Brasil: está frio ou está quente?
VINÍCIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SÃO PAULO - 03/04/11
Economia começa a esfriar, mas "mercado" acha que ainda não o bastante para conter o ritmo da inflação
ALÉM DE espezinhar a nova direção do Banco Central, os povos dos mercados estão entretidos no debate sobre a redução do ritmo da economia. Já começou? Se começou, qual a intensidade da freada? Será o bastante para conter a inflação?
O júri, economistas de bancos e consultorias privadas, ainda está reunido, porém. Enfim, o ano mal começou, em termos estatísticos.
Mas alguns duvidam desde já que o "ajuste" vai bastar, pois não acreditam que o governo esteja preocupado com a inflação. Outros dizem mesmo que, apesar de alguma desaceleração neste ano, o caldo tende a entornar logo em 2012.
No ano que vem, haveria aumentos pesados de despesas públicas e outros estímulos econômicos, como o reajuste de 14% do salário mínimo e o aperto no ritmo dos investimentos (Copa, Olimpíada, petróleo etc.).
O pessoal do Itaú observava em texto de sexta-feira que o gasto do governo tem crescido menos. No trimestre encerrado em fevereiro, a despesa aumentou ao ritmo anualizado de 5,6%, ante 7,4% em janeiro. "Os números de 2011 apontam para um desempenho melhor que em 2009-2010 (anos de forte expansão fiscal), mas ainda abaixo do esforço médio verificado nos anos de [superavit] primário elevado (2003 a 2008)", observam porém.
O total de novos empréstimos está em nível 9% inferior ao volume anterior a dezembro, quando o BC começou a apertar o crédito. A confiança do consumidor caiu um pouco em março. O uso da capacidade produtiva da indústria foi alto e estável de abril a dezembro de 2010, mas cai desde então, de leve. As tendências inflacionárias, porém, continuam preocupantes, diz o pessoal do Itaú, com risco alto de indexação e com IPCA em 12 meses batendo nos 6,5% em meados do ano.
O pessoal da consultoria MBA é mais crítico. O valor médio do salário real (descontada a inflação) cresce menos, mas os nominais crescem rápido. Isto é, a inflação está sendo realimentada. As medidas de contenção de crédito não tiveram efeito bastante em itens importantes, como a venda de automóveis.
O PIB do primeiro trimestre teria crescido em ritmo semelhante ao de 2010. Sim, a economia e a inflação vão se desacelerar, diz o pessoal da MBA, que, porém, duvida que isso será o bastante. Motivo? "Desta vez, o BC e a Fazenda estão coordenados numa trajetória de desequilíbrio da inflação", diz o relatório de sexta-feira da consultoria. Não teria sido assim sob Lula 1, quando BC e Fazenda combatiam a inflação, nem sob Lula 2, em que pelo menos o BC mantinha o rigor, com a Fazenda estimulando a economia.
O pessoal do Bradesco viu crescimento forte da indústria em fevereiro. Mas isso deve passar. Alta dos juros, os primeiros sinais de contenção de crédito, corte de gastos do governo "em curso" e "primeiros sinais" de contenção dos salários indicam que a "desaceleração da economia seguirá ao longo dos próximos meses", dizem em comentário também da sexta-feira. Mas "a magnitude" da desaceleração se mostra "menor do que a esperada".
Em suma, não parece uma visão muito diferente da apresentada pelo BC na semana que passou. Uma inflação de uns 5,6%, PIB crescendo a 4%. A diferença é que o pessoal "do mercado" não está gostando nada da coincidência. Querem menos PIB e menos inflação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário