Desconfiança eleitoral
CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 11/09/11
A Bolsa de Nova York respondeu com uma baixa de 2,7% ao lançamento do pacote Obama, destinado a aumentar o emprego nos Estados Unidos.
Não foi a única razão que derrubou os mercados na última sexta-feira, mas, tivesse o plano obtido boa acolhida, a reação teria sido outra.
Isso mostra muitas coisas. Por exemplo, mostra o tamanho do ceticismo quanto à aprovação do plano pelo Congresso americano, especialmente o viés eleitoral com que a questão do desemprego está sendo tratada nos Estados Unidos.
Em princípio, não há muito o que se possa objetar tecnicamente a esse programa de US$ 447 bilhões. São incentivos para que pequenos e médios negócios contratem mais gente; e projetos de reforma e construção de escolas, rodovias e pontes - atividades, normalmente, de mão de obra intensiva.
Não ficou claro quantos novos postos de trabalho poderiam sair daí, numa economia que há meses amarga um desemprego ao redor dos 9,0%. Hoje, são 14 milhões os sem-trabalho, ou seja, 9,1% da força de trabalho dos Estados Unidos.
O presidente Barak Obama argumentou que esse projeto colocará mais dinheiro nas mãos de trabalhadores sobrecarregados de dívidas. Trata-se de um bom apelo retórico, mas que, aparentemente, esconde o maior ponto frágil da proposta.
A economia americana é fortemente dependente da demanda interna. Mais de 70% do seu PIB de US$ 15 trilhões depende do consumo das famílias e, no entanto, grande parte da atual estagnação deve-se ao baixo avanço do consumo. E isso ocorre porque o consumidor está excessivamente endividado.
O volume de dívidas imobiliárias (empréstimos cobertos com garantia hipotecária) nos Estados Unidos alcança hoje US$ 12 trilhões, problema seriamente agravado pela queda dos preços dos imóveis. O que aparentemente falta por lá é um programa destinado a reduzir drasticamente as dívidas hipotecárias, semelhante ao que o presidente Sarney proporcionou no final dos anos 80 ao mutuário brasileiro, para que, uma vez aliviado em sua carga hoje insuportável, o consumidor possa voltar ao crédito, às compras e a recolocar a máquina para girar.
Sexta-feira, funcionários da Casa Branca chegaram a anunciar que a Secretaria do Tesouro está em conversações com as duas grandes instituições que cuidam desse segmento, a Fannie Mae e Freddie Mac, mais a Agência Federal de Financiamento Imobiliário, regulador desse segmento do mercado. O objetivo seria ampliar os mecanismos de renegociação dos passivos hipotecários. Mas esse projeto parece estrangulado pela insuficiência de recursos orçamentários.
Pode-se criticar o projeto de Lei dos Empregos Americanos pelo seu baixo alcance. Mas seu principal problema não é técnico, mas, político-eleitoral. O presidente Barak Obama, com apenas 40% de aprovação popular, precisa de forte recuperação do emprego para se reeleger. E é a montagem dessa tubulação de oxigênio para sua candidatura que o Partido Republicano tenta agora boicotar.
Mas a questão eleitoral não tem somente uma direção. No seu discurso de quinta-feira perante as duas casas do Congresso americano, Obama deixou subentendido que o eleitorado também cobrará daqueles que eventualmente se opuserem à criação de empregos numa situação de grave crise. A conferir.
CONFIRA
A Grécia, por um fio
Sexta-feira aumentaram os rumores de que a Grécia não conseguirá cumprir as exigências que lhe permitiram receber o socorro da área do euro. Se isso fosse confirmado, a Grécia teria de arranjar refinanciamento fora das fontes oficiais, o que reforçaria a perspectiva de um calote.
Capital para os bancos
E por considerar inevitável o calote, o governo da Alemanha preparou um plano de socorro de seus bancos, que carregam volumes expressivos de títulos da dívida grega - foi o que repassaram as agências de notícias.
E o contágio?
Caso se resumisse a um eventual calote grego, a solução estaria dentro da capacidade de absorção das economias do bloco do euro. O problema seguinte seria inevitável. Quem seria o próximo: Portugal, Irlanda, Espanha ou Itália? Enfim, o contágio seria inevitável. E se economias como Itália e Espanha ficassem impossibilitadas de honrar seus compromissos, não haveria recursos na zona do euro capazes de dar conta do socorro.
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