Visão de Mantega
O GLOBO - 19/05/09
O ministro Guido Mantega acha que a CPI da Petrobras põe sob suspeição a maior empresa do país no pior momento. Ele, que é do conselho de administração, diz que a estatal tentará captar recursos para financiar seus investimentos e que a CPI aumentará o risco da empresa. Mantega conta que não havia alternativa para a poupança, e acha que o país estará crescendo, na margem, no fim do ano.
Conversei ontem longamente com o ministro, que veio ao Rio de Janeiro participar do Fórum do Velloso. A respeito da criação do imposto sobre a caderneta de poupança, ele disse que o governo analisou várias propostas. Uma, a de indexar a remuneração da poupança a 65% da Selic. Outra, de separar a poupança velha da nova poupança, que teria novas regras. Mas ele acha que em qualquer uma delas o governo seria acusado de mexer na caderneta. Por isso, optou por deixar as pequenas contas sem qualquer alteração e criar a taxação do imposto de renda para as maiores. “Tudo isso é por um bom motivo, a queda dos juros”, diz Mantega.
Os fundos só terão queda de tributação, explicou, se os juros caírem e se houver fuga para a poupança, mas, por enquanto, na opinião do ministro, é hora de os bancos reduzirem a taxa de administração.
Segundo Mantega, a primeira ação anticrise foi o orçamento de investimento para a Petrobras. “Aprovamos um orçamento de R$ 60 bilhões num ano. É muito investimento para uma época de crise.”
Mantega diz que, como toda empresa, a Petrobras terá que fazer captações no mercado internacional e pensa que a CPI pode atrapalhar. Um dos pontos sob os holofotes está ligado ao Ministério da Fazenda: a manobra contábil da Petrobras, que a levou a pagar R$ 4,1 bilhões a menos de imposto no ano passado, como O Globo revelou dias atrás. O caso pôs a empresa em rota de colisão com a Receita, que soltou nota divergindo da forma como a estatal fez a mudança de regime tributário, e com o Tesouro, que foi acusado pela Petrobras de ser o responsável pela redução da transferência da Cide para os municípios.
O ministro da Fazenda, que coordena o Tesouro e a Receita e está no conselho da Petrobras, não quis entrar nessa bola dividida. “Existe sigilo fiscal, não posso comentar a situação de uma empresa específica. A nota da Receita não falava na Petrobras em si, mas sim de forma geral, sobre os critérios para a mudança do regime. As leis no Brasil são muito imprecisas e, às vezes, há interpretações diferentes. Temos um grupo de trabalho analisando o caso da Petrobras.”
Sobre indícios de superfaturamento na Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, ele disse que o TCU pode verificar. “O Conselho de Administração da Petrobras determinou que ela cortasse em 30% os custos de todos os contratos de fornecimento. Fez isso porque, antes da crise, o mercado estava superaquecido, todos os preços estavam muito altos. Depois da crise, o frete chegou a cair a um quarto do preço de antes, e tudo mudou. Por isso, demos a ordem para a revisão dos custos, e a empresa está cumprindo”, diz.
Mantega admite que o PIB do primeiro trimestre será negativo, mas acha que o período de queda já ficou para trás. Não gosta do conceito “recessão técnica”, que significa dois trimestres consecutivos de PIB negativo. Acredita que o segundo trimestre será melhor do que o primeiro. Perguntei quanto o país estará crescendo ao fim de 2009.
“Vai estar crescendo ao ritmo de 3% a 4%. E não sou eu que acho isso. O próprio FMI já disse que alguns países estarão crescendo no fim do ano.”
Ele acha que o nível de atividade seguirá o desenho de um “V”, que significa queda seguida de recuperação rápida, e que isso ocorrerá porque o governo deu a resposta certa à crise, reduzindo os impostos dos setores afetados diretamente pela queda do consumo e pelo colapso do crédito: o automobilístico, o de material de construção e outros bens de consumo. Mantega garante que o governo está fazendo uma boa gestão fiscal.
“O Brasil vai ter um déficit nominal de 2,1% do PIB. É déficit, mas é um dos menores dos países do G-20. No ano que vem o país voltará a subir o superávit primário.”
Os dólares para o FMI ainda não foram remetidos. Segundo Mantega, os países emergentes não concordaram com as regras do novo aporte, se ele será no mecanismo antigo, o chamado “New Arrangements to Borrow”, com regras que não favorecem países emergentes, ou se será criado um novo mecanismo em que o dinheiro depositado pelos países represente, também, mais poder para eles nas decisões do Fundo.
Ele avalia que a crise internacional está dando uma trégua. Ainda não estão resolvidos os problemas dos ativos tóxicos dos bancos americanos, ainda não se sabe como vai funcionar a participação do setor privado na compra de ativos podres dos bancos dos Estados Unidos. A Inglaterra, na visão dele, está com problemas ainda maiores. Mas o ambiente está melhor do que no passado recente. “O interbancário voltou a existir, países estão voltando a captar, o ambiente está melhor.”
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