Peluso recomendou o apagão da memória
ELIO GASPARI
FOLHA DE SP - 11/09/11
O presidente do STF ainda pode colocar a questão dos documentos do Judiciário num novo patamar
O presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Cezar Peluso, baixou uma recomendação (nº 37) orientando os tribunais do país para preservar seus documentos. Tem 1.800 palavras e quem a lê sente-se no paraíso. Menciona o "Programa Nacional de Gestão Documental e Memória do Poder Judiciário" e cria mecanismos para a digitalização de processos.
Tudo muito bonito até que se chega ao item 20 da recomendação:
"Será preservada uma amostra estatística representativa do universo dos documentos e processos administrativos e dos autos judiciais findos destinados à eliminação."
Numa palavra: destruição.
Reapareceu o apagão que há anos ameaça a memória do Judiciário. Do ponto de vista de quem quer se livrar de um papelório que pode chegar a 20 milhões de processos, esses documentos não têm valor. Juntam bichos, mofo e perigo de fogo. Para os historiadores, ali está a história do andar de baixo e, em muitos casos, só ali.
Pela recomendação de Peluso, serão destruídos processos encerrados há cinco ou dez anos. Só excepcionalmente, em casos que envolvem patrimônios, podem durar até cem anos. Deles, sobreviverá apenas uma "amostra estatística".
Esse critério já queimou milhões de processos, entre eles o que tratou da indenização de um jovem metalúrgico que, em 1959, deixou o dedo mínimo da mão esquerda debaixo de uma prensa. Que valor teria o caso banal de um pernambucano miserável? Era o processo do dedo de Lula.
Pode-se sustentar que não compete ao Judiciário gastar dinheiro preservando processos velhos. Também é o caso de se conjurar projetos megalomaníacos de digitalização. Daí a destruir os papéis vai uma distância enorme. No Paraná, a Justiça do Trabalho publicou um edital abrindo o caminho para para o descarte de cerca de 62 mil processos trabalhistas. Felizmente, a Unoeste de Marechal Cândido Rondon pediu a guarda do arquivo, e o caso poderá ser resolvido de forma exemplar.
O doutor Peluso sabe quão prósperos são os grandes escritórios de advocacia. O Rio Grande do Sul preserva 14 milhões de processos da sua Justiça, e isso custa à Viúva algo como R$ 4,2 milhões por ano (incluindo aluguel, água, luz e telefone). Instituições oficiais de financiamento, ou programas do BNDES e da Petrobras, associados a algumas bancas de advogados, poderiam desatar esse nó em outros Estados.
Se a destruição for evitada e os arquivos forem salvos, algum dia uma grande cidade poderá montar um projeto semelhante ao dos papéis da corte criminal de Londres. No "Old Bailey" digitalizaram 197 mil julgamentos preservados, com 240 mil manuscritos onde estão 3,35 milhões de nomes da ralé que passou pela Justiça entre 1674 e 1913. Essa papelada ensina que, em 1889, um sujeito era acusado de ganhar 20 libras para enviar uma jovem a um bordel brasileiro. Graças à preservação de um censo dos hóspedes da prisão de Holloway, sabe-se que, em 1881, lá esteve Edward Glassborow, tataravô de Kate Midletton, duquesa de Cambridge.
O SACI-PERERÊ DO PT ERA RICO E BÍPEDE
A defesa do deputado José Genoino, ex-presidente do PT e réu no processo do "mensalão", sustenta que esse triste episódio "como o Boitatá e o Saci-Pererê, jamais existiu".
Ao contrário do saci, a caixa do PT tinha duas pernas. Os companheiros gostariam de adiar o julgamento da "lenda" para 2013. Até lá, terão indicado três novos ministros para o Supremo. Um (ou uma) na vaga, já existente, de Ellen Gracie, e dois substituindo Cezar Peluso e Carlos Ayres Britto, que completam 70 anos em setembro e novembro de 2012.
BOLSA ROMANÉE
Uma alma penada lembrou que Lula tomou sua primeira taça de vinho Romanée Conti em 2002, graças à generosidade do publicitário Duda Mendonça, que recebia por seus serviços na caixa do "mensalão" e depositava o dinheiro em Cayman.
Diante das notícias de que ele ganha um bom dinheiro dando palestras, ofereceu-lhe a sugestão de transformar sua Bolsa Ditadura numa Bolsa Romanée. Pela sua conta, com o cheque da Viúva, de cerca de R$ 4.000 mensais, ele pode tomar uma garrafa por ano da safra de 1986. Ela é vendida no mercado brasileiro a R$ 48.750.
VIVE LA FRANCE
Não se pode dizer que a nova ordem líbia esteja discriminando os interesses brasileiros no país. Está apenas indicando que seria bom que buscassem alguns parceiros, sobretudo entre os franceses.
Espertos, os franceses. Estavam fortes com Gaddafi e fortes continuam com seus inimigos.
MOVIMENTO
Está chegando às livrarias "Jornal Movimento - Uma Reportagem", de Carlos Azevedo. Conta a história do semanário deste nome que circulou entre 1975 e 1981, sob a direção do jornalista Raimundo Rodrigues Pereira. "Movimento" vocalizava as posições da esquerda do MDB e foi uma das publicações mais massacradas pela censura. Nasceu com uma circulação de 20 mil exemplares.
O livro recupera a colaboração do engenheiro Sérgio Motta na organização do jornal. Mais tarde ele viria a ser um grão-tucano, ministro das Comunicações de FHC. Além disso, traz uma preciosidade: um DVD com as 334 edições do semanário, inclusive duas apreendidas.
ALEXANDER MCQUEEN
Está na rede uma grande campanha. Trata-se de manter viva a exposição "Alexander McQueen - The Savage Beauty", que encantou Nova York entre maio e agosto. Ela foi vista por 660 mil pessoas e entrou para a história do museu Metropolitan.
"A Beleza Selvagem" pretendia ser uma homenagem ao estilista inglês Alexander, que se matou em fevereiro do ano passado. Foi muito mais que isso. Juntou a beleza da obra do artista à criatividade dos organizadores. Delirante, inovador e teatral, McQueen sai da exposição como um fenômeno cultural. Sarah Burton, uma de suas discípulas, desenhou os vestidos de Kate e Pippa Midleton.
A petição para que a exposição circule pelo mundo tem pouco mais de mil assinaturas. Resta torcer. (No YouTube há uma excelente amostra de oito minutos de "A Beleza Selvagem".)
EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e, em agosto, quando estourou o escândalo do Dnit, ouviu o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, dizer o seguinte: "Num órgão que tem um orçamento de R$ 15 bilhões e que executa milhares de projetos em todo o Brasil, é normal que surjam irregularidades".
O idiota ouviu o anúncio da Controladoria-Geral da União informando que, numa fiscalização de um montante de R$ 5,1 bilhões, acharam-se 66 irregularidades que somam R$ 682 milhões. Eremildo fez a conta: morderam a Viúva em 13%.
O salário do dr. Paulo Bernardo está em R$ 26.273. Se alguém lhe der uma tunga de R$ 3.500, ele dificilmente dirá que o mandrião ficou na taxa de normalidade.
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