Onde você estava quando...?
MARTHA MEDEIROS
ZERO HORA - 11/09/11
Recordar onde estávamos é entender que fazemos parte até do que não nos acontece diretamente
Em 31 de outubro de 1996, eu trabalhava no Jornal do Almoço. Havia recém chegado ao estúdio quando soube que um Fokker havia caído segundos depois de decolar de Congonhas. Toda a pauta foi reformulada. A edição daquele dia virou um plantão, só se falou sobre o desastre.
Quando saiu a lista de passageiros, descobri o nome de um amigo, mas não me apavorei, confiante na quantidade de homônimos que há no Brasil. Dei um telefonema e descobri que não era ele.
Em 29 de setembro de 2006, eu estava chegando a uma festa quando soube que um jato da Gol havia sido atingido por outra aeronave em pleno ar e caído em Goiás. Senti um mal-estar, mas segui com os planos de me divertir.
Em 17 de julho de 2007, eu estava assistindo ao Jornal Nacional quando deram a notícia do voo da TAM que, ao aterrissar, atravessou a pista e colidiu contra um prédio numa avenida ao lado do aeroporto. Gelei quando soube que o voo partira de Porto Alegre. Haveria alguém conhecido a bordo? Liguei para alguns amigos que viajavam com frequência para São Paulo e recebi chamadas também: formou-se uma corrente de afeto e solidariedade.
Os três acidentes aéreos citados acima foram dissecados no livro Perda Total, de Ivan Sant´Ana, que já havia escrito o ótimo Caixa Preta. É uma leitura emocionalmente difícil, mas que relata algo que faz parte da rotina de um número crescente de pessoas – voar.
Cada vez que entramos num avião, estamos 100% entregues ao destino, o que não acontece num carro, onde podemos manobrar, frear, saltar, enfim, interferir de alguma forma. Dentro de um avião, só nos resta a inércia. Talvez por isso as vítimas de acidentes aéreos nos comovam tanto.
Mas nada se compara à tragédia de 11 de setembro de 2001. Um assassinato premeditado e transmitido ao vivo através de imagens que até hoje parecem efeitos de computador. Onde você estava naquele dia? Eu estava escrevendo em casa quando minha funcionária chegou para trabalhar e sugeriu que eu ligasse a tevê. “Está acontecendo alguma coisa nos Estados Unidos.” Liguei a tempo de ver os prédios do WTC virem abaixo.
Era uma terça-feira, e eu já havia mandado para Zero Hora o texto da minha coluna de quarta, que tratava de um assunto idiota. No dia seguinte, qualquer assunto que não fosse o atentado seria idiota. Telefonei para o editor e pedi que ignorasse, em poucos minutos enviaria outro, mesmo que eu não tivesse a menor ideia sobre o que escrever. Com um notebook no colo e o olhar grudado na tevê, só me ocorreu refletir sobre nossa vulnerabilidade.
É praxe perguntar: onde você estava quando mataram Kennedy? Onde você estava quando mataram Lennon? Recordar onde estávamos é entender que fazemos parte até do que não nos acontece diretamente. Onde estávamos? Estávamos vivendo o cotidiano de um dia que havia começado comum, como começam todos os dias, até que fomos atingidos – também.
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