Dólar furado
O GLOBO - 22/05/09
O dólar cai porque está entrando mais dinheiro de investidores externos, as empresas brasileiras voltaram a captar no exterior, as commodities estão subindo. Os motivos são muitos e mostram que os sinais se inverteram. Depois de meses de fluxo cambial negativo, o fluxo ficou positivo. Qual o risco? Que o movimento fique exagerado se todos acreditarem que o susto passou.
Foi por isso que o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fez o alerta ontem contra o excesso de euforia. Da mesma forma que o pânico, a euforia produz movimentos de manada que podem exagerar uma tendência. Isso aumenta muito a volatilidade e ela pode deflagrar um novo momento de crise.
Mas alguns dos motivos de queda do dólar são melhoras sólidas. E não são apenas brasileiras. De 17 de março até ontem, a conta já registra que o dólar caiu 10% frente ao real, 15,6% frente ao rand sul-africano e 4,7% diante do peso chileno. O que há de comum entre Brasil, África do Sul e Chile é que os três países são exportadores de commodities e elas voltaram a se valorizar. O índice CRB, que mede o valor das commodities, subiu 12% nesse período.
O economista-chefe da Ativa Corretora, Arthur Carvalho, acha que o dólar se desvaloriza em função da diminuição da aversão ao risco mundial, porque isso traz os investidores, que fugiram do país desde o fim do ano passado, quando a crise se agravou após a quebra do banco americano Lehman Brothers.
Isso significa um forte ingresso de moeda americana por meio da Conta de Capitais (investimentos em bolsa, investimentos estrangeiros diretos e títulos do Tesouro brasileiro), dos Adiantamentos de Contrato de Câmbio (ACC), que estão se normalizando para as empresas exportadoras, e também pelo anúncio de captação de recursos por parte de empresas brasileiras no exterior. “Com essa inversão de cenário começa a acontecer, também, um forte viés especulativo a favor do real. Ou seja, na medida em que os investidores olham para frente e veem um cenário de entrada de dólares, há uma tendência de venda da moeda americana”, explicou Carvalho.
Foi contra isso que o presidente do BC alertou ontem, o exagero da tendência provocada por movimentos especulativos. Mesmo assim, diante do contexto de crise, Carvalho não acha muito provável que o dólar caia para a casa de R$ 1,80. O mais provável, segundo ele, é ficar oscilando entre R$ 2 e R$ 2,10, mesmo que ele chegue a romper a barreira dos R$ 2. O problema é que a crise não acabou, apenas melhorou de expectativa.
Para Sérgio Vale, da MB Associados, outro fator que influencia é o fato de que o Brasil não fez um afrouxamento muito grande da política fiscal e, ao mesmo tempo, ainda pode utilizar muito a política monetária para enfrentar a crise. Isso tem dois efeitos positivos sobre os investidores: primeiro, que as contas públicas estão menos desajustadas que em outros países e, segundo, que juros altos significam alta rentabilidade nos investimentos em títulos públicos. “Se as políticas são sólidas e os juros são elevados, nada mais natural do que esse investidor vir para cá”, explicou Vale.
Um cenário mais otimista na recuperação econômica mundial também sustenta a alta das commodities. Afinal, se a recuperação acontecer mais rapidamente, o consumo de matéria-prima será maior e os preços tendem a subir mais.
André Sacconato, da Tendências Consultoria, também acha que um dos grandes motivos da alta do dólar é que o Brasil tem juros altíssimos, no mar de juros baixos no mundo. Ele também explica que o país sofreu menos com a crise na comparação com outros emergentes, como Rússia, México e Índia, abrindo espaço para a vinda de investidores estrangeiros.
Além disso, os chineses estão tentando diminuir sua exposição a títulos americanos e dólar. Isso ajudou o Brasil de dois modos: primeiro, porque valorizou os produtos que o Brasil exporta e, segundo, porque aumentou a demanda por esses produtos.
Por enquanto, o BC compra dólares e recompõe suas reservas. Os exportadores que sofreram com o dólar baixo, e depois se encrencaram no mercado futuro pela alta abrupta da moeda, agora olham preocupados para a queda, com o temor de que isso reduza sua rentabilidade. O dólar pode não ter o valor que já teve, mas ainda é a moeda para a qual todos olham.
Com Leonardo Zanelli e Alvaro Gribel
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