA SILVEIRA
O ESTADÃO - 04/10/11
Uma nova etapa da biotecnologia vegetal está para ser inaugurada: no dia 15 de setembro foi aprovado o primeiro cultivar geneticamente modificado (GM) direcionado a um produto de alimentação humana in natura e que integra a cesta básica do brasileiro do Norte ao Sul do País. A variedade é resistente ao vírus do mosaico, a principal doençado feijão, cultivo estratégico para o consumo e a renda familiar dos pequenos agricultores.
Por isso causou perplexidade a reação negativa de grupos que se dizem" defensores" dos pequenos produtores e que em geral acusam a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) de favorecer os grandes.
Resultado de pesquisas criativas da Embrapa, lideradas por Francisco Aragão e Josias Farias (respectivamente do Cenargene da Embrapa Arroz e Feijão), ocultivar é fruto de processos de manipulação gênica que não implicam transferência de material proteico, derrubando, assim, quais quer críticas sobre o potencial alergênico do produto.
Que limites, barreiras e mitos poderão ser rompidos, caso a estratégia de difusão do produto seja corretamente implementada? O primeiro se refere aos limites para aumento da produtividade e da produção do feijão, planta caprichosa no cultivo ou nas exigências do consumidor, que o aprecia mais recém-colhido (feijão novo). Isso limita a possibilidade de armazenamento e favorece um sistema de intermediação e comercialização tradicional, que mina a rentabilidade do agricultor, reduz incentivos para investir em tecnologia e mantém parte dos produtores na pobreza. As infestações do mosaico dourado elevamos custos e reduzem a produtividade. As dificuldades com o feijão se revelam na necessidade de importação em certos anos.
Os novos cultivares GM apontam na direção de uma agricultura de baixo impacto, de menor risco e com maior produtividade, uma vez que o uso atual de inseticidas não evita completamente o mosaico dourado. Espera-se, portanto, que a difusão dos cultivares GM em variedades do gosto do consumidor (pontal, vereda, pérola, todas do tipo carioca) tenha impactos não só sobre o preço, mas também sobre as condições de produção e de oferta do feijão.
O segundo se refere às barreiras impostas pela visão do consumidor sobre produtos GM, que representam um grande desafio para o sucesso da inovação.
Pesquisa feita pela Embrapa, liderada por Deise Capalbo, mostra forte polarização entre quem rejeita o uso da biotecnologia para alimentação humana e quem aponta os benefícios atuais e potenciais.
Entre esses dois grupos está um composto por mulheres com mais de 30 anos, que manifestam dúvidas ou que admitem não ter pensado no assunto.
O desafio está em garantir que o impacto da tecnologia resulte em melhores preços e oferta mais regular e abundante e que tal fenômeno seja captado pelos consumidores mais influentes.
Por fim, o lançamento pode romper o mito de que a biotecnologia seria monopólio de poucas empresas, com oferta direcionada a poucos produtos e com só uma ou duas tecnologias (tolerância a herbicida e resistência a insetos). Mas em que medida isso ocorrerá depende do empenho com que a política de segurança alimentar assuma que a tecnologia pode criar janelas de oportunidade para redefinir os padrões produtivos e de comercialização do feijão no País.
É fundamental realizar estudos que permitam antecipar os problemas que certamente surgirão no processo de difusão dos cultivares GM. Não aproveitar a oportunidade para tentar promover mudanças na base da produção e comercialização seria um equívoco que poderia reduzir o impacto produtivo e o alcance social do novo produto, que resolve um problema importante, mas não elimina os demais riscos produtivos e econômicos que vêm limitando a produção de feijão. Passada a fase de "oposição" e "aplausos", é necessário e urgente definir e implementar estratégia para difundir o produto nas regiões produtoras, tendo a agricultura familiar como prioridade do governo. Um gol de placa foi marcado, mas a partida ainda está no primeiro tempo.
PROFESSORES DO INSTITUTO DE ECONOMIA DA UNICAMP
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