Irrelevância
O GLOBO - 28/11/09
A crise em Honduras chegou a um ponto em que os EUA e outros países apoiam as eleições de amanhã, que se realizarão sob um governo interino, enquanto o Brasil, a Venezuela e os outros bolivarianos ameaçam não reconhecer o eleito. Desde o seu início, em junho, a questão hondurenha é uma armadilha. O mundo ficou horrorizado com a volta à América Latina do golpe de Estado, do tipo que, executado por militares, arrancou o presidente constitucional Manuel Zelaya do poder, com apoio do Legislativo e do Judiciário.
Ocorre que Zelaya, bolivariano como Hugo Chávez, também atentara contra a Constituição hondurenha, que veda a reeleição, ao organizar um referendo com o objetivo de se perpetuar no poder.
A comunidade internacional foi rápida na condenação ao golpe e na exigência da restituição de Zelaya, o que pôs lado a lado os EUA e seus inimigos bolivarianos. Mas predominou o impasse devido à posição inamovível do governo interino, liderado pelo presidente do Congresso, Roberto Micheletti. Chávez apostou no impasse, no qual o Brasil parece ter embarcado quando tomou a insólita decisão de acolher Zelaya — transportado por avião venezuelano — na Embaixada do Brasil em Honduras, em setembro.
E pior, permitir que o presidente deposto transformasse a representação diplomática num palanque político, contribuindo para endurecer a resistência do governo às tentativas de acordo mediadas pela OEA.
Com a situação estagnada, as eleições de domingo se tornaram o fato político dominante. Por pragmatismo, os EUA deixaram de considerar indispensável a volta de Zelaya ao poder, preferindo destacar a importância das eleições (nem Micheletti nem Zelaya concorrem). O Brasil, na má companhia do bloco bolivariano, acabou, como uma vestal, na posição de não reconhecer o resultado do pleito se Zelaya não for reempossado para um governo de transição até a posse do eleito, em janeiro. Tornou-se irrelevante, ainda mais que os EUA obtiveram apoio de Canadá, Colômbia, Peru, Costa Rica e Panamá.
Diante de um parecer contrário da Corte Suprema de Honduras, está cada vez mais difícil que o Congresso, que se reúne com este fim no dia 2, vote pelo retorno de Zelaya para um governo tampão. Sem margem de manobra, a diplomacia brasileira deveria corrigir a rota, apoiar as eleições e reconhecer o eleito. Mas, como Brasília trabalha para supostamente ampliar o peso do Brasil nas relações internacionais, poderá optar por manter a posição de vestal. E continuar irrelevante
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