domingo, abril 03, 2011

MERVAL PEREIRA Serra na luta


Serra na luta
MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 03/04/11
 
O ex-governador de São Paulo José Serra pode se orgulhar de ter conseguido, mesmo depois da segunda derrota para a Presidência da República, continuar no centro das discussões políticas do país, mesmo que seja um consenso nos meios políticos que são mínimas as suas chances de conseguir concorrer pela terceira vez à presidência, como é seu desejo.
A mais recente lenda urbana coloca Serra como o grande articulador por trás da criação do PSD, o novo partido que o prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, um serrista assumido, está organizando.
É verdade que, pela legislação eleitoral, Serra, que está sem mandato, pode entrar no novo partido a qualquer momento, o que excita a imaginação dos políticos.
Todos se espantam com a desenvoltura do prefeito paulistano, que está demonstrando uma capacidade de aglutinação política que não se esperava dele, e por isso procura nos bastidores a verdadeira força que o impulsiona.
Mas a verdade parece ser que Serra não tem nada a ver com o PSD, e que Kassab apenas está aproveitando uma circunstância criada pela legislação eleitoral para viabilizar seu projeto político pessoal.
Como a fidelidade partidária só permite que se troque de partido por razões específicas, como mudanças programáticas, a única maneira de sair de um partido onde se esteja desconfortável por qualquer motivo é criar uma nova legenda.
Kassab estava se sentindo constrangido no Democratas pela atuação do grupo do ex-prefeito do Rio Cesar Maia, cujo filho, o deputado federal Rodrigo Maia, presidia o partido.
Entre as disputas de poder de grupos históricos no partido, como a dos herdeiros de Antonio Carlos Magalhães contra o grupo do ex-senador Jorge Bornhausen, e também a divisão entre apoiadores de José Serra e do senador Aécio Neves com vistas à disputa presidencial de 2014, o DEM debateu-se em crises internas que não foram superadas a contento.
A saída foi tentar organizar um novo partido, aproveitando que políticos de diversas tendências, por motivos diversos, ansiavam por uma chance de mudar de legenda.
Essa chamada "janela de transferência", período em que seria permitida a troca de partidos sem punições pela lei eleitoral, chegou a ser negociada nas preliminares da reforma política, como uma maneira de reorganizar o sistema partidário.
Como a idéia não foi à frente, especialmente por que a oposição suspeitava de que ela seria uma manobra palaciana que se destinava a esvaziá-la, Kassab passou a articular um novo partido que ficou conhecido como "a janela do Kassab".
Mas sem contar com o apoio de seu "padrinho" José Serra, que, na véspera da decisão oficial do prefeito paulistano de deixar o DEM, passou a madrugada conversando com ele na tentativa de demovê-lo da decisão.
O DEM continua achando que a manobra tem por trás o Palácio do Planalto.
Na semana passada, já consumada a saída, Serra e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, foram à casa do senador Agripino Maia, novo presidente do DEM, para conversar sobre a montagem do diretório de São Paulo, que interessa diretamente ao PSDB paulista.
A disputa da prefeitura na sucessão de Kassab está em discussão, pois é um dos cargos mais importantes do país, que está em poder da coligação PSDB-DEM desde a eleição de Serra, em 2004.
Maia comunicou aos dois que o deputado federal Rodrigo Garcia, eleito com mais de 220 mil votos, ficando entre os 10 mais votados de São Paulo, pretende ser candidato à prefeitura e terá o apoio do DEM.
Garcia sempre fez "dobradinhas" com Kassab, que disputava para deputado federal, e Garcia, para estadual, e mesmo assim permaneceu no partido.
Dois dias depois dessa conversa, o governador Geraldo Alckmin lançou a candidatura de Serra à Prefeitura de São Paulo em uma solenidade pública, na presença do ex-governador, que vinha dizendo a todos que não estava em seus planos se candidatar novamente à prefeitura, cargo que ocupou por um período antes de se candidatar ao governo de São Paulo.
A atitude de Alckmin, e sobretudo a de Serra, que não negou a possibilidade nem se mostrou incomodado com a sugestão pública, leva a que se pense que Serra pelo menos aceitou deixar o tema ser debatido, no partido e em público.
O PSDB está com dificuldades na composição de seu diretório municipal paulista, e na hora em que Alckmin lança um candidato contral o qual nenhum tucano pode ficar, abafa as discussões, inibe as divergências no partido. Além de colocar como "cenoura" para o partido uma expectativa real de manutenção de poder.
A candidatura de Serra também obrigaria o novo partido de Kassab a apoiá-lo, e isso o prefeito não discute.
Se a candidatura de Serra não se confirmar, para sucedê-lo, Kassab joga principalmente com dois nomes: Eduardo Jorge, do PV, e Guilherme Afif Domingos, vice-governador de Alckmin que o seguirá para o novo partido.
O PT, se não tiver Serra na disputa, deve concorrer com a senadora e ex-prefeita Marta Suplicy ou com o ministro Aloizio Mercadante. Caso contrário, colocará um segundo time em campo, provavelmente do grupo do deputado federal Jilmar Tatto.
O ex-governador José Serra, portanto, continua sendo o peão no PSDB paulista, ao mesmo tempo em que tenta manter sua posição de candidato preferencial do partido à Presidência da República.
O mais provável é que acabe fazendo parte de um conselho de líderes do PSDB nacional, presidido pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
A questão é saber se, definida a impossibilidade de ser mais uma vez candidato a presidente da República, o que parece no momento o mais provável, Serra quererá encerrar sua carreira política como prefeito de São Paulo, o terceiro maior orçamento do país, ou como senador em Brasília. 

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